FATAL COMO O DESTINO…
A propósito do “Manifesto pela Democratização do Regime”,
Ou de como lavar as responsabilidades de PS, PSD e CDS (pelas
políticas dos últimos 37 anos), que conduziram Portugal ao desastre…
1.Na 3ª feira, 12 de Março, 60 estimáveis cidadãos deste País
pronunciaram-se através de um Manifesto pela Democratização do Regime, sobre “A
tragédia social, económica e financeira a que vários governos conduziram
Portugal” e indiciam o caminho para lhe responder.
Discorrendo sobre a crise nacional, fazem uma breve
referência à “austeridade sem desígnio” e aos “sacrifícios impostos aos
trabalhadores” que põem em causa “O factor trabalho e a prosperidade das
pessoas e das famílias”.
Reconhecem a “vigilância internacional” do País, sem identificar os
vigilantes, a Troika, o FMI, o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia!
Criticam o “poder político” (quem???) por “culpar os portugueses” e dividi-los,
novos/velhos, empregados/desempregados, trabalhadores do sector público/sector
privado. E depois, num texto com …parágrafos e …caracteres, concentram toda a
infantaria, artilharia e cavalaria da crítica no “sistema político”, que depois
se vê, se resume a uma das suas compenentes, o sistema eleitoral – a escolha
dos candidatos, o acesso à propositura de candidaturas, o voto nominal na
definição das listas dos partidos, o financiamento das campanhas eleitorais!
Muita parra e pouca uva!!!
Para os subscritores do Manifesto, o “sistema
político/sistema eleitoral é responsável por todas as desgraças e problemas do
País. O “pior dos males que afecta a democracia portuguesa”. Impede “o aparecimento
de verdadeiras alternativas”. Permite/facilita uma “rotação no poder”
desperdiçando oportunidades como os “apoios recebidos da União Europeia”.
Permite o assalto das “juventudes partidárias” (inexperientes na governação e
impreparados) “ao topo do poder político”. É responsável pelo descrédito da
Assembleia da República (de onde desapareceu a vontade de ajuizar e de
controlar os actos dos governos”). Pelo descrédito dos deputados. De “Governos
sem ideias, sem convicções, sem sabedoria nem estratégia”. Enfim, da falta de
soluções para a crise. E porquê? Porque “nada será possível sem um processo de
reformas profundas no Estado e na economia” (Quais??? O Manifesto não
esclarece!). E os “obstáculos” a essas reformas, que não alcança quais sejam,
estão em “primeiro lugar, nos interesses de uma classe política instalada e na
promiscuidade entre o poder político e os interesses financeiros”. Logo,
“Impõe-se uma ruptura” do “sistema politico”/sistema eleitoral, com “três
passos fundamentais”: 1) “eleições primárias dos candidatos”; 2)”apresentação
de listas nominais de cidadãos, em eleições para a Assembleia da República”
(julga-se que à semelhança de Itália, onde produziu o Grillo) e “obrigatório o
voto nominal nas listas partidárias”; 3) “igualdade de condições no
financiamento das campanhas eleitorais” (seja o que isto for?!).
Como se vê, é fácil, resolver os problemas do País! Mudam-se
as leis eleitorais e tudo será diferente. Mesmo que PS, PSD, e CDS mantenham as
mesmas opções politicas!!!
Se há subscritores, que assinaram de boa-fé e convictos o
Manifesto, teremos de assinalar a sua enorme ingenuidade política. Porque de
facto, trata-se de um projecto político, de um enorme tartufismo e hipocrisia
politicas.
2.Um Manifesto sem
sujeitos políticos ou políticas concretas responsáveis pelo estado a que o País
chegou
Ou de como o “substantivo colectivo” submerge na
clandestinidade/oculta os agentes políticos concretos/objectivos, os partidos
políticos e os eleitos – autarcas, deputados, membros do governo, presidentes
da República, etc.
É notável que num texto político, que fala de “rotação no
poder”, de “partidos” e “direcções partidárias”, que critica o “poder político”
e os “Governos”, não refira uma única vez, o PS, PSD e CDS, os tais partidos do
dito arco governamental. Ou pretende-se incluir o PCP e outros? Gostaríamos de
saber! Quais os partidos e as maiorias parlamentares que suportaram os
“Governos” que “colocaram os portugueses numa situação de falência, sem
esperança, rumo ou confiança”? Quem são os que enveredam pela “afronta de
culpar os portugueses e dividi-los”??? O Manifesto não esclarece!
