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10 de maio de 2022

SNS

 SNS – É preciso defendê-lo!


Bernardino Soares



A defesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS) é uma batalha fundamental do tempo presente. Conquista fundamental da Revolução de Abril e da sua Constituição, o SNS foi responsável pela elevação acentuada dos indicadores de saúde e pelo acesso generalizado aos cuidados sanitários. Isto apesar de ter enfrentado, quase desde o início do seu funcionamento, o ataque da política de direita de sucessivos governos, que se acentuou nas últimas duas décadas.

O SNS é o melhor instrumento para assegurar o direito à saúde de toda a população, precisando para isso de manter as características com que foi criado – o carácter geral (isto é, com todas as valências e especialidades), universal (para toda a população e todo o território) e gratuito.

Mas o SNS não é só o melhor sistema para assegurar o direito à saúde a todos; é também o mais barato. Porque a opção de reduzir os serviços públicos de saúde e comprar mais ao privado corresponde inevitavelmente a maiores custos, se quisermos de facto abranger a universalidade da população.



Um COVID-19


Perante enormes exigências colocadas pela COVID-19 ficou ainda mais evidente que só uma estrutura pública e de carácter universal, integrando serviços de várias valências, estaria em condições de responder de forma global às necessidades.

Mas este período veio igualmente evidenciar as carências dos serviços públicos e os resultados de orientações políticas erradas e deliberadamente aplicadas para enfraquecer os prestadores públicos em favor do mercado privado.

Ficou evidente o erro colossal da redução de camas hospitalares nas últimas décadas, que obrigou a diversas soluções de recurso. Veio ao de cima o continuado desinvestimento na área da saúde pública, em situação de ruptura em muitas zonas do país, questão que praticamente não teve qualquer desenvolvimento positivo nestes dois últimos anos. Ficou igualmente evidente a quase total dependência externa do país em materiais e equipamentos clínicos e em produtos farmacêuticos.

Entretanto, a avalanche de novas necessidades decorrentes da COVID-19, acrescida de uma enorme falta de coordenação, dificultou ainda mais a resposta dos serviços de saúde, desumanizou os cuidados, encontrando soluções de recurso (como consultas por telefone e outros expedientes) que, em muitos casos, estão a deixar de ser transitórias ou complementares e tendem a consolidar-se como definitivas.

Como sempre, para o capital as crises são oportunidades para fazer avançar os seus interesses. A despudorada pressão que foi feita, incluindo por altos responsáveis políticos e dos principais meios de comunicação social, para contratar indiscriminadamente os privados (por exemplo, em camas hospitalares) ao mesmo tempo que não se promovia o reforço dos serviços públicos, é bem o exemplo da falta de escrúpulos com que os grupos económicos da saúde (tal como noutras áreas) fazem valer os seus interesses.

Certamente não merece oposição o uso de todas as infraestruturas do país, públicas ou privadas, de acordo com as necessidades de resposta em situação de emergência. Isso é, aliás, uma obrigação. Coisa diferente é a tentativa de criar de forma perene situações vantajosas para o privado com vista à apropriação de uma fatia maior dos recursos públicos.

Entretanto, as multinacionais do sector farmacêutico beneficiaram de um modelo de negócio absolutamente fabuloso. Tiveram apoios públicos (em particular da União Europeia e dos EUA) para desenvolver a investigação das vacinas contra a COVID-19, garantiram a compra antecipada de centenas de milhões de doses com pagamentos antes da produção e mantiveram as patentes blindadas, apesar de existirem regras na própria Organização Mundial de Comércio que prevêem o seu levantamento em caso de emergência sanitária. Resultado: aumento brutal dos lucros (os da Pfizer duplicaram em 2021, atingindo cerca de 22 mil milhões de euros (mais de 10% do PIB português) e entretanto a Organização Mundial de Saúde alerta para que 85% da população africana não tem qualquer dose de vacina administrada.



Um ataque sistemático ao SNS


O SNS está sujeito a um ataque sistemático praticamente desde a sua criação em 1979. Compreende-se porquê. Trata-se de um «mercado», de acordo com os dados do INE para 2020, de mais de 20 mil milhões de euros, entre consumo privado e despesa pública em saúde. Ainda por cima incidindo sobre uma condição indispensável à vida e à sociedade – a saúde – capaz de mobilizar recursos menos disponíveis noutras matérias.

