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14 de outubro de 2011

O PEQUENO DICIONÁRIO CRÍTICO –32 –“REDUÇÃO DE CUSTOS” E ”CORTE NAS DESPESAS”

Parecendo ter o mesmo objectivo são conceitos e sobretudo práticas muito diferentes. Vimos como no passado para este efeito - e sem receio de criar gordura no Estado - se nomearam comissões sobre comissões, se recorreu a equipas de consultores, sempre recheadas de gente muito credenciada – dentro da sua área ideológica – falando como lhes é uso de cátedra, criticando tudo e todos e produzindo montanhas de…coisa nenhuma, além de, parafraseando Brecht, propor que “se demitisse o povo”. Que tem sido aliás a única coisa que este governo PSD-CDS mostra querer fazer.
A diferença entre “redução de custos” e ”corte nas despesas” é básica e essencial, a primeira não foi posta em prática na Administração Pública, quanto à segunda, vários governos, o actual não é exceção, querendo fazer o papel de gente determinada e com autoridade, usam-na de forma inconsequente , de acordo com as ordens que recebem “dos países amigos” e “dos que nos emprestam dinheiro”, termo comiserador para a cumplicidade e submissão aos usurários especuladores.
A redução de custos exige metodologias próprias e processos de avaliação rigorosos de todos os factores do desempenho. Qualquer gestor competente sabe que demora tempo, exige investimento em horas de trabalho de equipas conhecedoras em profundidade quer dos processos em análise quer dos métodos aplicáveis, não tem nada que ver com arbitrárias decisões do topo, não excluindo, é óbvio, a definição de fundamentados objectivos a serem alcançados.
Terá de ser feito com recurso a consultores externos? Talvez, dependendo das competências internas na matéria. Os consultores podem fazer formação, dar pistas, assegurar o acompanhamento e orientação às equipas. É também necessário como dissemos que os consultores tenham, com relativo detalhe e profundidade, conhecimentos sobre o sector a que se dirigem, nas suas diversas vertentes técnicas e humanas, caso contrário limitar-se-ão a debitar, como tantas vezes se vê, uma série de generalidades e banalidades, de irrealidades, aprendidas com os gurus da moda neoliberal.
Para além do acompanhamento e orientação por especialistas, a redução de custos é essencialmente um trabalho que tem de ser feito por equipas pluridisciplinares da própria empresa ou serviço, com a devida formação e motivação
Neste trabalho de equipa - como em qualquer outro, aliás - conta a competência técnica, o rigor de procedimentos, o espírito de equipa. E ao falarmos em “procedimentos” diga-se que a sua definição e conformidade com as reais condições de trabalho e sua melhoria são um factor decisivo. A ausência de adequados procedimentos é um dos principais factores de ineficiência.
A redução de custos tem metodologias próprias há muito estudadas, como a Análise de Valor, a Análise de Funções pelo método QFD ou equivalentes, e muitos outros métodos e ferramentas da Gestão da Qualidade, nomeadamente os processos de análise e selecção de problemas, de escolha de prioridades e de tomadas de decisão, com vista ao estabelecimento de programas devidamente estruturados e participados com objectivos quantificados. Demora tempo, tem o custo das horas de trabalho dispendidas, mas a experiência mostra que é eficaz, mais: que é talvez o mais importante factor para a melhoria da eficiência, dinamizando a inovação, o aumento da produtividade e da qualidade. Isto seria o que o que um governo progressista e patriótico procuraria concretizar.
Os “cortes na despesa” não são nada disto. Não resultam de estudos prévios ligados ao funcionamento dos organismos, são decisões arbitrárias impostas do exterior, por gente com cérebros formatados na ideologia que os comanda, de rigidez dogmática equivalente à de inquisidores e cujos objectivos se limitam à defesa dos credores, indiferentes às consequências sociais  e humanas das suas acções. A destruição dos equilíbrios sociais levada a cabo por estes burocratas, está patente em muitos países da África, da Ásia, da América Latina. (ver Dividas – maio.2011)
Na Europa estes processos visam simplesmente destruir as bases do Estado Social e Democrático, entregando as alavancas económicas aos monopólios e á finança especuladora. Em todos os países europeus em que o sistema foi posto em prática, caso da Grécia, Irlanda, Portugal é este o visível resultado.
As iniciativas neoliberais “da terceira via” (socialista!) do incrível sr. Tony Blair, mostram como modelares serviços públicos na saúde, na educação, nos transportes, entregues a privados foram degradados, com o objectivo de maior eficiência e cortes na despesa do Estado. E tudo isto para quê? O Reino Unido afinal apresentava um défice público de 10,4 % do PIB em 2010, superior ao português e idêntico ao da Grécia. (Eurostat pocketbook – 4 -2010 – p.77).
Sem estudos, sem adequados processos a serem postos em prática, sem motivação dos trabalhadores, o resultado é o desastre em termos pessoais e colectivos. A pressão sobre as pessoas, que trabalham nos organismos sujeitos a estes cortes, sejam quadros técnicos sejam trabalhadores menos qualificados, é dramática. A motivação é sobretudo negativa, pelo medo, pela insegurança quanto ao futuro. É com isto que contam. A pressão psicológica (stress) a todos os níveis torna o trabalho verdadeiramente penoso, destruindo o espírito de equipa e o bom relacionamento interno, traduz-se na degradação da qualidade e da produtividade dos serviços, cada qual mais preocupado com a demonstração burocrática do que nos resultados reais. O risco de lançar serviços no caos ou na completa inoperacionalidade é evidente.
O governo PSD-CDS na sequência dos “êxitos” do PS nesta via, vai ainda mais fundo. Após a mentira eleitoral recorre agora à chantagem e a “publicidade enganosa”, escamoteando a riqueza que oligopolistas e especuladores retiram do país para paraísos fiscais.
Os gestores incompetentes, é o caso dos governantes actuais, tal como os anteriores…- substituiem procedimentos, pelo voluntarismo de afirmações e decisões inconsequentes, como se as suas declarações alterassem o que quer que fosse da realidade.
Por voluntarismo entende-se a tendência para impor decisões sem as justificar. Isto é, sem correspondência com a realidade.
Nada mais resta aos títeres ao serviço das oligarquias criar cenários apocalípticos, da mesma forma que se justificam as guerras. O voluntarismo das declarações dos governantes e apoiados pelos seus comentadores avençados, tem equivalente nas dos chefes militares na derrota.
Os “cortes na despesa” não passam, pois, de demonstração de incompetência e tácita confissão de derrota face aos reais problemas do país e do povo.

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