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27 de março de 2023

Vale a pena ler e ouvir

 Das Redes Sociais e não só . Concorde se ou discorde se  vale a pena não perder . Cinco pontos.

1 "Sejamos claros, as medidas do governo visam apenas mascarar uma coisa que é  o não aumento de salários e pensões de acordo , pelo menos , com a taxa de inflação. Quanto à  fantasia de que a actualização   dos salários faria aumentar a inflação esta visa apenas justificar a  colocação dos salários,  pensões, e prestações sociais a pagar o endividamento externo , a guerra na Ucrânia e os lucros das distribuidoras e dos grandes grupos económicos. 

Aliás  se assim fosse a Bélgica que tem os salários indexados à inflação isto é que faz uma actualização periódica dos salários em relação ao índice de preços estaria com uma taxa de inflação  muito superior a Portugal e à  média europeia o que não  é  verdade." C.V.

Brasil 111
 "Ontem o ilustre juiz Campos Almeida fez uma síntese que diz tudo.
 " Há  uma guerra por procuração com os EUA de fora, mas no comando e há um tribunal Penal Internacional, não confundir com o de Haia, teleguiado pelos americanos mas em que estes nem sequer o reconhecem." A.G.

3  ATENÇÃO: JOÃO CRAVINHO AVISA PUTIN» - Por Carmo Afonso 
(na coluna "Sementes de alfarroba", Público de 24/ Março/2023)

João Gomes Cravinho afirmou que Portugal assumiria as suas responsabilidades, caso Putin entrasse no território nacional. O que é que isso significa? Que, nesse caso, as autoridades portugueses deteriam o Presidente russo ao abrigo do mandado de captura emitido pelo Tribunal Penal Internacional por crimes de guerra cometidos na Ucrânia.
Podemos imaginar as nossas forças policiais a deter o sr. Putin e a levá-lo para um calabouço ou estabelecimento prisional. Antes disso, também podemos imaginar o grande transtorno que será para Putin não poder viajar para Portugal perante este aviso.
Voltemos à realidade.
As posições portuguesas no que respeita a relações internacionais vão sempre no mesmo sentido, ou seja, escolhemos um lado. Por causa disso já errámos: fomos anfitriões de uma cimeira nos Açores que constituiu uma mera formalidade para a guerra que já estava decidida. Essa guerra, agora com outros intervenientes, arrasta-se até hoje com consequências gravíssimas.
No final dessa cimeira Bush declarou que “o ditador do Iraque e as suas armas de destruição maciça são uma ameaça à segurança das nações livres”. Quatro dias depois começava a guerra. As ditas armas nunca foram encontradas. Os quatro intervenientes na cimeira – Bush, Blair, Aznar e [Durão] Barroso – acabaram mais tarde por reconhecer que elas não existiam. No ano seguinte ao do início da guerra, Kofi Annan, secretário-geral da ONU, disse que ela era ilegal. Claro que nunca existiram quaisquer consequências para os quatro líderes políticos que a desencadearam.
Como dizia: Portugal escolheu um lado no que respeita à política externa. Defendemos o eixo euro-atlântico, ou seja, uma Europa que não ponha em causa a aliança com os Estados Unidos. Esta visão reflete efetivamente a posição da maioria dos portugueses e, nesse sentido, é a correta. Quem se opõe ao chamado “imperialismo dos Estados Unidos” é minoritário na comunicação social, nas redes sociais e no café da esquina. Que não existam dúvidas neste aspeto.
A guerra na Ucrânia veio intensificar o sentimento nacional de pertença a esse eixo euro-atlântico. Dou-vos um exemplo: já muitos terão percebido que a expansão da NATO em direção à Rússia foi um erro. Reconhecer isto não significa que se considere que a invasão seja legítima ou que esteja justificada. Mas é irrelevante. A maioria dos portugueses não aceita que se condene a invasão, se esteja solidário com o povo ucraniano e, ao mesmo tempo, se tente analisar os antecedentes da guerra. Ou se faz uma coisa, ou se faz outra. Quem tenta fazer as duas é “putinista”. Aconteceu ao Papa Francisco.
Neste momento há muito mais para ver ou, se quisermos, muito mais para não vermos. O mundo está a mudar por causa da guerra. Novos eixos geopolíticos estão a desenhar-se. A China estabeleceu vários acordos com a Rússia e mais entendimentos estão na calha entre países africanos, asiáticos e sul-americanos. A Arábia Saudita e o Irão restabeleceram relações diplomáticas e Moscovo está a promover um processo de reaproximação entre a Síria e a Turquia. Nada disto inclui a Europa. Tudo isto a diminui. Pior: a ideia de Putin estar isolado está declaradamente ultrapassada.
Os Estados Unidos estão a perder terreno e não são boas notícias. Há um cansaço internacional do imperialismo americano e do que resta do colonialismo europeu. Não foram acidentais as recentes críticas do Presidente da República do Congo a Macron, a tomada de posição do Mali ou a presença de 40 países africanos na conferência preparatória da cimeira África-Rússia. Representam erupções de uma lava que percorre as entranhas dos países que foram colonizados e que ainda convivem com resquícios dessa colonização. A China e a Rússia marcam presença junto desses países e aumentam a sua influência num momento que pode ser de viragem. Estamos a ser ultrapassados pela esquerda e pela direita.
Fazer parte do eixo euro-atlântico já nos levou a participar em atrocidades. Mas estávamos no lado do poder. Agora queremos defender quem sofre atrocidades, ou seja, o povo ucraniano. Só que o mundo dá sinais de que esse eixo já não ocupa uma posição de domínio.
Claro que continuamos a agir como se assim não fosse e como se tivéssemos as costas aquecidas pelo intacto poder geopolítico europeu e dos Estados Unidos. Fechar os olhos é um desporto nacional. Deve ser por isso que não estranhamos que o nosso ministro dos Negócios Estrangeiros ameace prender o Presidente da maior potência nuclear mundial. Ele que tenha muito cuidado e não ponha os pés em Portugal.
 