Mas não são apenas estes, os réus da situação e da crise, que
ficam por identificar. Nada, dizem sobre os responsáveis do processo de
integração europeia, sobre os partidos e os agentes políticos que há muito e
hoje dirigem a União Europeia? Estão inocentes? Não têm nenhumas culpas no
cartório? Os que orientam e decidem na Troika, os que impuseram o Pacto de
Agressão, nada têm a ver com os nossos problemas actuais? Pior, o Manifesto,
sem qualquer rebate crítico, fala dos “políticos com visão” que “souberam
colocar Portugal na Europa”, fala de participar “no relançamento do projecto
europeu”! Qual? O que impôs a Troika (“a vigilância internacional” segundo o
Manifesto!) e o Pacto de Agressão? O que mergulhou Portugal numa profunda
recessão, com mais de um milhão de desempregados? O “projecto” que é causa ( e
ainda a missa vai a meio) de que
“O Estado Social” esteja “a desmoronar-se”! O projecto que dá todo o seu
apoio à política responsável “pelos sacrifícios impostos aos trabalhadores”?
Responsável pelo “futuro de dezenas de jovens sem emprego ou com salários que
não permitem lançar um projecto de vida”? Responsável pelos “sacrificios
exagerados impostos aos mais pobres e à classe média? Uma Europa e um projecto
europeu, que assiste a tudo isto, e bate palmas ao bom e obediente aluno, o
Governo PSD/CDS, Coelho/Portas! E quem são os agentes políticos dos países do
Directório, do dos Conservadores, do PSEuropeu e de outros que tais, que estão
nos Órgãos da União Europeia, e no BCE, e etc! Nem uma palavra. O silêncio é de
ouro…ou de euros!
Tão grave como os “esquecimentos” atrás referidos, é o
silêncio total do Manifesto na identificação – entidades ou indivíduos – “os
interesses financeiros” que participam da “promiscuidade” com “o poder
político”! É a Banca e os banqueiros”? São os Grupos Económicos Monopolistas?
Os Grupos da Grande distribuição estão incluídos, nesses “interesses
financeiros”? Moita carrasco! Nem uma palavra sobre a subordinação, ao longo
destes anos, do poder político ao poder económico, aos tais Grupos, violando
gravemente a CRP!
Também a objectivação das opções e politicas concretas de sucessivos
Governos PS, PSD e CDS ficaram no tinteiro, ou no teclado! Governos “sem
ideias, sem convicções, sem sabedoria” segundo o Manifesto, o que é
rotundamente falso, porque as políticas que levaram a cabo, representavam,
“ideias” – as do capitalismo neoliberal – traduziam “as convicções” de
deputados e governos do PS, PSD e CDS – e até tiveram a “sabedoria” para as
concretizar, atropelando a CRP e os interesses nacionais, apesar da resistência
dos trabalhadores e do povo português. Mas é evidente que não quer o Manifesto
falar das causas, das políticas (do PS, PSD e CDS) que conduziram o País à
crise! Não fala nem quer falar das condições de adesão à CEE, do processo de
privatizações e liberalizações, da reconstituição (e da estratégia) dos grupos
económicos monopolistas, do papel central e dominante atribuído ao investimento
estrangeiro e da desvalorização do mercado interno, das políticas comunitárias,
do comércio externo, da PAC, da PCP, etc, da adesão ao euro, da subversão do
SNS e da Escola Pública. Componentes centrais da política de recuperação
capitalista e monopolista, levadas a cabo por sucessivos governos do PS, PSD e
CDS, responsáveis pelo brutal endividamento do País, pelo desastre económico e
social que enfrentamos.
O Manifesto não fala nem quer falar das políticas em curso do
actual Governo PSD/CDS, conformes com o Pacto de Agressão e sob a orientação da
Troika, que replicam em versão agravada as causas que aqui nos conduziram.
