A cimeira do BRICS em Kazan, na qual participaram líderes de 36 países, formalizou designadamente na sua declaração o fim do mundo unipolar e a incapacidade do ocidente marginalizar a Rússia e Putin. A participação de Guterres na cimeira deixou os propagandistas à beira de um ataque de nervos, procurando esconder que “era importante para a ONU, já que os países do BRICS representam quase metade da população mundial.”
O império defronta-se assim com outro dilema: impor a sua hegemonia unipolar ou aceitar a multipolaridade. A questão é que não têm como conseguir a primeira nem sabem conviver com a segunda. Na ordem unipolar os neoconservadores previram que os Estados Unidos determinariam o sistema financeiro, baseado no dólar, o estabelecimento de bases militares no estrangeiro, a adesão à NATO, que países podiam ser considerados democráticos e pertencer à sua "comunidade internacional, sem que outros países tivessem direito a opor-se.
Para impor um poder global os EUA planearam uma “guerra ao terror”, mas falharam. No Médio Oriente, África, Afeganistão, Iraque, Iémen, Líbia; Somália, onde intervieram direta ou indiretamente o que obtiveram foi situações caóticas. O Afeganistão está melhor sob o domínio dos Talibã, apoiando-se na China e na Rússia, que sob os EUA e aliados. O Iraque recupera e alia-se ao Irão; a Síria com a ajuda da Rússia expulsou os rebeldes financiados pelo ocidente, controla a quase totalidade do território. Para os propagandistas Bachar al Hassad não duraria seis meses.
As revoluções coloridas, já não funcionam. Visavam derrubar governos que se desligavam dos EUA. Líderes fantoches, na Rússia, Venezuela, Bielorrússia, Geórgia, etc., serviram para excitação temporária nos media, acabando por cair no esquecimento. Tudo isto mostrou ao resto do mundo as fragilidades e o declínio do império.
As sanções à Rússia e à China não foram seguidas pela grande maioria dos países. A reeleição de Maduro foi aceite pelo resto do mundo. Nações africanas orientam-se para a Rússia e a China e pedem a saída das bases militares dos EUA. O império perdeu o controlo de grande parte do mundo, mas perde também o controlo dos seus aliados, com divisões na UE/NATO e sobretudo de Israel. É a cena do aprendiz de feiticeiro
Os EUA têm pela frente três teatros de guerra, porém os seus políticos mostram-se completamente incompetentes para controlar os processos globais em curso. O que faria mais sentido para os EUA seria tentar encontrar um compromisso, mas isto exigiria uma liderança sóbria, pragmática e bem informada, o que não existe nos EUA. A alternativa é esperar que o pior cenário, talvez inevitável, não se desenrole. Caos sem controle – Comunidad Saker Latinoamérica)
O BRICS criou uma nova ordem mundial multipolar, enfraquecendo a hegemonia ocidental. Os EUA perceberam que estão a perder terreno, um novo sistema forma-se fora do seu controlo. A imprensa ocidental reconhece que o BRICS+ expande-se, desdolariza-se e é ouvido no Sul Global. Moscovo pressiona para "uma ordem mundial alternativa... para combater uma dominada pelas nações ocidentais ricas", escreve o Washington Post. Outros media reconhecem que há "um aumento substancial no interesse na filiação ao BRICS". "Após várias décadas de guerra e sanções, as nações BRICS+ estão cada vez mais desconfiadas da "ordem baseada em regras" liderada pelos Estados Unidos, que favorece poucos às custas de muitos."
A multipolaridade é um facto, mas o que atualmente existe são dois blocos hostis cada qual com suas contradições. Embora exista um impulso em direção a uma nova estrutura financeira internacional, há um longo trabalho pela frente, a desdolarização não é simples nem fácil, o BRICS não tem uma ideologia comum. Os países do G7 contam com os interesses instituídos, as oligarquias dependentes do dólar, ligadas ao ocidente e vivendo à sombra do seu neoliberalismo, além dos media e ONG ligadas à CIA. O FMI, o BM, a OMC, farão tudo para garantir que os EUA mantêm o domínio do sistema financeiro global.
Chegar a um consenso sobre certos temas torna-se difícil. Um exemplo é o Brasil vetar a Venezuela como parceira do BRICS, o que não foi bem aceite pelos membros, parceiros e Sul Global. O governo Lula está sob enorme pressão dos EUA, o que por si só não explica a decisão.
Há um lóbi poderoso anti-BRICS no governo brasileiro, há o poder da oligarquia, “facilitado” como de costume por ONG americanas fortemente infiltradas no país. O Brasil privilegiou o G20 em detrimento do BRICS, o que pode levar a problemas no próximo ano, quando o Brasil assumir a presidência do BRICS. Os BRICS fazem história: eles conseguirão manter o ritmo?)
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