Naturalmente, tal como a própria Constituição prevê, não está em causa a existência de prestadores privados na área da saúde. O que se contesta é que grandes grupos económicos de saúde se sustentem à custa, por um lado, da carência de resposta atempada dos serviços públicos e, por outro lado, do financiamento directo por recursos do Estado, seja por transferência directa do SNS, seja de outros subsistemas públicos (ADSE ou subsistemas das Forças Armadas, entre outros). O lucro dos grupos privados assenta na degradação do SNS e no desvio dos recursos financeiros públicos, de forma crescente, para o sector privado. 

O mecanismo, que vem acentuando a sua força nos últimos anos, é tão simples como perverso. A falta de resposta do SNS cria espaço para justificar mais contratações ao privado, que implicam mais recursos, que são retirados do SNS, impedindo o seu desenvolvimento e degradando ainda mais a sua capacidade. Quebrar esse círculo vicioso é fundamental.

É claro que esta situação não acontece por acaso. Sucessivos governos, comprometidos com a estratégia neoliberal da privatização do Estado, incluindo dos serviços mais essenciais, têm criado condições para que isso aconteça. 

Desde logo, pelo sistemático subfinanciamento a que é sujeito o SNS. Invariavelmente, ano após ano, as Administrações Regionais de Saúde e os Hospitais acumulam dívidas a fornecedores. Falta capacidade para investir e para a manutenção dos edifícios e dos equipamentos, para além da questão dos recursos humanos a seguir tratada. A despesa pública em saúde cobria, em 2019, apenas 60% do total da despesa em saúde, sendo o resto financiado pela população em pagamentos directos ou seguros e outros sistemas privados de acesso. Ao mesmo tempo a despesa pública em saúde em Portugal foi, no mesmo ano, correspondente a 5,8% do PIB, enquanto a média da União Europeia foi de 7%. O Estado não gasta demasiado em saúde em Portugal; são os cidadãos que pagam demais.

Mas o problema não se resume ao subfinanciamento. Há igualmente questões organizativas e de gestão que são ampliadas também pela escassez de recursos financeiros. Desde logo, a falta de autonomia dos hospitais e dos centros de saúde, que dependem, para grande parte das decisões, de autorizações da tutela do Ministério da Saúde e até das Finanças, mesmo que estejam integradas no seu orçamento anual. É o mecanismo de controlo do défice por cativações mais ou menos formais e pelo retardar da realização das despesas. Entretanto as necessidades acumulam-se e agravam-se. As equipas de gestão são escolhidas pela tutela e não reflectem qualquer tipo de participação dos profissionais de saúde de cada instituição pública, carecendo assim de uma legitimidade democrática que aumentaria a sua autoridade para dirigir.

A política de sucessivos governos é igualmente responsável pela descoordenação entre as unidades do Serviço Nacional de Saúde, com fortes prejuízos para os utentes e para a própria gestão global do sistema. Não há em geral (salvo honrosas excepções) uma partilha continuada de informação e de decisões entre os vários níveis de cuidados e outros organismos. As decisões e competências com impacto na organização dos cuidados de saúde estão disseminadas por uma miríade de entidades que funcionam na maior parte dos casos de costas voltadas entre si (Hospitais, ARS, ACSS, SPMS, ACES, SUCH, entre outras). Os programas e aplicações informáticos não comunicam ou são mesmo incompatíveis. O médico de família não tem em geral a possibilidade de consultar o registo de uma ida à urgência ou de uma consulta de especialidade do seu utente, nem sequer para saber que medicação lhe foi prescrita, porque o doente não tem um processo clínico digital centralizado. A gestão da rede de hospitais numa mesma região assenta em geral nos contactos bilaterais entre os seus responsáveis e não em qualquer coordenação organizada.

Outro aspecto determinante do enfraquecimento do Serviço Nacional de Saúde é a carência de investimento em infraestruturas físicas que se traduz em instalações degradadas e inadequadas, em ausência de novos centros de saúde e hospitais em regiões deles carenciados e na diminuição da capacidade do SNS em camas ou meios de diagnóstico e terapêutica. É por causa desta política de vários governos, que hoje o erário público paga centenas de milhões de euros a comprar exames aos privados que podiam ser feitos de forma mais económica nos próprios serviços públicos. É também por causa desta política que faltam camas hospitalares; enquanto nos últimos 20 anos os hospitais públicos reduziram em 4000 as suas camas hospitalares, os privados criaram oportunamente novas 3000 camas para internamento no mesmo período. Como é evidente não se trata de uma coincidência.

