“Os verdadeiros homens de bem não procuram a competição. Mesmo num torneio de tiro ao arco, saúdam-se e cedem a passagem; depois do torneio bebem à saúde do vencedor. Mesmo na competição o homem de bem continua a ser um homem de bem”. Confúcio
A economia hoje, mais que nunca baseia-se na competição. Pode dizer-se que a competição sempre existiu e é um estímulo para o desenvolvimento económico. Mas o que a frase acima nos diz não é para acabar com a competição. É para sermos homens de bem mesmo na competição, para não se tornar no objectivo central da vida pessoal e social. O que a frase nos diz é que o homem de bem deve procurar não a competição, mas a perfeição. A perfeição não é vencermos o outro, é vencer-nos a nós próprios, ajudando os mais fracos, saudando os mais aptos. A competição para ser um bem terá de ser equilibrada pela cooperação.
A concorrência é necessária, mas é como um remédio. O que se passa é que o sistema actual faz da competição um absoluto, até à intoxicação. É o que se passa com a lógica do designado mercado livre. O que devia ser um meio usado controladamente de acordo com as necessidades e em benefício dos povos, torna-se uma droga ou um veneno social. Em nome da competitividade, as sociedade sofrem os piores retrocessos sociais e civilizacionais. A competitividade torna-se uma abstracção, ou melhor, uma falácia, para encobrir o domínio das oligarquias, sempre demasiado grandes e poderosas para falir, em nome de fantasiosos riscos sistémicos, que encobrem perante a opinião pública, as cedências do poder político.
Aristóteles dizia que o excesso de virtude é vício. E o sistema torna-se vicioso na medida em que a ausência de regulação e controlo, abre a porta não só à irracionalidade da especulação financeira como ao crime organizado, à medida que os interesses privados se apropriam de bens públicos e orientam as políticas da sociedade em função dos seus interesses. Desta forma a competitividade torna-se no seu contrário: “O monopólio é engendrado pela própria concorrência” (1)
O “comércio livre” é a arma que os oligopólios usam para enfraquecer ou aniquilar as resistências ao seu domínio.
Ora, só pode haver verdadeira competição entre equivalentes. Caso contrário não se trata de competição mas de opressão. Mais grave ainda, quando se faz entrar no funcionamento do dito mercado livre os factores de sobrevivência de quem trabalha. Aí desaparecem todos os conceitos de liberdade, é o campo aberto à escravatura moral e material dos indivíduos.
A concorrência perfeita parte do princípio que os preços de mercado não são alteráveis por nenhum interveniente. Cada interveniente situa-se de maneira a obter a máxima satisfação ou máxima utilidade e nestas condições haverá para cada sistema de preços um equilíbrio entre procura e oferta. De facto, o que pretende ser um esquema perfeito peca nos seus fundamentos por pretender traduzir o comportamento do mercado ou dos mercados por equações lineares, cometendo um duplo erro: traduzir comportamentos sociais em equações e querer que as equações sejam lineares quando na realidade dependem de factores não lineares e condições de incerteza. A não previsão das crises pelos epígonos do sistema prova-o. Na realidade deliravam, elogiando empresas e países já á beira do abismo da falência e bancarota.
Em concorrência ganha quem tem maior poder de mercado porém a eficiência competitiva só é válida para uma total equivalência desse poder. Assim, o equilíbrio propalado como “perfeito” pode ser e é, na realidade um descalabro social.
Contudo, de que concorrência falamos? Em cada um dos principais sectores dos mercados mundiais, 80% da produção é controlada em média por cerca de 5 ou 6 grandes empresas! Uma rede de 147 empresas transnacionais controla 40% da economia mundial. Passámos do capitalismo monopolista de Estado para o capitalismo oligopolista transnacional.
As relações de produção e o sistema político estabelecido conduzem a que intervenientes, sob a forma de monopólios e oligopólios, adquiram “poder de mercado”, isto é, a capacidade de obter rendimentos ou taxas de lucro superiores à média. O modelo competitivo actual, por muitas loas que se cantem, não existe senão para as MPME.
Sob a lei do “mercado livre” a concorrência tornou-se no seu contrário. É a legalização do saque e da expropriação dos mais fracos, é a economia do desemprego e da regressão social.
Quanto ao comércio internacional, o que se passa, sob o lema da competitividade, transforma uma actividade produtiva essencial à existência e realização de cada país e de cada ser humano numa guerra: a guerra mundial das economias, sob a égide das grandes transnacionais. Como frisou Marx, uma guerra que se ganha não recrutando novos efectivos, mas antes licenciando-os. (Trabalho Assalariado e Capital)
A concorrência que alegadamente traz vantagens para o consumidor é outra falácia. Na realidade o que se pode comprovar é que “Diminuindo os custos dos bens necessários à existência social “veremos que os salários acabarão por baixar” (2). Situação obviamente favorável ao aumento dos lucros monopolistas, o que pode ser também comprovado pela intensa actividade de fusões, compra, e encerramento de empresas – é a “destruição criadora”. Destruição de salário, criadora de rendas.
Diz-se que é necessário tornarmo-nos mais competitivos para que haja investimento e criação de emprego e reduzindo os custos e os direitos laborais. Outra atoarda.
Dizia o sr. Quesnay “Não é o consumo das produções que falta numa nação onde a maior parte dos cidadãos nunca consome tanto quanto desejaria consumir; é o bom preço que falta quando não está assegurada a livre concorrência”. Este texto contém uma confusão grosseira (que persiste até hoje). Afirma-se que os produtos podem ser vendidos desde que haja indivíduos com necessidades. Mas despreza-se inteiramente a questão de saber se podem pagá-los. Despreza-se o facto de que a extensão dos mercados é a condição da produção capitalista. Numa economia baseada na concorrência o investimento e o aumento da produção tem como condição prévia a extensão (ou a sua previsão) dos mercados. Isto é, que estejam disponíveis os recursos monetários para pagar os consumos. (3)
Querer combater o défice e ter crescimento económico, com “austeridade” e “programas de ajustamento” neoliberal é menos que uma falácia é o grau zero do pensamento económico (4)
1 – Marx,- Miséria da Filosofia - p.133;
2 - Ricardo citado por Marx em Miséria da Filosofia – p.49
3 - Hist. Pens. Económico – Henri Denis – p.177 – 178
4 – Ver neste blog “Economia Política Alquimica” (Junho 2011)
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