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13 de maio de 2024

Argentina, o liberalismo e os condenados à fome

 A Argentina não aparece nos media. Compreende-se, não convém perturbar a propaganda da "democracia liberal" com tais exemplos, designadamente nos condenados à fome pelo liberalismo

As organizações sociais realizaram um Dia Nacional de Luta contra a austeridade, a eliminação dos programas sociais e o encerramento das cantinas. Em seis meses de governo já se realizaram duas greves gerais.

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) entrou com vários pedidos de proteção nos tribunais para intervir diante da grave crise humanitária vivida nos bairros populares e principalmente nas cozinhas comunitárias subabastecidas, enquanto aumenta o número de pessoas a vasculhar no lixo para sobreviverem.

Os anteriores governos de direita e liberais, levaram o país ao caos, mas não cancelaram no essencial os programas sociais instituídos pela esquerda e mesmo pelo peronismo. Agora são cortados apoios às cantinas de beneficência, já por si símbolo de miséria generalizada legada pela direita, substituídos pelos programas: De Volta ao Trabalho e Acompanhamento Social, em que beneficiários "receberão um abono válido por 24 meses de 78 000 pesos por mês", com uma cláusula importante: aqueles que "perturbam a ordem pública" ou "impeçam o funcionamento normal dos transportes" perderão o apoio.

Note-se que sendo o cabaz básico superior a 900 000 pesos para uma pequena família, o apoio dá para 4 dias. O salário mínimo é de 234.000 pesos tendo perdido 40% do poder de compra com Milei.

Os empregos sociais estão a ser eliminados, como se não fossem necessários. A lógica do governo é que tudo é resolvido pelo mercado. Os refeitórios são procurados por mais pessoas, têm portanto mais dificuldades recorrendo a coordenar com outros refeitórios e com a Igreja os dias em que cozinham.

O governo de Milei, democraticamente eleito como é reivindicado, quer acabar com a "subsídio dependência" (na expressão de um social-democrata), está a resolver os problemas com repressão, a polícia usando mesmo balas de borracha contra marchas de movimentos sociais reivindicando alimentos para os refeitórios. Embora o governo tenha colocado todos os seus recursos para assustar manifestantes, as mobilizações têm aumentado.

Mas os "bons" efeitos do mercado fazem-se sentir: em seis meses o cabaz básico de alimentos subiu 89,68%. Outro dos setores afetados são os trabalhadores da agricultura familiar, setor de altíssima vulnerabilidade está a ser inviabilizado pelas decisões do governo. Além disto, o governo oficializou a suspensão de 9 mil cooperativas.

O agronegócio expande-se e mata quem se opõe. A Via Campesina explica que, nos últimos anos, empresários do agronegócio têm recorrido à contratação de marginais, dão-lhes armas e levam-nos para as terras dos povos camponeses-indígenas que pretendem usurpar. Procedem ao roubo ou abate de animais, ameaças e confrontos que terminam em assassinato. Números mostram perseguição às famílias que produzem, sustentando formas tradicionais de cultura em harmonia com a floresta nativa.

O negação dos crimes da última ditadura é outra característica do governo de extrema-direita liberal, referindo-se aos direitos humanos como "uma desculpa" para gerar "divisão entre os argentinos".

Não se diga que o governo Milei não tem boas qualidades e não merece proteção dispensada pelos media. Milei quer aderir à NATO - embora a Argentina fique no Atlântico Sul... O presidente da Bolivia, Luis Arce, diz que tal "está a colocar em risco a paz da região porque sabemos o que a NATO procura nos diferentes países." (Geopolítica ao vivo – Telegram 26/04)

Milei isolou a Argentina dos parceiros económicos e dos seus vizinhos sul-americanos, com planos anunciados para considerar o envio de ajuda militar à Ucrânia. O índice de aprovação de Milei caiu em meio a protestos inflexíveis contra a fome em todo o país. Milei está a tentar vender uma economia neoliberal favorável à elite num pacote falsamente radical. Retirou a Argentina das conversações do BRICS, é um grande apoiante de Israel e das suas atrocidades. Defende a ideologia das elites globais, o neoliberalismo; está a desistir da moeda argentina, tentando fazer com que a Argentina tenha como moeda o dólar americano... Quando no Equador tomaram estas medidas no final dos anos 90, a economia foi completamente destruída, em 1999, as pessoas passavam fome e morriam de desnutrição. O neoliberalismo foi tentado como sistema económico e falhou… O neoliberalismo e as políticas de mercado livre são o que é defendido no Fórum Económico Mundial, no BM, no FMI (Geopolítica ao vivo – Telegram 16/04).

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