O silêncio do Manifesto sobre os autores e agentes dos crimes
cometidos contra o País, os partidos PS, PSD e CDS, as suas maiorias, e os seus
governos, sobre os autores e agentes do grande capital, sobre os autores e
agentes da integração capitalista europeia, sobre as políticas económicas e
sociais, onde convergiram e que defenderam, não é fortuito, nem por
esquecimento.
Assim se absolvem as políticas de direita e as
responsabilidades políticas de PS, PSD e CDS, dos seus dirigentes e direcções
partidárias, dos seus governos! Assim se absolve o papel do capital monopolista
e financeiro reconstituído por aquelas políticas e governos. Assim se absolve a
integração capitalista europeia, e a sua evolução neoliberal, federalista, e
imperialista.
E se estes políticos e estas políticas não são culpados,
alguma coisa terá de ser. Era fatal como
o destino! Falhando as medidas económicas e sociais da Troika e Pacto de
Agressão, postas em prática pelo Governo PSD/CDS e apoiadas no fundamental pelo
PS, a culpa ia parar inteirinha no sistema político/sistema eleitoral. Isto é,
no Regime Democrático de Abril, na CRP!
Não sendo a culpa das desgraças do País, do PS, PSD e CDS, do
grande capital, das políticas da União Europeia, é culpado o sistema eleitoral,
o nº de deputados, o nº de freguesias e concelhos, os executivos não homogêneos
das câmaras, etc, etc, etc.
Há outra razão para os “esquecimentos” do Manifesto: alguns
dos seus subscritores subscreveram/avalizaram/apoiaram/votaram durante anos
aqueles partidos e políticas, foram deputados e ministros e responsáveis
políticos dos que governaram, etc, etc, etc
3.E depois de tão
grande montanha proclamativa, um rato anão e raquítico, e vesgo nas
propostas…para emendar o sistema eleitoral!
Assinale-se a ausência, provavelmente considerada insignificante,
sobre os rumos de uma política alternativa. Sobre o programa político que
permita “corrigir um rumo que nos conduziu à actual crise e realizar as
mudanças que isso implica”. Sobre o que pensam os “manifestantes” sobre “as
reformas profundas no Estado e na economia”. Coincidem com as do Governo
PSD/CDS, com as propostas da Troika? Não se sabe!
Mas atenda-se às propostas de “ruptura” no sistema eleitoral.
Algumas interrogações a que o Manifesto devia responder. Ou pelo menos fazer
alguma reflexão.
Embora com os males dos outros bem a gente possa, como
explica o Manifesto que países com regimes eleitorais (e mesmo estruturas
partidárias) tão diversos, tenham sido conduzidos a situações
económico-financeiras e sociais tão semelhantes, como Portugal, a Grécia, a
Irlanda, a Espanha e a Itália, (e outros) ??? Será que a actual “homogeneidade”
de situações, é o resultado de políticas ou de sistemas eleitorais? Dependerá
das maiorias politico-partidárias – simplificando, conservadoras ou sociais-
democratas – quando há exemplos para todos os gostos???
Será que a apresentação de “listas nominais de cidadãos em
eleições”/ “candidaturas independentes” nas autarquias revolucionou/constituiu
uma “ruptura” na política autárquica”? Será que os isaltinos, os valentins
loureiro, as fátimas felgueiras, são bons exemplos dessa ruptura? Será a
eleição (das listas) de Pepo Grillo, ou de um …Coelho, a ambição do Manifesto?
Será que os partidos políticos devem ou não ser responsáveis
pelos seus actos – programas, opções politicas, comportamentos, correspondência
entre promessas eleitorais e práticas políticas, pelas votações no Parlamento e
decisões no Governo? Como assumir essa responsabilidade, quando não são da sua
responsabilidade a escolha dos seus candidatos, quando os seus eleitos votem em
questões estruturais à revelia do Partido? São os Partidos simples “escadas do
Poder”, sem estatutos e principios, sem programas e propostas de medidas, sem
opções estratégicas e ideologia, por onde trepam para o poder, os cidadãos
eleitos pelos cidadãos? Os cidadãos do PCP a escolher os candidatos do PSD ou
PS! Os cidadãos do CDS a determinar os candidatos do PCP. Não se trata apenas
de um monstruoso absurdo político! É o fartar vilanagem á demagogia e ao
populismo mais extreme e inferne!
