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16 de janeiro de 2022

Eleições e promessas por linhas tortas - 1

As promessas dos programas eleitorais geralmente tentam ou querem-nos convencer de uma escrita direita por linhas tortas. A esquerda será tanto mais consequente quanto, embora tentando escrever o mais direito possível por essas linhas, esclareça que nada fica garantido sem se endireitarem as linhas desenhadas em Washington e Bruxelas. Claro que para a direita essas linhas são as mais certas possível (não há alternativa!) e somos nós que não sabemos escrever... Quanto ao PS, oscila entre a mesma ideia e que em alguns casos é possível ficarem um pouco mais retas.

É assim que a estabilidade se tornou uma questão central das eleições, independentemente das linhas em que é inscrita, servindo de álibi para o "voto útil",e para manter o sistema ao abrigo de reivindicações e anular "ilusões progressistas". Para este efeito, tanto Bruxelas como Washington estão atentas para que outras linhas não sejam usadas.

A versão de estabilidade da política de direita (PS incluído) é que basta ter maioria no Parlamento e a partir daqui o que se passa no país parece que pouco conta, excetuando a "concertação social" a funcionar de acordo com os interesses capitalistas. É o que Marx denominava "cretinismo parlamentar".

"O cretinismo parlamentar consistia numa espécie de delírio que acometia as suas vítimas, as quais acreditavam que todo o mundo, o seu passado e o seu futuro se governavam por uma maioria de votos ditada por aquela assembleia (…) e tudo o que se passava fora daquelas quatro paredes muito pouco ou nada significavam ao lado dos importantes debates ". Marx, Revolução e Contrarrevolução na Alemanha

É esta a base da "democracia liberal" versão atual da democracia burguesa. As promessas eleitorais (como foi dito no governo PSD/CDS) caem ao ser aprovado o programa de governo na AR. Quer dizer, a "casa da democracia" dominada pelas "linhas tortas" anula o sentido de voto das eleições, para dar lugar às reivindicações da oligarquia. Note-se que eles chamam "economia" aos interesses do grande capital em primeiro lugar financeiro.

Uma dessas linhas tortas, que as políticas de direita nos querem convencer que são retas, é a questão do crescimento. É um axioma do liberalismo/neoliberalismo que "a melhoria das condições dos trabalhadores é sobretudo um problema de aumento da produção e de organização dos mercados e não um problema de redistribuição de riqueza".

Esta hipocrisia tem servido para justificar perdas de salário real e encobrir as obscenas desigualdades e riqueza acumulada nos "paraísos fiscais". Graças ás políticas de direita, Portugal é dos países de maior desigualdade na distribuição da riqueza: em 2017, 10% das famílias com maior riqueza liquida detinham 53,9% da riqueza total das famílias, as 50% mais pobres 8,1%. É este sistema que pretendem aprofundar seguindo o exemplo dos EUA (o país mais desigual) em que um punhado de ultraricos possui mais riqueza combinada do metade da população.

Isto acontece porque além do movimento sindical ser marginalizado, o argumento dos "custos no trabalho" serve para convencer a opinião pública desinformada e levar os trabalhadores a aceitarem a "austeridade" ou emigrarem.

Outra linha torta é a questão fiscal. Com isto procuram seduzir especialmente classe média, incluindo MPME, que estão preocupados com os seus problemas. Assim são contra a progressividade dos impostos, no limite defendem reduzir os impostos sobre o rendimento, passando os impostos a recair sobre o consumo, uma ideia perversa, vantajosa apenas para os mais ricos.

Uma medida tão evidente como taxar as transações financeiras e controlar os paraísos fiscais, mesmo não pondo em causa o sistema capitalista é totalmente escamoteada (se necessário combatida tenazmente) ao mesmo tempo que os países são atacados pelos défices públicos, precisamente pelos que se aproveitam deste sistema iníquo.

Em Portugal, os mais ricos entre os ricos não pagam os impostos devidos, o prejuízo para o Estado estimava-se na ordem dos 3 mil milhões de euros em 2016! Mas sobre isto não são avançadas medidas, pois as linhas defendidas pela UE são "livre circulação de capitais" e paraísos fiscais mesmo no seu interior, não permitindo que se endireite esta linha.

Graças às linhas ditadas de Bruxelas e Washington, a nível global, a classe dominante capitalista viu a sua riqueza crescer nos últimos anos e pagaram pouco ou nada de impostos, enquanto os trabalhadores e suas famílias perdem empregos, casas e saúde. Uma condição destrutiva e insustentável que viu os abismos de desigualdade e pobreza crescerem em praticamente todas as sociedades ocidentais.

1 comentário:

Monteiro disse...

O António Costa quer correr com a esquerda porque se envergonha e não sabe como explicar aos capitalistas que alianças fez com a chamada geringonça, então estiveram cá da nato e a senhora pelosi, uma vergonha.