Entretanto está em curso mais uma operação de desresponsabilização do Governo e da administração central pelos cuidados de saúde. Trata-se da impropriamente chamada descentralização de competências na área da saúde para os municípios, que não é afinal mais do que uma transferência de responsabilidades sem os recursos suficientes. Ao que está formalmente inscrito na lei acrescenta-se toda a pressão para garantir (e suportar) outras necessidades dos cuidados primários de saúde. Esta medida vai romper com a universalidade do acesso à saúde, agora diferenciada em função dos recursos ou das opções de cada município. Vai igualmente abrir a porta ao condicionamento da autonomia dos profissionais e das unidades de saúde.

Apesar de algumas medidas aprovadas por pressão e insistência do PCP, o resultado da gestão do Governo minoritário do PS foi a continuação do enfraquecimento do SNS, apesar dos reforços transitórios para responder à COVID-19. É certo que existiram declarações e discursos de defesa e valorização do SNS e até de contestação à ofensiva dos interesses privados. Mas isso não chega para ultrapassar a asfixia da gestão orçamental subordinada ao objectivo do défice, nem para anular a forte representação e presença dos interesses privados junto da direcção do PS, com forte influência nas orientações aplicadas.



A evolução do sector privado


Nos últimos anos a realidade do privado alterou-se fortemente. Já lá vai o tempo em que era constituído maioritariamente por consultórios e pequenas clínicas e eram raros os hospitais privados. Neste momento um grande número desses pequenos estabelecimentos foi absorvido ou controlado pelos grupos económicos da saúde que apostaram fortemente neste sector. Foram feitos investimentos gigantescos (veja-se os 170 milhões de euros do novo Hospital da Luz em Alcântara - Lisboa), só possíveis perante a perspectiva de retorno rápido e garantido.

De facto os Hospitais privados assentam directamente a sua viabilidade financeira nas transferências de recursos públicos, sem as quais dificilmente seriam viáveis, não obstante a carência de resposta do SNS ser impulsionadora da compra de seguros privados de saúde nas camadas intermédias da população. Entre 2000 e 2019 a despesa pública com hospitais privados aumentou 300%, de acordo com os dados do INE. A isso somam-se outros prestadores privados de outros serviços de saúde que aumentaram igualmente a sua apropriação dos recursos públicos.

O aspecto determinante na viragem a favor do sector privado foi claramente o espaço aberto para a captação de profissionais dos serviços públicos. Há 15 ou 20 anos atrás era raro o profissional de saúde que trabalhava exclusivamente no privado. Hoje isso aparece como uma opção viável para muitos profissionais, alguns com décadas de experiência e carreira pública – que se fartaram da desorganização, desrespeito pelas carreiras profissionais, remunerações insuficientes, da falta de meios e de horários e cargas de trabalho brutais –, outros recém-formados – e que foram sujeitos a más condições de aprendizagem nos seus estágios (no internato no caso dos médicos), sendo tratados como mão-de-obra barata – que assim são aliciados para o sector privado.

A pressão para deixar cair o SNS e contratar serviços privados é tremenda. Assenta na mitologia difundida pelo capitalismo neoliberal de que o prestador privado é mais eficiente e mais barato, ou de que para garantir a saúde para todos bastaria o Estado assegurar o financiamento, deixar os privados prestar os serviços e remeter-se a um papel regulador.

A realidade demonstra que nada disto é verdade.

Em primeiro lugar porque se fazem comparações entre coisas diferentes. Desde logo porque enquanto os hospitais privados disponibilizam apenas os serviços que lhes dão garantias de viabilidade financeira e tratam em regra casos de menor complexidade, os hospitais e serviços públicos têm de garantir uma série de estruturas que são indispensáveis a uma resposta completa e global, têm de assegurá-la em todo o território, e não podem descartar os casos mais complexos. São bem conhecidos nos hospitais públicos os reenvios de doentes de hospitais privados, por falta de capacidade para os tratar, ou quando há complicações (por exemplo nos partos que se complicam). É claro que os casos mais complexos têm custos mais elevados, e a presença em todo o território também.