4 O DIREITO - O NOSSO E O DO OUTROS
Miguel Sousa Tavares, in Expresso, 24/03/2023

Se, de facto, a Rússia raptou 6000 crianças ucranianas e, à revelia dos seus pais, as levou para a Rússia, com o conhecimento ou o consentimento do Presidente russo, então Vladimir Putin pode ser indiciado pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), órgão das Nações Unidas, sob a acusação de crime de “genocídio”, ao abrigo do artigo 5º, alínea e), dos seus estatutos, que reza o seguinte: “Transferência, à força, de crianças do grupo para outro grupo.” 

Porém, tal pressupõe previamente diligências de investigação, de prova, de notificação, de contraditório e de defesa que, nos termos do artigo 18, manifestamente não parecem ter sido feitas antes de, com todo o ribombar de canhões na imprensa internacional, o TPI ter declarado Putin “arguido” e contra ele ter emitido um mandado de captura que dizem ser válido em 142 países signatários dos seus estatutos, Portugal incluído — como pressurosamente informou ao país e ao mundo o ministro João Cravinho.

Mas, além dessa minudência processual, concorre ainda outra questão nada menor. Sucede que, não só a Rússia — para efeitos processuais definida como “outra parte” — não é signatária e membro do TPI como não o são também países como Israel, a Turquia, a Arábia Saudita ou os Estados Unidos. Et pour cause. 

Se o fossem, Israel cairia sob a alçada do artigo 7º, alínea j) — “Crimes contra a Humanidade”, por apartheid; 

a Arábia Saudita veria o seu príncipe regente, o que mandou cortar às postas o jornalista saudi-americano Khashoggi na embaixada saudita de Istambul, e a quem Biden foi visitar a Riade para lhe pedir em vão petróleo, acusado por “homicídio”, ao abrigo do artigo 7º, alínea a); 

