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14 de setembro de 2023

Os EUA perante o dilema que criaram

 A cimeira G20, consagrou o fim do mundo unipolar gerido pelos EUA. Segundo o ex-embaixador indiano Bhadrakumar os EUA preparam-se agora para - em concorrência com a China e a Rússia - tentar conquistar o Sul Global com alguma ajuda indiana.

Enquanto a Rússia tal como os EUA elogiaram a declaração do G20, a Ucrânia queixou-se de que “não havia nada de que se orgulhar”. De facto, do evento, não saiu nenhum ataque à Rússia ou as habituais explosões emocionais dos líderes ocidentais. Até a superburocrata von der Leyen, pôs de parte os seus ataques russofóbicos – como se tivesse recebido instruções de Washington.

A questão é que, no ambiente internacional em rápida mudança, para os EUA o G20 ganhou vida inesperadamente como o único fórum disponível hoje para o ocidente (os membros do G7) se “(re)conectarem” com a China e a Rússia, bem como com o Sul Global. À medida que os BRICS começaram a crescer em saltos gigantescos, o espectro do apagamento do G7 pairou sobre o fórum.

Os EUA estão a adotar uma correção de rumo na sua abordagem ao Sul Global, especialmente à África, baseada na realidade geopolítica do crescente desafio que a China e a Rússia colocam ao esforçarem-se para monopolizar o espaço geopolítico. As recentes agitações anticoloniais em África também lhes trazem pressentimentos sombrios, dadas as suas profundas implicações para a economia da UE.

Assim, surgem manifestações no novo alinhamento dos EUA: “Parceria Estratégica Abrangente EUA-Vietname; o novo Corredor Económico Índia-Oriente Médio-Europa; a Parceria para Infraestrutura e Investimento Global (compreendendo os EUA, União Europeia, França, Alemanha, Índia, Itália, Japão, Maurícias, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Banco Mundial); o Corredor do Lobito (do Lobito à RD Congo) ; “a iniciativa com parceiros do G20 para remodelar e ampliar fundamentalmente o Banco Mundial e proporcionar de forma mais eficaz a redução da pobreza e o crescimento económico inclusivo.”

Tudo isto aparece em 48 a 72 horas, numa urgência evidente: os EUA procuram ter um papel de liderança com o Sul Global e nesta mudança Biden vê Modi (da Índia) como um aliado fundamental.

Claro que a Índia quer acelerar a sua parceria estratégica com os EUA em consequência das tensões entre a Índia e a China e a avaliação indiana de que a estratégia Indo-Pacífico da administração Biden, possui um potencial perfeito para servir os interesses indianos sem se confrontar com a China.

Com isto não admira que Biden tenha atirado a Ucrânia de Kiev pela borda fora, nas negociações da declaração do G20. A Ucrânia é um parceiro exigente, mas não pode ditar as prioridades da política externa dos EUA. O fracasso da “contraofensiva” de Kiev, com cerca de 70 mil mortos no conflito até agora, de acordo com estimativas ocidentais. A responsabilidade moral e política desta situação cabe em grande parte aos EUA, algo que não pode continuar a ser escondido da consciência mundial.

Os países da NATO rasparam o fundo dos seus barris em busca de armas. Continuar a seguir o caminho que persegue miragens incipientes é fútil e sem sentido e anula a estratégia Indo-Pacífico, o que pode ter impacto no equilíbrio estratégico global.

A prioridade principal dos EUA é portanto congelar o conflito na Ucrânia, em que a Rússia ainda não conseguiu cumprir os seus objetivos originais de controle total do Donbass e de “desmilitarização e desnazificação” da Ucrânia – além de impedir a futura adesão da Ucrânia à NATO. Por outro lado, a NATO ainda mantém a opção de continuar envolvida com Kiev no que diz respeito aos assuntos inacabados da guerra do ponto de vista da segurança europeia.

A viagem não anunciada a Kiev, em 6 a 7 de setembro, de Blinken, teve o objetivo de transmitir que, embora Washington continue a apoiar militarmente a Ucrânia, Kiev deve iniciar um diálogo com Moscovo.

Conclui Bhadrakumar que esta é uma pílula difícil de engolir para o regime de Kiev, cheio prosápia sobre derrotar militarmente a Rússia. Mas qual é a alternativa? A Ucrânia só sobrevive na Unidade de Cuidados Intensivos dos EUA, uma ofensiva russa significará a sua asfixia.

Posto isto diga-se que a estratégia dos EUA, como habitualmente está perfeita no papel. Como o vão realizá-la? Com o dinheiro do ultraricos? E o lucro? Com o dólar que perde valor suportado por Títulos que há dificuldade em vender? Aumentando a dívida astronómica de 32,9 milhões de milhões de dólares (122,16% do PIB)? Ao mesmo tempo que aumentam os gastos militares a pobreza e o endividamento das famílias, o país desindustrializa-se, as infraestruturas decadentes. Na UE os problemas são análogos com a agravante do custo da energia. Sem capacidade para resolver as crises económicas e sociais internas, propõem agora o maná ao Sul Global, em concorrência com a China e a Rússia, com muito mais trunfos nestes campos que os EUA e UE.

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