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30 de novembro de 2020

A ECONOMIA E AS SOLUÇÕES POLÍTICAS

 Intervenção no Congresso de

Agostinho Lopes, do Comité Central do PCP




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1. A política de direita dos governos PS, PSD e CDS conduziu o País a um desastre. O Covid só o agigantou. E tornou-se um revelador eficaz  das suas causas. Permitiu imprimir fotografias de grande nitidez das múltiplas dimensões do desastre. E uma identificação perfeita dos seus obreiros: PS, PSD e CDS. Mas que teve o apoio dos que hoje navegam outras águas na direita, o que é da natureza dos ratos quando o naufrágio é eminente... Que teve o apoio dos que ontem eram esquerdistas, radicais pequenos burgueses de fachada socialista de muitas estirpes, e depois transitaram para a direita, onde hoje mergulham, sempre, sempre, anticomunistas.

No desastre do País medra a angústia, o desespero, a fadiga, a raiva, os becos sem saída. A emigração como solução. Medra o oportunismo de um capitalismo periférico, consolidado pela política de direita, subsidiodependente e dependente do Estado, avesso ao risco, fugindo ao fisco – ver operação Furacão e sedes fiscais na Holanda – amigo da precariedade e dos baixos salários, salários sempre responsabilizados pelas baixas produtividades.

E temos défices, dívidas e dependências estruturais, e parece que quanto mais juros pagamos, quanto mais cortamos ao défice, quanto mais poupamos no investimento público, mais os buracos se afundam, mais o rendimento nacional se esvai em dividendos que emigram, em capitais que se evadem para paraísos fiscais, em corrupções sem fim. Temos autoestradas (uma das melhores coberturas da Europa), não temos transportes. Temos ciclovias e ecopistas a cavalo da destruição de centenas de quilómetros de via férrea. Temos muito capital estrangeiro para comprar empresas e sectores estratégicos, não para investir em novos activos. Temos muitos bancos de nome português, mas que são espanhóis. Temos grandes grupos económicos que se endividam para pagar dividendos acima dos lucros, compensando accionistas acima das suas possibilidades. Temos um SNS ratado pelo negócio da saúde. Temos universidades e escolas que formam profissionais de excelência, para os exportarmos para os países ricos da UE. Temos altas produtividades nas multinacionais mas somos campeões dos baixos salários. E sempre que se fala em subir o SMN há alguém que puxa da pistola... Temos muita electricidade de origem renovável, da água dos rios, do vento e do sol ao preço da chuva, e pagamos das mais elevadas facturas energéticas. Temos muitos órgãos de informação, não sei quantos canais televisivos, mas não temos informação. Temos desinformação, manipulação e notícias falsas. E quando se trata do PCP temos de juntar a ocultação (por exemplo, a RTP 1 no Telejornal de 24NOV20/OE 2021 ocultou a aprovação nesse dia, da proposta do PCP de reforço do SNS, enquanto  noticiava propostas de outros partidos). Temos terra agrícola e água mas o País registou em 2018/19 a mais baixa área de cereais semeada nos últimos cem anos! Temos floresta de eucaliptos, pinheiros e autóctones mas é para arder. E quando não arde é para arrasar para plantar eólicas e fotovoltaicas. Temos reguladores e até uma Autoridade da Concorrência e florescem os cartéis, as rendas e os abusos de posições dominantes e de dependência económica. Mesmo quando temos dinheiro na Tesouraria Pública, não é certo que o Estado pague a quem deve atempadamente, porque o défice orçamental é quem manda fechar ou abrir a caixa registadora. Temos, dizem, a solidariedade europeia, mas os seus órgãos atanazam os nossos orçamentos porque eles  aprovam aumentos de 10 euros às pensões de trezentos euros! 

Poderia, com Gedeão dizer: como Filipe II temos tudo, tudo, tudo, só ainda não temos o fecho-ecler para fechar o País às políticas de direita... Mas temos. Temos a intervenção do PCP e a luta do nosso povo.

2. Na resposta ao desastre, com variantes, uma solução é dominante nos media. O tiro ao alvo sobre o regime democrático de Abril, para não mexer na política de direita. A ruptura – com Abril,,  não a ruptura com a política de direita. Em particular, alterações do sistema eleitoral e da estrutura e equilíbrio dos seus órgãos de soberania.

No pântano do desastre emergem – nunca morreram  – as soluções políticas da extrema-direita, para agravar a exploração por um capitalismo dito liberal. A solução política para o desastre, segundo essa gente, é a demolição da Constituição, da liberdade e da democracia. Reduzir os deputados a deputados nenhuns. Substituir a República de Abril por uma II república corporativa.