Erdogan, a quem os outrora Estados de honra da Escandinávia agora mendigam um nihil obstat para que eles os deixe entrar na NATO, seria declarado cadastrado internacional nos termos do artigo 7º por todos os “crimes contra a Humanidade” que pratica à vista de todos contra a comunidade curda do seu país; 

a NATO, com os Estados Unidos à cabeça, e o ex-Presidente George W. Bush teriam de responder, de acordo com o artigo 8º, que reza sobre os “crimes de guerra”, sobre os 78 dias de bombardeamentos aéreos de Belgrado, onde morreram 2500 civis inocentes em troca de conseguir a rendição do criminoso de guerra Slobodan Milosevic, transportado em glória para ser julgado em Haia… pelo TPI, 

ou sobre a “Operação Choque e Pavor”, mais conhecida como a 2ª Guerra do Iraque, responsável por 100.000 mortos, quando um grupo de aliados dos americanos, incluindo Portugal, invadiu um país soberano para procurar armas que não existiam — ambas as operações sem mandato da ONU; 

e os Estados Unidos e três dos seus Presidentes, incluindo o actual, teriam de responder, nos termos do artigo 7º, alínea e), pelo crime de “prisão ou outra forma de privação da liberdade física grave, em violação das normas fundamentais do direito internacional”. 

Porque Abu Ghraib (fechada em 2014) e Guantanamo são prisões ilegais, fora de quaisquer jurisdições reconhecidas, para onde os presos foram transportados clandestinamente (e com a cooperação portuguesa), depois de terem sido sequestrados nos seus países, e onde estão, alguns porventura inocentes, há dez ou doze anos, sem direito a advogados, a contactos com as famílias e a correspondência com o exterior, sem serem julgados ou condenados, a poderem ser torturados por ordem presidencial, e a poderem ficar ali até ao final da vida sem que nenhum tribunal se preocupe com eles.

Sim, Putin não é flor que se cheire. É mesmo um assassino, como disse Biden. Tem aquele hábito desagradável de se livrar dos seus adversários envenenando-os no estrangeiro ou fazendo-os suicidar-se saltando do alto de prédios na Rússia. Nisso, como em outras coisas, embora mais brandamente, segue a tradição dos czares russos que empalavam os seus inimigos fora das muralhas do Kremlin e ali os deixavam a agonizar para servirem de exemplo. Na guerra da Ucrânia, seguramente que, em Bucha e não só, os russos cometeram barbaridades.

Mas só quem não conheça a história da selvajaria secular dos eslavos e da barbaridade das guerras civis, como esta é, só quem ainda se deixe embalar pela narrativa unilateral que aqui, no Ocidente, nos é servida, é que pode acreditar que esta é uma guerra única: bandidos de um lado, anjinhos do outro. 

Às tantas, a Amnistia Internacional ousou quebrar timidamente essa unanimidade informativa e opinativa estabelecida como verdade única e logo foi trucidada e silenciada na Ucrânia e nas “democracias liberais”.

Temos, pois, Putin, como fugitivo internacional, segundo um critério judicial que se aplica a ele mas não a outros. E o que ganhamos com isso? 

Segundo uns crânios domésticos de Relações Internacionais e Direito Internacional que tenho escutado, ganhamos muito: agora o homem está diminuído, desprestigiado, acossado. E foi esse pobre e irrelevante homem, esse desprestigiado fugitivo a quem o ministro Cravinho e mais 141 dos seus homólogos prometem deitar a mão, que eu vi esta semana receber em Moscovo o outro homem que vai decidir os destinos do mundo: Xi Jinping. 

Aquele sobre quem, numa perfeita definição da imensa estupidez aonde nós, o Ocidente, chegámos, um comentador político chinês resumiu a mensagem dos Estados Unidos: “Ó Xi, diga lá ao Putin que vai deixar de o apoiar para que a seguir nós nos ocupemos de si sem ter a Rússia a apoiá-lo.” 

Caramba, e andam aqui os nossos mestres, professores doutores de Relações e Política Internacional, os auditores dos cursos de Defesa Nacional, os autores (que são sempre os mesmos, dê o mundo as voltas que der) dos Conceitos Estratégicos de Defesa Nacional, a elaborar consumadas teses sobre geoestratégia mundial e, afinal, um modesto comentador da TV chinesa resume tudo numa simples frase que transforma tudo o resto em absoluto ridículo!

Como disse Aleksandar Vucic, Presidente da Sérvia, a consequência mais óbvia da declaração do TPI é que a Ucrânia fica sem interlocutor com quem negociar a paz. 

Mas não será isso justamente o que se pretende? Todas as tentativas de mediação surgidas até agora, por mais tímidas que fossem, foram descartadas à partida pelo Ocidente, por inviáveis ou não credíveis: a do Brasil, a da Turquia, a da China, a do Papa.