Em segundo lugar porque, tal como acontece noutros serviços ou sectores essenciais, a regulação é uma ficção quando não existe uma forte preponderância pública na prestação dos serviços ou actividades. É assim na saúde, como no sector energético ou nos correios. Quem só paga e não faz fica na mão dos que prestam o serviço. Na saúde isso é particularmente evidente em áreas onde – como acontece com a diálise – há muito o Estado está dependente de privados, que determinam em geral o preço e as condições do serviço, com pouca margem para negociações. Não é por acaso que há sempre fortes movimentações dos interesses privados sempre que se tenta abrir um novo serviço de diálise num hospital público. 

A mais recente forma de desvalorizar o sector público é a ideia de que deveríamos mudar do sistema de tipo «Beveridgiano» que temos (tal como o Reino Unido e a Suécia, por exemplo), em que existe um serviço público universal sustentado pelos impostos, para um de inspiração «Bismarckiana» (como a França e a Alemanha), onde se aplica um seguro público obrigatório a partir dos rendimentos. Na realidade essa discussão nada tem de teórico no momento actual. Quem a defende visa apenas dar entrada a mais privados na prestação de cuidados. E como não existem dois orçamentos para a saúde, os recursos aí empregues seriam obviamente retirados ao SNS, enfraquecendo-o ainda mais. Tal decisão abriria também a porta ao estabelecimento de um pacote mínimo (máximo, entenda-se) de cuidados garantidos que cada cidadão teria direito. Para além disso restaria suportar a despesa ou recorrer a um SNS reduzido a uma expressão assistencialista.

Mas não é só isso. O negócio da saúde dá-se bem com o tratamento da doença. Mas os cuidados de saúde são muito mais do que isso e exigem um forte investimento na promoção da saúde e prevenção da doença; isso pouco interessa aos privados, mas é essencial para a população. 



O que é preciso fazer


É absolutamente indispensável aumentar a capacidade de resposta do SNS, seja nos cuidados de saúde primários, seja ao nível hospitalar. Isso implica garantir meios físicos, financeiros e humanos para reduzir drasticamente as listas de espera e os atrasos em consultas, tratamentos, exames e outros cuidados de saúde.

Para quem queira verdadeiramente preservar e recuperar o SNS, tomar medidas para reter e atrair profissionais de saúde é um ponto essencial e prioritário. Para isso é preciso que as suas remunerações sejam atractivas, que a progressão na carreira seja uma perspectiva real, que os horários sejam compatíveis com o descanso, as necessidades de formação contínua e a vida familiar e, finalmente, que a organização e equipamento das unidades de saúde sejam coerentes e adequados.

É preciso criar condições para que não saiam especialistas médicos e enfermeiros do Serviço Nacional de Saúde e de forma a que seja possível contratá-los para as especialidades em que são necessários e para garantir médico e enfermeiro de família a todos os portugueses. É preciso contratar técnicos superiores de saúde e de diagnóstico e terapêutica, administrativos e auxiliares de acção médica. É preciso que estas contratações se façam com vínculo permanente e integrado nos quadros da administração pública, rejeitando a generalização da precariedade em tantas destas funções.

O PCP tem vindo a propor diversas medidas neste sentido, entre as quais se destacam a dedicação exclusiva para médicos e enfermeiros, com carácter opcional, correspondendo a uma majoração de 50% da sua remuneração base e a uma bonificação de 25% na contagem do tempo para a progressão na carreira, entre outros benefícios. Propõe-se igualmente um regime semelhante para a fixação de profissionais em zonas carenciadas (que não são apenas no interior do país), bem como a contagem dos pontos de progressão na carreira eliminados em vários momentos nos últimos anos.

Este é o nó górdio da salvação do Serviço Nacional de Saúde: garantir um significativo reforço de profissionais de saúde, sem os quais todas as outras medidas, igualmente necessárias, terão o seu efeito reduzido.

O SNS precisa de ter um financiamento adequado ao seu funcionamento, com a correspondente inscrição no Orçamento do Estado e com a disponibilização efectiva dos recursos, não os sujeitando a cativações, formais ou informais, ou a outro tipo de vetos de gaveta. Assim será possível realizar uma gestão orientada para os ganhos em saúde e em que se reduz ou elimina o desperdício gerado pela constante gestão de uma elevada dívida a fornecedores e se viabiliza um adequado planeamento que, em qualquer organização, permite melhores resultados.

