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21 de março de 2012

O QUE É PRECISO PARA SER DE ESQUERDA?

“A direita europeia mimetiza os revolucionários do passado e postula a existência de amanhãs que cantam. Sob a destruição do presente, surgirá necessariamente um futuro radiante, próspero e redentor. Lenine não o diria melhor”
Este o final de um artigo do sr. João Galamba, no Le Monde Diplomatic – MARÇO 2012.
Penso que devemos desculpar o disparate - pois pode ter origem na má ou na falta de informação - gracinhas é que não.
No texto referido critica-se o recente "Tratado de Estabilidade e Governação" da UE e a economia da austeridade e suas consequências. Não podemos estar mais de acordo. Porém são críticas muito pouco consequentes com o que votou no passado e na forma como continua a votar atualmente.
É isto que me leva a questionar: o que é preciso para ser de esquerda? Criticar as políticas de direita, tal como a direita criticava como sendo de esquerda o que no essencial eram as mesmas políticas de austeridade e enfeudamento ao neoliberalismo da UE? Ser de esquerda tem que ser mais do que “mimetizar” os reacionários do presente…
Ser de esquerda terá que ver também com varrer as teias de aranhas ideológicas e procurar informar-se confrontando factos e opiniões não gerados e controlados pelas centrais de informação do sistema.
O autor do artigo que diga e vote como entender, mas não diga disparates nem gracinhas, tratando com sobranceria que me parece próxima do desprezo os revolucionários do passado que deram o melhor das suas vidas, a sua própria vida e sofrimentos inenarráveis em nome dos “amanhãs que cantam”. Expressão que esconde toda a tragédia dos “mortos sem sepultura” que lutaram por todos nós, por toda a Humanidade. Também por aquilo que neste país e em todo a Europa a direita está a destruir aceleradamente com a anuência ou com a cumplicidade de partidos que se dizem de “esquerda”.
Quanto à questão de Lenine ser uma espécie de vândalo, um huno, um chefe de bárbaros criminosos, está enganado. Quem destruiu a Rússia nos anos seguintes à Revolução de Outubro foi a intervenção estrangeira de países como a França, Reino Unido, Alemanha, EUA em aliança com tudo o que de mais reacionário e criminoso havia na Rússia de então. Lenine fez a revolução em Petersburgo sem derramar sangue e em Moscovo houve apenas uma pequena escaramuça. Quis no seu governo vários partidos e tendências, mas o que o malquistou com partidos que se diziam de esquerda foi querer por em prática aspetos que justamente faziam parte dos programas de vários desses partidos: foi a questão da paz – que todos diziam querer – foi a entrega da terra aos camponeses e liberta-los da opressão e arbitrariedade, foi o controlo operário nas fábricas e serviços para evitar a sabotagem e garantir a produção.  H.G.Wells classificou-o como “o sonhador do Kremlin”. Enquanto os fuzilamentos e massacres e a obra de terra queimada prosseguia sob o comando das potências capitalistas, Lenine protegia os tesouros artísticos da Rússia, fomentava-se a cultura, dava inicio a algo desconhecido até ali: ao que podemos talvez classificar como “estado social”, e ao planeamento económico nacional, com o GOELRO, pondo em prática a electrificação e o poder dos sovietes. Seria isto destruir? O chamado comunismo de guerra o recurso económico face à barbárie imperialista da democracia burguesa (isto é, dos grandes detentores de capital) e da fome que originou. Quando a guerra terminou este modelo foi desde logo abandonado. E quem quiser seriamente saber o que se passou sem ser informação controlada pela CIA e quejandos, consulte www.historia do socialismo .
Parece que para certas pessoas, ser esquerda “responsável” passa por ser tratado pela direita como animal doméstico de estimação – e disciplinado como tal – e por mostrar “ativo repúdio de todas as ideias comunistas e todas as formas de subversão”, à semelhança do que o fascismo obrigava os funcionários a assinarem.
Ter ativo repúdio dos monopólios e latifúndios (ou o seu sucedâneo os oligopólios da produção e distribuição agroalimentar) seria um bom princípio para se ser de esquerda, embora muito pouco, contra isto já eram os clássicos do liberalismo. Terá alguma lógica nem isto prezar e considerar-se de esquerda?
Afinal o que é preciso para entrar no reino dos céus? - perguntou o jovem a Jesus. Talvez convenha atentar no que Cristo recomendou.
Não basta para se considerar de esquerda criticar a direita. Na minha opinião, a esquerda terá  de defender que na sociedade vigore não a lei fundamental do capitalismo – a maximização do lucro – mas a maximização dos benefícios sociais. Tema que vale a pena abordar.

1 comentário:

o castendo disse...

Parabéns. Boa malha.
O link não funciona.