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10 de outubro de 2014

A economia portuguesa depois do euro



Após a adesão à CEE e ao programa do Mercado Único Europeu no final dos anos 80, após a revisão constitucional de 1989 em que o principio da irreversibilidade das nacionalizações foi eliminado e o Governo pode reprivatizar as empresas nacionalizadas e abrir porta ao seu domínio por capital estrangeiro, era então o actual Presidente da República Cavaco Silva, Primeiro-Ministro, o Governo PSD da altura e os que lhe sucederam PS, PSD /CDS, PS e novamente PSD/CDS, procederam a um vasto processo de liberalização e privatização dos sectores fundamentais da nossa economia, que se prolongaria até aos nossos dias e que marcou de forma profundamente negativa a evolução da nossa economia desde então – abrandamento e recessão económica, aprofundamento da nossa dependência externa, com o endividamento externo líquido e o endividamento público a crescerem de forma exponencial, destruição do aparelho produtivo, maior precariedade no emprego, quadriplicação do nível de desemprego, agravamento na distribuição do rendimento, cortes profundos nos direitos sociais e regresso em força da emigração, com centenas de milhares de portugueses, em especial jovens a abandonarem o país -.
Este é um retrato sintético do rasto de destruição das políticas prosseguidas pelos sucessivos governos e em especial desde a 1ª fase da criação da UEM em 1992.
Mas vale a pena ilustrar de forma concreta esse rasto de destruição que vem sendo deixado desde o início deste processo.  

Se numa 1ª fase o processo de privatizações se concentrou no sector financeiro, desfazendo-se da quase totalidade dos bancos públicos, desregulamentando a actividade bancária e liberalizando por completo a circulação internacional de capitais até final de 1992, em todo o processo de privatizações foram realizadas cerca de 250 operações de privatização, que se estenderam para além do sector financeiro a outros sectores estratégicos, como o sector energético (Petrogal, EDP, REN), o sector das telecomunicações (Portugal Telecom e CTT), o sector dos cimentos (SECIL e CIMPOR), o sector da pasta de papel (Portucel e Soporcel), o sector químico (Quimigal e Companhia Nacional de Petroquímica) e o sector siderúrgico (Siderurgia Nacional) e o Estado arrecadou mais de 40 mil milhões de euros, cerca de 25% do PIB de 2013.   
Os sucessivos governos justificaram este autêntico crime contra a economia nacional que representaram e representam as privatizações, por que elas continuam enquanto houver empresas públicas rentáveis, com o objectivo sempre propagandeado da redução da dívida pública. Mas a verdade é que quando elas se iniciaram a dívida pública representava 54,3% do PIB e hoje essa dívida representa já 134% do PIB, ou seja ela há muito que duplicou o valor com que se iniciaram as privatizações.
A verdade também é que ao contrário do que a propaganda sistemática que os vários governos foram fazendo e vale a pena citar o 1º governo de António Guterres que dizia: “ As privatizações permitem que o Estado se afaste do papel de acionista em empresas onde o interesse nacional já não exige a sua presença, para dedicar mais recursos à saúde, à educação e à segurança, sectores onde a sua acção é decisiva para o bem-estar colectivo.” E que dizia também “ O Estado paga por ano mais de 700 milhões de euros de juros (um parenteses para dizermos que hoje o Estado paga mais de 7 mil milhões de euros por ano) e as receitas das privatizações permitem o reembolso da dívida pública, o que reduz os juros suportados pelo Estado.”

Ora pura mentira e mistificação muitas das empresas privatizadas eram empresas de sectores estratégicos, como o sector financeiro, o sector energético, o sector cimenteiro, o sector siderúrgico e o sector das telecomunicações e a sua privatização permitiu que estes sectores passassem a ser dominados pelas velhas famílias monopolistas nacionais agora aliadas com interesses maioritários de capitais estrangeiros, os quais com a liberalização dos movimentos internacionais de capitais permitida com a 1ª fase da criação da UEM, passaram a adquirir grande parte das empresas privatizadas ou concederam empréstimos aos investidores nacionais para esse fim (ou ganhavam de uma forma ou de outra).
Por outro lado passados todos estes anos sobre estas afirmações em que se mente justificando as privatizações com a necessidade de libertar recursos públicos para investimentos em saúde, educação, habitação e segurança social e se constata toda a degradação a que SNS foi sujeito, os encerramentos que se verificaram de centenas de centros de saúde, os milhares de escolas encerradas e a degradação da qualidade de educação, o encerramento de esquadras e a degradação das condições de trabalho das forças de segurança, apetecer-nos-ia realçar a lata destes senhores, se tudo isto não tivesse tido em muitos casos consequências trágicas para as nossas populações.
Vale ainda a pena referir para melhor percebermos a dimensão do crime económico que vem sendo cometido que só os grupos económicos que resultaram do processo de privatizações e que estão no PSI 20, arrecadaram de lucros líquidos só no período entre 2004 e 2012, cerca de 44 mil milhões de euros, ou seja a preços correntes em 9 anos já deram de lucros aos seus donos, mais do que renderam ao Estado com a sua privatização. É por esta mesma razão que a nossa balança de rendimentos, que espelha a saída e entrada de rendimentos se agravou de forma assustadora desde o início deste processo, se em 1996 o saldo dessa balança sendo negativo (sinal de que a saída de rendimentos era superior à entrada) era de 3,4 milhões de euros, em 2013 esse saldo negativo é de 3 353,2 milhões de euros (multiplicou por mil!!).
As privatizações acompanhadas pela liberalização da circulação internacional de capitais foram sem dúvida uma das pedras angulares das políticas dos sucessivos governos PS e PSD/CDS nas últimas décadas e conduziram o nosso país ao triste estado em que se encontra hoje: com um quase permanente estado de recessão ou estagnação, com um nível de produção que em termos reais está ao nível de 2000 e um nível de investimento que está ao nível de 1988, com desemprego profundo e com mais de 1 milhão e quatrocentos mil desempregados em termos reais, com uma destruição de centenas de milhares de postos de trabalho em especial na indústria e agricultura, com quase 3 milhões portugueses a viver abaixo do limiar de pobreza, com o endividamento público atingir os 134% do PIB e o endividamento externo líquido a atingir os 123,7 % do PIB (quando este mesmo indicador era de 9% do PIB em 1995), com a emigração a ultrapassar os 300 mil portugueses só nos últimos 3 anos, e com o peso dos salários e ordenados a atingir o seu mais baixo nível de sempre,  38,1% do rendimento nacional quando em 1974 era de 52,7%.
Perante tudo isto é definitivamente necessário e urgente uma outra política, uma política patriótica e de esquerda, em que a defesa dos interesses de Portugal e do povo português seja determinante no rumo a seguir pela política nacional.
Uma outra política em que o poder económico se subordine ao poder político, em que o Estado tenha uma posição dominante nos sectores estratégicos da nossa economia, em que se acabe com todo este criminoso processo de privatizações em curso e se reverta para o sector público, por nacionalização e/ou negociação adequadas empresas e sectores privatizados, afirmando um sector empresarial do Estado forte e dinâmico, capaz de responder aos desafios que a sociedade dos nossos dias nos coloca, de defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do nosso país.
28 de Setembro de 2014
José Alberto Lourenço (CAE)                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                     

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