É indispensável igualmente concretizar um plano de investimentos para a modernização de infraestruturas, para a construção de muitas unidades há anos à espera (centros de saúde, novos hospitais ou novos edifícios em unidades já existentes), garantindo instalações adequadas, condição, aliás, necessária para atrair mais profissionais de saúde. É importante incluir o aumento do número de camas hospitalares, recuperando as consequências da política economicista que levou à sua diminuição.

É premente dotar o Serviço Nacional de Saúde dos equipamentos adequados (também nos centros de saúde), incluindo meios de diagnóstico (análises, raio-x, imagiologia, TAC, Ressonância Magnética, entre outros), mas também mobiliário, viaturas ou materiais e instrumentos de trabalho. Isso mesmo ficou em parte inscrito, por exigência do PCP, no Orçamento do Estado para 2021, mas não foi concretizado, na sua maioria, pelo Governo PS.

É indispensável reforçar os cuidados primários de saúde, pondo fim ao tratamento diferenciado entre os utentes (e profissionais) das USF de tipo A e B e das UCSP (as restantes unidades nos centros de saúde), garantindo a toda a população médico e enfermeiro de família.

É indispensável reforçar os serviços hospitalares de forma a reduzir e eliminar as listas de espera para cirurgias, exames, consultas ou tratamentos, que a pandemia agravou e tardam em ser recuperadas.

É frequente vermos notícias de grande afluência às urgências hospitalares com a consequente falta de capacidade de resposta. É nessa altura que se ouvem responsáveis governativos, dirigentes da saúde e dos hospitais queixarem-se da suposta falta de discernimento dos utentes que se deslocam às urgências com situações que não exigiriam esse tipo de resposta tão diferenciada.

Mas se não há outra porta aberta para quem tem um problema agudo de saúde, mesmo que não de gravidade maior, onde querem que as pessoas se dirijam? Na realidade o problema da urgência e da sua incapacidade de resposta tem várias causas. 

Desde logo, a diminuição da capacidade dos hospitais nesta área, em que, aliás, cada vez mais as equipas são constituídas por uma maioria de profissionais contratados à tarefa e sem qualquer outro vínculo à unidade de saúde que não seja cumprir umas horas de serviço. Mas por outro lado ela deriva de uma ausência de resposta adequada nos cuidados primários de saúde, com mais de um milhão de utentes sem médico de família, com dificuldades até no contacto e no acesso físico aos serviços, com falta de enfermeiros, de meios de diagnóstico e com horários insuficientes e desadequados às necessidades das pessoas. E resulta ainda da demora na concretização de muitas consultas e tratamentos hospitalares, que faz com que muitos doentes crónicos cheguem às urgências com fortes descompensações da sua condição de saúde.

A redução das taxas moderadoras, conseguida nos últimos anos, deve prosseguir para a sua eliminação, pondo fim a um dos elementos que contribui para que a população do nosso país seja uma das que, na União Europeia, mais paga directamente cuidados de saúde.

Finalmente, é preciso uma gestão participada por profissionais e utentes, firmemente orientada para a defesa do interesse público, a eficiência e a melhoria da organização dos serviços, marcando uma fronteira clara entre o SNS e o sector privado, eliminando promiscuidades e a colonização dos recursos públicos pelos grupos económicos presentes neste sector.



Uma luta urgente e decisiva


Salvar o Serviço Nacional de Saúde é urgente. Estamos num momento em que se começam a aproximar limites de viabilidade de muitas unidades e serviços públicos, podendo atingir-se um ponto de difícil retorno. 

Trata-se de um combate fundamental para o regime democrático conquistado pela Revolução de Abril, que se faz também de acesso a questões essenciais como é o caso dos cuidados de saúde. É uma luta dos profissionais de saúde e das populações, com interesses fortemente convergentes. E há forças para a levar por diante e vencê-la.

É um combate decisivo do tempo presente e do futuro que queremos para o nosso país.

Vamos a ele!


Tradução das siglas:


ADSE – Assistência na Doença aos Servidores do Estado;

ARS – Administração Regional de Saúde;

ACSS – Administração Central do Sistema de Saúde;

SPMS – Serviços Partilhados do Ministério da Saúde;

ACES – Agrupamento de Centros de Saúde;

SUCH – Serviço de Utilização Comum dos Hospitais;

USF – Unidade de Saúde Familiar;

UCSP – Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados.


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