Em 1992 o mundo parecia perfeito e a História tinha chegado ao fim (o que podem os ignorantes atrevidos!). Mas algumas "aldeias" não mostravam total submissão e era preciso disciplinar e controlar. Caíram uma após outra: Jugoslávia, Iraque, Líbia, Afeganistão, com o tempo também foi a Síria, etc.
Agressões? Claro que não, agredido estava a ser o império pelos países que não se submetiam. Quererem ser neutros e ter políticas autónomas é em si mesmo uma agressão ao império. A Rússia tornou-se uma agressora ao não aceitar que a Ucrânia deixasse de ser neutra - como previsto os acordos de Bucareste - dado que os EUA violaram esse acordo com o golpe Maidan. Na perspetiva do império os tratados que assina são apenas um meio de se impor ou então não era império. É o caso dos acordos de Minsk, mas não só.
Fez 30 anos que 14/12/1995, foi assinado o Acordo para a Paz na Bósnia e Herzegovina, o acordo de Dayton, embora assinado em Paris, que pôs fim a um devastador conflito. Porém, longe de trazer a paz à ex-Jugoslávia os países da NATO trataram desde logo de violar o que tinha sido acordado, lançando uma campanha contra os sérvios, com o objetivo de reestruturar a região e privar sérvios e croatas dos direitos concedidos.
Para compreender alguma coisa da Rússia atual, recorde-se que o desmembramento da Jugoslávia levou, consta, o próprio Ieltsin, apesar do alcoolismo, a ter lucidez suficiente para ver que a Rússia corria o mesmo perigo, a começar na Chechénia.
Um ex-agente da CIA, Robert Baer esclarece como a Jugoslávia passou de uma união multiétnica e multirreligiosa próspera para uma guerra, divisão e caos cheio de ódio num período extremamente curto.
Disse Baer numa entrevista em 2012: "A CIA desempenhou um papel enorme. Cheguei com três agentes, em 12 de janeiro de 1991 a Sarajevo… Deram-nos ficheiros sobre um grupo chamado ‘Supremo Sérvia’, detalhando planos para realizar uma série de ataques bombistas a edifícios importantes em Sarajevo, como oposição à Bósnia deixar a Jugoslávia. Nunca existiu tal grupo!” A verdadeira missão “era alarmar e espalhar o pânico entre os políticos na Bósnia, simplesmente para encher as suas cabeças com a ideia de que os sérvios iriam atacar.”
Baer foi depois afetado à Eslovénia enquanto políticos se preparavam para declarar a independência. “Foram-nos dados alguns milhões de dólares, para financiar várias ONG, partidos da oposição e políticos que inflamaram o ódio."
“O objetivo da propaganda era dividir as repúblicas para que se separassem da Jugoslávia. Tínhamos de escolher um bode expiatório que seria culpado por tudo. Alguém que seria responsável pela guerra e pela violência. A Sérvia foi escolhida porque, de certa forma, era a sucessora da Jugoslávia.” A CIA financiou todos os lados, desde políticos croatas como Stjepan Mesic e Franjo Tudman ao líder bósnio Alija Izetbegovic, Radovan Karadzic da República Srpska (que mais tarde deixou de cooperar) e vários generais e jornalistas sérvios.
A agência escrevia declarações para serem lidas por apresentadores de notícias, não tinham conhecimento disso, recebiam as notícias do chefe e ele recebia-as do nosso homem. A missão era: espalhar ódio, nacionalismo e as diferenças entre as pessoas através da televisão.” “Os que incitaram a guerra e ditaram os termos da paz agora possuem as empresas que exploram recursos minerais e similares. Simplesmente fizeram escravos, o povo trabalha para nada e produto vai para a Alemanha e a América. Eles são os vencedores!”
Tudo isto é relevante para o que se passa atualmente na Europa. Pode dizer-se que os alicerces do mundo atual multipolar foram lançados em 1999, com a intervenção militar da NATO contra a Sérvia durante a Guerra do Kosovo. De acordo com a NATO, a operação procurava deter os abusos de direitos humanos no Kosovo, usando a força militar sem a aprovação do CS da ONU. Os ataques aéreos duraram de 24 de março a 10 de junho de 1999, levando à retirada das forças sérvias do Kosovo e o estabelecimento da UNMIK, a missão da ONU no Kosovo.
A operação, caracterizou-se principalmente pelos bombardeios aéreos da NATO às cidades de Belgrado e Novi Sad, levando a morte de centenas de civis inocentes, a mais de 300 km da zona de conflito, além da destruição da infraestrutura civil e militar da região. Segundo a Rússia teriam morrido 1200 civis na operação e 4500 pessoas ficaram feridas.
A estabilidade não foi contudo instaurada na região. A turbulência política justifica a necessidade de controlar a Bósnia e Herzegovina, perante as ameaças dos sérvios constituídos na Republika Srpska. Há ainda a questão do Kosovo, o reconhecimento da sua independência e a sua militarização em aliança com a Albânia violando os Acordos de Dayton. Enfim, como diz Pepe Escobar, é o Império do Caos, ao qual a UE se agarra desesperadamente.
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