O que é isto de “garantir a igualdade de condições no
financiamento das candidaturas”??? Como é essa a via para a eleição de
“políticos incompetentes”? É acabar com o financiamento público? É estabelecer
um custo campanha igual por candidato? O manifesto não esclarece, e deixa mais
uma vez campo à mais profunda demagogia e populismo!
Mas o estranho, é o silêncio (mais uma vez) do Manifesto
sobre a profunda desigualdade da cobertura e espaço mediático pelos órgãos de
comunicação social, dos diversos partidos/candidaturas, nas campanhas
eleitorais e fora delas! Nada diz, sobre a multidão de comentadores e
articulistas, que sob os rótulos de “independentes” ou “especialistas” divulgam
e promovem as ideologias político-partidárias da maioria do tal arco do poder
(dominante), de e da direita, submergindo/ocultando os partidos e políticas de
esquerda que os enfrentam e afrontam. Será porque a gestão política desse
espaço pertence ao outro poder dominante, o grande capital proprietário dos
OCS? E no entanto, ninguém liquida mais a existência de alternativa política e
de políticas alternativas, impedindo a criação de uma autêntica “rotação no
poder” que a comunicação social dominante, por privilegiar a alternância à
alternativa!
4.Um gato com um rabo muito
grande de fora…tão grande, que muitos tropeçaram
Resta registar outro silêncio do Manifesto. A não
identificação das forças sociais e políticas, nomeadamente do PCP, que ao longo
destas dezenas de anos de políticas de direita do PS, PSD e CDS, previu e
preveniu sobre o resultado dessas políticas. Está escrito. É fácil comprová-lo.
Até a denúncia, de que a degradação do regime democrático acompanharia
inexoravelmente a reconstituição do poder económico e político do capital
monopolista.
Quando no seu texto o Manifesto fala das “honrosas excepções”
para quem a Assembleia da República não representa “um emprego garantido,
conseguido por anos de subserviência às direcções partidárias, e de onde
desapareceu a vontade de ajuizar e de controlar os actos dos governos”, fala de
quem? De deputados individualmente considerados? De Grupos Parlamentares? Porque
não separa o Manifesto o trigo do joio? Não informando nem esclarecendo, o
Manifesto cobre com a suspeição o GP do PCP (e outros), que sabe não
corresponder à sua denúncia! Mas se sabe, não pode fazer “teoria” desse
jaez!
Acrescente-se: algumas das propostas de mudança no sistema
eleitoral do Manifesto, coincidem com propostas vindas do PSD e PS, que nunca
esconderam a sua vontade de reduzir através de engenharias eleitorais a
influência do PCP, e garantirem um seguro de vida perpétuo à sua alternância no
poder!
Um dos subscritores do Manifesto, reforçou as teses do mesmo,
completando a assinatura conjunta, com um artigo (Público 13MAR13) sob o título
“O estertor do partidismo”.
De facto, a abordagem não tem nada de novo, é a continuidade
do método “tudo no mesmo saco”, para não se distinguir o que tem de ser
distinguido porque é diferente, para assim se fazer a contraposição artificial
do “cidadão politicamente activo” aos “partidos”, para assim com a concentração
no (nos problemas do) sistema eleitoral, se elidir a questão central do poder
de classe do capital! Será que o dito cidadão politicamente activo, articulista
regular na última página do Público, se interrogou, sobre a “desigualdade” no
acesso a essas páginas do PCP, quando olha para os artigos de deputados e
dirigentes do PS, PSD, CDS (e outros) ???
Os “combatentes” do “partidismo”, de facto os subscritores do
Manifesto, sendo democratas, não podem deixar de sentir um estranho arrepio
político-ideológico, com a sua estranha guerra aos “partidos” em geral, sem
distinguir nem diferenciar. Devem lembrar-se dessa obsessão noutros tempos e
noutras gentes…Obsessão, que nunca escondeu que era o Partido Comunista o seu
“verdadeiro” adversário.
O antipartidarismo nunca andará muito longe do anticomunismo,
mesmo se disfarçado, de “ruptura” no sistema eleitoral.
Agostinho Lopes
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