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7 de outubro de 2011

O PEQUENO DICIONÁRIO CRÍTICO –31.3 – Produtividade I I I
Dizia Miguel Ângelo que fazer uma estátua era simples, bastava tirar à pedra o que estava a mais…O aumento de produtividade é tão simples quanto isto: basta eliminar os factores de improdutividade.
Mesmo em condições tecnológicas idênticas as produtividades podem ser muito diferentes de empresa para empresa, de país para país. Os aspectos organizativos e de gestão são fundamentais.
Vimos na Parte II que estes factores podem ser externos ou internos e que os internos se devem quer a excesso de trabalho quer a tempos de paragem, sendo no fundamental da responsabilidade da gestão ou da responsabilidade do executante, o trabalhador.
A responsabilidade do trabalhador na improdutividade pode dever-se a falta de competência ou a indisciplina. Em última análise no entanto, a responsabilidade será sempre da gestão. No primeiro caso, cabe à gestão, proceder à formação e qualificação dos trabalhadores para os trabalhos em causa, à respectiva avaliação de conhecimentos e selecção dos trabalhadores para as diversas tarefas. No segundo caso, indisciplina, a existência de um bom ambiente de trabalho e de motivação permite na generalidade dos casos serem os próprios colegas a censurar e a procurar corrigir o trabalhador. Diga-se que este aspecto nunca esteve em causa na legislação pós-25 de Abril. Um gestor ou um quadro técnico que argumente desta forma apenas demonstra incompetência e inaptidão para o lugar (1). Trata-se de uma questão de liderança: autoridade pela competência e pelo exemplo; exigência e rigor de procedimentos explicitados, mas tudo isto com benevolência e compreensão humana.
Quando distintos intermediários, oligopolistas ou gente que nunca passou uma hora como gestor numa empresa da economia real vem para a comunicação social perorar sobre as implicações negativas da legislação laboral na produtividade, tal só pode ser classificado como ignorância ou má fé. O Relatório da AIP sobre a Competitividade (2010) em dez medidas de Políticas Públicas (pág.8) refere apenas em 6º lugar ”melhorar a flexibilidade laboral”. Por sua vez o Relatório da CIP de 2010 sobre a Indústria Portuguesa em 10 recomendações para a competitividade (pág. 92 e 93) não menciona sequer a legislação laboral – e com razão. Vários gestores estrangeiros com larga experiência profissional têm classificado designadamente os operários portugueses como dos melhores que têm conhecido pelo mundo fora: “o vosso problema é a gestão” – é afirmado. (1).
Efectivamente, como já dissemos, a experiência mostra que não mais que 10 a 15%, do tempo improdutivo, como estimativa, podem ser directamente atribuídos a falhas do trabalhador, inevitáveis para qualquer ser humano, em qualquer país. Os tempos improdutivos podem sempre ser reduzidos por adequadas medidas e acções da gestão.
Os custos da improdutividade e da não qualidade podem representar em média 20% do valor da facturação. A gestão da qualidade (Normas ISO 9000) e a gestão do desenvolvimento e inovação (NP 4457) são instrumentos que podem potenciar o aumento da produtividade se devidamente entendidos e postos em prática com este objectivo.
Cada empresa deve avaliar a sua competitividade, conciliando o saber mais actualizado, com a capacidade de aprender com a experiência, questionando as suas vantagens e desvantagens competitivas. O passo seguinte será tomar medidas para reforçar umas e reduzir ou eliminar outras, o que passa pela escolha de estratégias adequadas, baseadas em estudos de mercado (isto é, relativamente a Clientes, Fornecedores, Concorrentes e Evolução Tecnológica) e políticas da Qualidade, correctamente definidas e implementadas. Áreas de trabalho e objectivos prioritários de melhoria podem então ser apontados. Note-se que qualquer empresa só domina o seu processo produtivo, se tiver sob controlo todos os custos e se tiver capacidade para conceber e projectar os produtos, melhorar a concepção e métodos de trabalho, aumentando o valor produzido. O mito do investimento estrangeiro como panaceia e sem controlo nacional tem sido o oposto deste objectivo, corresponde a formas mais ou menos subtis de troca desigual.
Nos diversos níveis de gestão, são necessárias pessoas que compreendam todas as dimensões técnicas, económicas, pessoais e sociais da empresa, com formação humanista. A cultura globalmente entendida – como a entendia o grande matemático e democrata progressista Bento Jesus Caraça - é um factor decisivo na capacidade de evoluir e melhorar, necessária para organizar a participação de todos, ouvindo as pessoas, dando oportunidades, aproveitando os conhecimentos do pessoal para criar novas ideias.
A compreensão dos aspectos que influem no comportamento individual é fundamental para poder entender o funcionamento organizativo. A eficácia depende, em grande parte, da convergência que exista entre as necessidades e os objectivos individuais e as necessidades e objectivos da organização, para que quanto maior for esta convergência, maior seja a motivação de cada trabalhador.
Numa empresa – ou num país - sem capacidade para melhorar a produtividade culpam-se os trabalhadores, há um ambiente de suspeita, insatisfação, recalcamentos e insegurança.
Falámos em planos de melhorias, mas para isto é preciso haver mercado. O abaixamento do preço da força de trabalho, a redução do nível de vida e do PIB não oferece suficiente estímulo para introduzir novos elementos de progresso e inovação na produção. Corresponde a uma das contradições do capitalismo: o aumento da exploração opõe-se ao desenvolvimento económico. A desindustrialização e o desemprego são um exemplo desta situação com o objectivo de manter elevadas taxas de lucro. Na realidade, o capitalista só investe se previamente houver a perspectiva da existência de mercado para a produção resultante.
Há duas formas de aumentar a competitividade: reduzindo os “custos salariais” ou aumentando a produtividade, isto é, em ambos os casos reduzindo o valor (valor-trabalho) do que é produzido.
A primeira hipótese corresponde á deflação salarial, às medidas de austeridade e flexibilidade laboral. É a via da recessão e do desastre económico. Procura-se a competitividade no abaixamento dos custos salariais reduzindo impostos para o capital aumentando impostos para o consumo.
Para o reformista social Robert Owen (1771- 1858) a causa da depressão económica residia na desvalorização do trabalho humano. O sistema capitalista não conseguiu ultrapassar esta questão nem tem forma de o fazer - senão na medida em que deixar de o ser.
1 – As afirmações produzidas nestes casos são retiradas da experiência pessoal do autor, muitos anos como gestor inclusive de centenas de trabalhadores, quadros técnicos e operários.

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