Eufórico, o secretário-geral da NATO, Stoltenberg, já avisou que na próxima cimeira da organização, em Vilnius, vai pedir que o patamar dos 2% do PIB que cada membro tem de gastar com a defesa seja aumentado, e não faz segredo que a área de influência e futura actuação da NATO deve estender-se para a Ásia-Pacífico, assim acompanhando a sua nova Carta, não escrita, que é a de ser a extensão do braço armado dos Estados Unidos, aonde quer que ele vá. 

Quanto à Ucrânia, e como explicou Teresa de Sousa em recente artigo no “Público”, permaneceremos amarrados em duas posições inconciliáveis: o “campo da paz” e o campo da guerra — perdão, o “campo da justiça”. Sendo que, segundo ela, o campo da paz é-o “da paz a qualquer preço”, e o da “justiça” será então o da guerra a qualquer preço, visto que a justiça não tem preço. 

Mas eis que agora andam muito incomodados porque, depois de terem passado um ano a tecer loas ao inacreditável fortalecimento do Ocidente que o aventureirismo de Putin tinha proporcionado, olham à roda e vêm uma Europa economicamente destroçada e a China a ocupar paulatina e sabiamente todo o resto do mundo deixado para trás e que estranhamente não vê vantagem em “ocidentalizar-se” — para usar a expressão escandalizada de uma ex-embaixadora americana na NATO. Tudo isto vai acabar espantosamente mal para o Ocidente.

2 Já toda a gente percebeu que este plano governamental para a habitação foi feito em cima do joe­lho e fruto do desespero e da desesperança. É verdade, porém, que não se conhece nenhum outro em alternativa nem tal seria possível. Porque a situação actual não reflecte, de facto, uma crise de habitação, mas uma crise anterior, a montante e muito mais profunda, que nenhum plano de urgência resolverá num par de anos. 

Numa das muitas discussões que ocorrem, ouvi dizer que o problema estoirou porque, enquanto que até à última década se construíam 800.000 casas a cada dez anos, na última década só se construíram 100.000. Mas não é esse o problema: basta percorrer o país para ver que não faltam casas vazias em Portugal, mas se o Governo quiser deitar-lhes a mão, não encontrará ninguém que queira ir viver nelas.

Não há um problema de falta de casas em Portugal: há, sim, em Lisboa e no Porto e suas periferias. E esse problema chama-se desertificação e abandono do interior e começou a sério há 30 anos.

E sabem quem foi o primeiro responsável político por ele? Um senhor que ainda há dias fez um sermão à pátria, como sempre culpando os outros pelos problemas que ele, na altura, jurou ter deixado resolvidos para sempre. 

Esse mesmo: Aníbal Cavaco Silva. Há 30 anos — e porque na sua imensa incultura política não percebeu que a agricultura era muito mais do que um negócio de deve e haver —, Cavaco Silva começou por vender a agricultura portuguesa a Bruxelas por tuta e meia. 

Aí se iniciou o processo de morte do mundo rural e consequente êxodo para as cidades, acentuado depois pelo abandono, sempre subsidiado, das pescas, das indústrias extractivas, dos têxteis, sem nenhuma contrapartida oferecida a quem se quisesse estabelecer no interior e no vazio deixado. 

Desprezando o modelo europeu das cidades de média dimensão, Cavaco Silva abandonou também os caminhos de ferro e dedicou-se a construir auto-estradas para, como disse então Ribeiro Telles, os espanhóis colocarem cá mais depressa os produtos deles. 

Foi quando, seguindo sempre um critério rentabilista, se começaram a fechar hospitais e centros de saúde na província, tribunais, correios, escolas, tudo o que representasse a presença do Estado junto dos portugueses, que viviam num círculo vicioso de despovoamento. Apostou tudo nos serviços e no turismo, convidando os portugueses a virem viver para o Porto e Lisboa ou para trabalharem no Algarve, no Verão. 

Quem veio a seguir a ele continuou o mesmo caminho sem retorno para um país que hoje parece sem salvação à vista. E não foi por falta de avisos ou falta de estatísticas e relatórios crescentes do que se estava a passar. Foi porque, como sempre, nunca há tempo de pensar o país além da próxima eleição ou da próxima greve.


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