O outro caminho político é assegurar a continuidade de uma política de direita reformada. Suportada por um recauchutado bloco central capaz de a «modernizar», através de umas ditas reformas estruturais, com algum serôdio liberalismo à mistura. Sem descurar reformas do sistema político, como a redução do n.º de deputados.

Uma política de direita, depois de uma lavagem adequada graças à economia digital e à transição energética como sabão e o chuveiro ideológico e de diversão das centrais de propaganda e pensamento estratégico do capital. De Davos com o capitalismo reformado dos stakeholders, de Bildeberg, por cá disfarçados de modestos pensadores dos Encontros de Cascais. Está tudo no Expresso.

O que não é contraditório com gente de boa fé na social-democracia, empenhados neokeynesianos, preparados para reformar o capitalismo, atribuindo-lhe responsabilidade social, embrulhando-o em ética empresarial, glorificando o mecenato cultural.

Que, diga-se aprenderam com o Covid. Que os obrigou a recuperar fórmulas e instrumentos de governação que pensavam antiquados. Como surge nítido nos planos do planeador do Governo PS, António Costa Silva. Recuperaram, para já só no discurso, o que consta do arsenal político da esquerda consequente e marxista: a intervenção do Estado, a planificação, o investimento público e a reindustrialização,  a soberania na produção agroalimentar e de bens estratégicos, a necessidade de um aparelho do Estado capaz e de qualidade. Descobriram até, recentemente, que faltavam 1000 técnicos qualificados na IP/Infraestruturas de Portugal e outros tantos nos departamentos de planeamento do Estado! 

Naturalmente, sem nunca pôr em causa as lógicas, dinâmicas, natureza classista do capital monopolista. Sem pôr em causa a integração capitalista europeia e o federalismo, o euro e o imperialismo do Directório das grandes potências. 

3. O que não é possível negar é que o PCP denunciou, avisou e combateu o que hoje parecem ser revelações para alguns.

A relação biunívoca entre o capital monopolista reconstituído pela recuperação capitalista e imperialista e a degradação da democracia.

Que a integração comunitária e a adesão ao euro serviriam para assegurar uma divisão europeia do trabalho assimétrica, corroendo a estrutura produtiva e agravando a dependência do capital estrangeiro, acentuando dependências e défices.

Que o enfraquecimento do aparelho do Estado, a redução das suas funções à regulação económica e a distribuidor de fundos públicos ao capital privado, entregaria a economia nas mãos do grande capital e fragilizaria os serviços públicos.  

Com a solução política assumida em 2015, o País respirou. Respiramos, mas não asseguramos a atmosfera e o oxigénio,  que o País precisa para viver e trabalhar.

Não desvalorizamos, insuficientes e parciais, os avanços no emprego, nos rendimentos, no crescimento do mercado interno. Impulsos à actividade económica por medidas propostas e mesmo impostas pelo PCP. 

Ao fim destes anos de governo minoritário do PS, os resultados são o que tinham de ser. São, porque o Governo PS assegurou, persistiu em assegurar, a continuidade das linhas estratégicas e estruturais da política de direita. E nem as frestas abertas pela solução política aproveitou. para responder a problemas com resposta, mesmo no quadro limitado das suas opções nucleares.

Atente-se na insuficiência  e falta de respostas aos problemas sociais e económicos causados pela epidemia. O atraso na concretização das tímidas medidas para as famílias e pequenas empresas. Conseguiram até subverter medidas que o PCP fez aprovar no Orçamento Suplementar de Julho. Tudo para conter a despesa orçamental e responder às exigências de Bruxelas.

Um dia destes soubemos do enésimo recomeço da exploração dos Ferros de Moncorvo. Que a EDP ia vender barragens no Alto Douro. É o desastre que continua…

4. Temos guia para caminhar. A nossa solução é Abril! O Programa Uma Democracia Avançada, os Valores de Abril no Futuro de Portugal. A Política Patriótica e de Esquerda. E a Resolução deste Congresso.

Sabemos como caminhar. Sabemos que não caminhamos sozinhos. Que o caminho a rasgar tem poderosos obstáculos. Mas que, absolutamente determinante, continua a ser o Partido Comunista Português. Cem anos de história são a melhor garantia de que estamos de pé, para resistir e avançar.  Árvore de forte tronco e raízes fundas, nesta terra e neste mar. Fiéis a esse legado. Confiantes no presente. Certos do futuro. Do futuro desta comunidade humana de quase 9 séculos: Portugal.


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