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16 de julho de 2021

Assim se fazem os noticiários

...no reino da calúnia. No passado dia dia 9 a RTP 2 transmitiu um programa “As grandes mentiras da História” que abordou os aspetos psicológicos junto da opinião pública da primeira guerra do Iraque em 1991.

Saddam Hussein (S H) era um homem dos EUA que tinha eliminado violentamente todas as forças progressistas, depois substituir o gen. Kassem adepto de uma política de amizade com a União Soviética.

Como fantoche dos EUA foi incentivado a entrar em guerra com o Irão, sendo-lhe fornecido apoio militar em informações, misseis e até – quem havia de dizer dos defensores dos direitos humanos - armas químicas. Esta guerra devastadora deixou o Iraque com uma dívida colossal, impossível de pagar, algo que os credores não lhe perdoavam.

Saddam achou-se no direito de anexar o Koweit – aliás um dos credores – depois do que tinha feito ao serviço das monarquias da zona e dos próprios EUA. Tal aconteceu em agosto de 1990. Com isto o poder petrolífero de S H aumentara enormemente. A situação não agradou nem aos EUA nem à Arábia Saudita.

Desencadeou-se então uma campanha de propaganda alargada junto da opinião pública para diabolizar S H fazendo dele um monstro, antes um herói contra o Irão. Note-se que o Koweit, tal como a Arábia Saudita, era um regime de tirania medieval, dominado pela família real, que não respeitava qualquer direito democrático.

Para melhorar esta imagem foi criada uma organização a Free Koweit (F K) com apoio dos EUA e R U, dirigida por um ex-ministro do Koweit também membro da família real, promovido a democrata.

Esta ONG “independente” era assessorada por uma empresa de relações públicas a Hell and Knowlton (H K), gerida por gente ligada à Casa Branca, com um contrato de 12 milhões de dólares (valor importante em 1990) que tratou de inventar e organizar toda uma série de mentiras difundidas pelos media. Note-se que a H K tinha 80 agências pelo mundo inteiro que se encarregavam de passar os conteúdos criados para os media.

S H chegou mesmo – o que é recorrente – a ser comparado a Hitler sem qualquer base material concreta, além de ser um ditador antes ao serviço dos EUA. Fotos de satélite e vídeos foram criadas mostrando tropas do Iraque na fronteira com a Arábia Saudita; o movimento F K organizava manifestações de repúdio e enviava cartas a políticos e media sobre atrocidades alegadamente cometidas pelo Iraque. 

A H K fez estudos de opinião analisando a reação das pessoas a determinados textos. Verificou-se que os de maior carga emocional provocavam mais a atenção e indignação das pessoas – foi assim entre outras invenções que foi posto a circular a “morte de bebés” pelas tropas do Iraque.

Inicialmente falou-se em 22 bebés que estavam em incubadoras roubadas pelo Iraque sendo os bebés deixados no chão a morrer. Uma das testemunhas falsas apresentadas foi um dito cirurgião – era um dentista – que disse numa comissão ter ele próprio enterrado 14, numa versão posterior passou a 70 bebés. Os 22 bebés passaram depois a 122 e chegou a falar-se em 312 bebés, um absurdo, como se o Koweit tivesse esta quantidade de incubadoras, quando em Los Angeles havia apenas 13 incubadoras. Mas nem um media se lembrou de por em causa estas mentiras… A Amnistia Internacional alinhava em tudo isto apesar das contradições e podemos acrescentar… obviamente!

A H K criou imagens e vídeos que denunciavam as atrocidades do Iraque que todas as TV passavam. Testemunhas eram preparadas, como uma senhora que afirmava em entrevista ter visto as incubadoras a serem levadas e bebés a morrerem. O senador que conduziu um debate sobre o Iraque estava ligado à agência H K. Claro que o Iraque não tinha meios nem dinheiro para rebater estas histórias o que não quer dizer que não tivesse havido violência da parte das suas tropas.

Quando os EUA entraram no Koweit a equipa da CNN viu todas as incubadoras e o pessoal médico que se mantinha a trabalhar, negou qualquer violência no hospital, a equipa não foi autorizada a entrar nos outros dois hospitais. Nada disto foi então comunicado à opinião publica: as mentiras foram ignoradas.

Resultado: mais de 85 000 toneladas de bombas sobre o Iraque, 130 000 mortos iraquianos entre os quais muitos civis, como os que se retiravam do Koweit. Apesar de tudo isto os EUA não deixaram de apoiar S H quando este massacrou xiitas do Iraque revoltados contra a falta de direitos. 

Treze anos depois, uma encenação idêntica repetiu-se com as “armas de destruição maciça”. Com antes contra a Sérvia, Líbia, etc., etc. Sempre com o apoio dos “partidos democráticos” – os da tal “democracia liberal”.

Este caso ilustra bem a manipulação em nome da defesa de democracia e direitos humanos que os noticiários exibem sem escrúpulos à margem de todo o dever deontológico, desde que o “império do caos” assim exija.

A questão é: como pode funcionar uma democracia assente na mentira?

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