A concorrência não é emulação industrial é emulação comercial (…) a emulação industrial só existe com vista ao comércio. (1)
Um exemplo claro desta constatação é configurado pelas megaempresas de distribuição, que funcionam como mecanismos de extorquir mais valia a montante e a jusante, isto é, a produtores e a consumidores. Estas megaempresas foram impulsionadas pela competitividade, no seu fenómeno destrutivo mais evidente, mas também pela protecção estatal e a cedência a todas as suas exigências de expansão, processo donde não se excluiu a corrupção.
A empresa norte-americana Wal-Mart (um gigantesco oligopólio da área da distribuição) pode ser considerada um modelo de competitividade. Trata-se de uma das maiores empresas a nível mundial a par com as maiores petrolíferas e exemplo acabado dos processos do o actual modelo económico e social. O seu volume de negócios, que se expande por vários países muitas vezes com outra designação, excede o PIB de uma centena de países. Entre os 20 indivíduos mais ricos do planeta aparecem 4 pessoas da família Walton, totalizando uma fortuna de 83,6 mil milhões de dólares (Forbes - 2010). É também um exemplo de como estas megaempresas constituem um flagelo económico, social e ambiental.
Ambiental, pela poluição e depredação de recursos de que apenas um dos aspectos constitui o facto de milhares de camiões (mais de 7 000) estarem em circulação dia e noite ao seu serviço. Social, pela repressão nas empresas. Há especialistas para reprimir reivindicações e a organização sindical. A flexibilidade e a desregulamentação permitem a impunidade patronal. O direito à greve está na prática eliminado. A ética deste esquema resume-se a que para os trabalhadores “é melhor isto que nada”. Flagelo também económico, pelos baixos salários – muito altos para os dirigentes – pela pressão sobre os fornecedores, impondo reduções de preços e prazos tendo como consequência a redução dos salários e acrescidos ritmos de trabalho nestas empresas, transmitindo para montante a degradação das condições sociais.
Já lá vai o temo em que se afirmava: “O que é bom para a General Motors é bom para os EUA”. Hoje a Wal-Mart, está bem, mas os EUA estão mal, tal como por cá o sr. Belmiro ou o sr. Soares dos Santos, o sr. Amorim, estão bem, mas o país está mal, o mesmo se passando no Reino Unido, na França, na Itália ou na Alemanha. A Wal-Mart é um exemplo de como as grandes cadeias oligopolistas exercem o seu poder financeiro e de grande cliente obtendo toda a protecção estatal com o argumento de baixos preços (situação manipulada por publicidade enganadora) e de criar empregos – sem ter em conta os que destroem.
Diz-se que a competição ajuda a melhorar. Talvez, mas devemos analisar de que espécie de melhoria falamos. Que lei do mercado promove e defende direitos sociais? Que lei do mercado serve de guia à defesa da vida natural e do ambiente? Pura e simplesmente o mercado ignora estes aspetos ou não tem forma de os contemplar, face às necessidades da concorrência. Com razão já foi afirmado que o mel pode estar sujeito às leis do mercado, as abelhas não. Se a concorrência não respeita a vida natural, e por si não respeita, então é factor não de eficiência mas da maior ineficiência social.
A História Económica mostra que o desenvolvimento capitalista só foi conseguido contrariando os princípios do “mercado livre”, nomeadamente através de protecção aduaneira, subsídios do governo, intervenção do Estado, planeamento económico.
A concorrência, levada aos limites que a “economia de mercado” procura promover, leva à desvalorização dos mais importantes valores sociais, tornando-se neste sentido uma aberração.
Será então possível prescindir da emulação competitiva? Pensamos que não. Porém a competitividade tem de ser um elemento do progresso e não uma deformação dos comportamentos individuais e do todo social. Sob o impulso da revolução de Abril foram estabelecidas formas – que a contra-revolução logo liquidou – de melhoria da competitividade baseada na coordenação sectorial e na cooperação, através do planeamento democrático.
A emulação económica, a competitividade, a produtividade, têm de ser estimuladas por factores morais e materiais junto dos trabalhadores, não por maior exploração e insegurança, configurada na flexibilidade laboral, no trabalho sem direitos, nos objectivos neoliberais corporizados na Wal-Mart, entre tantos outros exemplos.
Diz-se que sem mercado livre não há verdadeira competição. Sem dúvida que o meu competidor pode ajudar a melhorar o meu desempenho. A questão porém é: quem controla os limites da competição? Aceitar os fundamentos do sistema e querer depois controlá-lo ou regulá-lo é como consumir drogas moderadamente. Chega-se a um ponto em que só há dois caminhos: ou se abandonam de vez ou se é por elas dominado. A actual fase do capitalismo, com a social-democracia a seguir o caminho de total cedência ao capitalismo neoliberal, mostra isto mesmo. De forma, que com este género de pensamento a sociedade vive unicamente de ditos valores subordinados ao máximo lucro – financeiro.
A concorrência, a competitividade, pode portanto ser criativa ou destrutiva. Será criativa quando for equilibrada pela cooperação e pela coordenação económica. E esta dimensão não pode ser dada pela acção do mercado, apenas pelo Estado desde que seja estabelecida uma política económica orientada por critérios de eficiência social e colectiva.
É destrutiva quando representa desemprego, repressão laboral e falências das MPME. Trata-se da “destruição criadora” do sr. Schumpeter, criadora sim, mas apenas de superlucros para o sector oligopolista.
A competitividade neoliberal com a cosmética de criar empregos, o que os factos totalmente desmentem, é feita, afinal, de engenharia financeira, técnicas de gestão com recurso à arbitrariedade, planeamento burocrático e repressivo e Estado mínimo ao serviço de “dumping” social (2)
1 - 1 – Marx,- Miséria da Filosofia - p.130;
2 - Serge Halimi, “A Wal-Mart à conquista do mundo” – Le Monde Diplomatique – Janeiro.2006. Alguns dados sobre a Wal-Mart, foram também retirados deste artigo.
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