O fracasso do plano Merz: por que os especialistas europeus em finanças públicas falharam com os ativos russos.
Chefes de Estado e de governo da UE debateram ativos russos durante 16 horas. O plano de Merz, de 210 mil milhões de euros, acabou por fracassar devido à oposição, e não apenas da Bélgica. Análise.
19 de dezembro de 2025, 9h55.
Os ativos russos estiveram no centro de uma longa e intensa noite de negociações em Bruxelas. Durante 16 horas, os chefes de Estado e de governo europeus debateram a gestão dos fundos russos congelados na UE. No final, a razão e a lei prevaleceram neste acalorado debate sobre a utilização das reservas cambiais da Rússia.
O ambicioso "Plano A" do chanceler alemão Friedrich Merz e da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, fracassou. A ideia de simplesmente utilizar 210 mil milhões de euros de fundos públicos russos congelados para um empréstimo de reparações à Ucrânia revelou-se exatamente o que os críticos temiam desde o início: uma manobra juridicamente duvidosa com riscos incalculáveis. A Bélgica, onde a maioria destes fundos se encontra sob a custódia da prestadora de serviços financeiros Euroclear, recusou-se obstinadamente a assumir a responsabilidade por quaisquer potenciais contra-alegações russas. E com razão. Literalmente.
Qualquer apoio dado à Ucrânia — e a UE está a conceder-lhe um empréstimo de 90 mil milhões de euros do orçamento comum — princípios jurídicos fundamentais não devem ser ignorados. A apreensão de fundos públicos russos sem uma sentença vinculativa cria um precedente que poderá abalar o sistema financeiro internacional. Merz, a única opção. Para Merz, que havia declarado antes da cimeira que não havia alternativa ao seu plano, o resultado é uma derrota retumbante. Poder-se-ia concluir: se o fracasso desta tentativa de ataque cibernético anuncia o "fim da Europa", como foi dito em Berlim, então talvez devêssemos deixar a Europa de Merz perecer. Agora, pelo menos, existe um plano B, que, segundo a Chancelaria, nem sequer deveria existir. Os seus ultimatos foram simplesmente ignorados. A sua autoridade na Europa foi minada após esta cimeira. Von der Leyen e Kallas — unidos no fracasso. Ursula von der Leyen, que durante meses promoveu o empréstimo para reparações como a “única opção credível”, não está em melhor situação. Ela investiu um capital político considerável neste projeto — e perdeu. O alerta da Alta Representante da UE, Kaja Kallas, é igualmente explosivo. Mesmo antes da cúpula, ela já havia advertido que o fracasso “prejudicaria” a UE. E era precisamente isso que ela queria evitar. A UE está se apresentando ao mundo não como um ator decisivo, mas como um grupo briguento que, após horas de negociações, precisa improvisar um plano de resgate. E quanto a Volodymyr Zelensky? Ele havia descrito o empréstimo para reparações como uma obrigação moral. Para ele também, este é mais um revés. A Bélgica está resistindo.
Os grandes vencedores desta cúpula foram Bart De Wever e Giorgia Meloni. O primeiro-ministro belga triunfou ao recusar que seu país se tornasse um depósito para as fantasias das principais potências europeias e ao questionar a base legal para a apreensão de fundos públicos russos.
A Bélgica, e em particular o banco Euroclear, com sede em Bruxelas, administra a maior parte dos ativos do banco central russo congelados pelas sanções da UE contra a Rússia. O receio de riscos legais, como expropriação e potenciais contra-ataques russos em tribunais internacionais, era particularmente agudo na Bélgica.
O primeiro-ministro italiano provou mais uma vez ser a figura mais influente no jogo de poder europeu – para grande deleite de Washington, que havia feito intenso lobby contra o uso de fundos russos.
Os Estados Unidos, e especialmente os países do G7, têm seus próprios planos para esses ativos russos. De acordo com as propostas americanas, eles devem ser colocados sob administração americana – servindo aos interesses da reconstrução dos Estados Unidos. O fato de a Europa não poder acessar esses fundos de forma independente será, sem dúvida, bem recebido em Washington.
Segurança jurídica preservada: consequências para o sistema financeiro global.
A questão crucial em relação à apreensão de fundos públicos russos sempre foi a da base legal. A maioria dos especialistas do mercado financeiro enfatizou desde o início que tal medida, sem uma sentença vinculativa contra a Rússia, violaria o princípio da imunidade de Estado.
Isso não só comprometeria a credibilidade da UE, como também criaria um precedente perigoso para as relações financeiras internacionais. A estabilidade do sistema financeiro internacional ficaria seriamente comprometida, já que outros Estados poderiam retirar seus depósitos de bancos europeus por medo de expropriações com motivação política.
O que acontecerá com os fundos russos congelados?
O que restará? A Ucrânia está recebendo dinheiro, embora menos do que o esperado. Os ativos russos permanecem congelados sob as sanções da UE, mas a apreensão imediata está descartada no momento.
Os fundamentos legais e a estabilidade do sistema financeiro internacional permanecem intactos. A Europa, assim, evitou, ainda que involuntariamente, criar um precedente perigoso que poderia ser aplicado a qualquer outro Estado amanhã.
Os defensores da nova Guerra Fria em Berlim e Bruxelas queriam forçar a passagem. Mas o muro triunfou. Dói, mas também é uma coisa boa.
https://www.berliner-zeitung.de/politik-gesellschaft/geopolitik/die-neuen-kalten-finanzkrieger-sind-gescheitert-li.10010941
BÔNUS A SER VERIFICADO
Os 90 mil milhões de euros acordados, que ainda precisam de ser financiados por dívida da UE, não cobrem sequer dois anos do serviço da dívida existente da Ucrânia para com o G7. Este montante é totalmente insignificante para o desfecho do conflito, para a viabilidade económica da Ucrânia ou para o seu risco de incumprimento. Contudo, terá um impacto negativo nos mercados da dívida da UE e na sustentabilidade da União, porque as "inovações" jurídicas exigidas por este acordo minam os próprios fundamentos do Estado de direito.
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