A ÁRVORE QUE ESCONDE A FLORESTA, por François Leclrerc
Blog
de P:J:
Mais
do que qualquer outro país europeu, é a Itália que melhor ilustra
a metáfora da árvore que esconde a floresta, nestes tempos de
calma. O Tesouro italiano multiplica as emissões de obrigações
para melhor aproveitar do abaixamento nas taxas. Já conseguiu
financiar 10% das suas necessidades para o ano (420 biliões de
euros) e esforça-se para prolongar o vencimento da sua dívida para
a tornar menos vulnerável a tensões futuras, uma vez que já
atingiu 126% do PIB. Mario Monti, em força na sua campanha
eleitoral, usa o argumento para dizer que o pior da crise financeira
já passou, reconhecendo que não é esse o caso da crise econômica.
Tudo está lá!
A
economia italiana mostra com efeito uma degradação lenta e
irresistível, no contexto europeu recessivo actual e sob os efeitos
das medidas de austeridade tomadas por Mario Monti. Para atingir os
objectivos de redução do défice implicará ainda adoptar novas
medidas, dado que estão em falta 9000 milhões a partir do orçamento
deste ano. Desde Abril de 2008, a produção industrial caiu 24,9% e
registou-se uma contração de 3,4% no crédito de Novembro de 2011
a 2012, afectando mais particularmente as empresas. O poder de compra
dos italianos caiu 4,1% durante os primeiros nove meses de 2012 (em
comparação com o mesmo período de 2011) e 1,9% em apenas três
meses, devido ao aumento de impostos e taxas. A taxa de desemprego
vai chegar a 12% em 2014, segundo o Banco da Itália. É certo que a
situação social na Itália não é o da Espanha, Portugal e Grécia,
mas isso deve-se à importância da sua economia informal, que faz de
colchão.
Agora
a palavra é dos líderes políticos, enquando se aguarda a dos
eleitores no final de Fevereiro. Enquanto a campanha de Berlusconi
cresce em força, recusando as medidas de austeridade e preconizando
a intervenção do BCE para garantir a dívida europeia a de Mario
Monti demoniza a perspectiva de um resgate e propõe um
programa de reforma pondo o ênfase em medidas de privatização e
liberalização, acompanhadas por uma maior flexibilidade do mercado
de trabalho, mais cauteloso nas medidas de austeridade. O programa de
Pier Luigi Bersani, o candidato de centro-esquerda, que vai à frente
na corrida, parte de um grande acordo que trocaria poderes ao nível
europeu e perda de soberania contra uma diminuição da austeridade e
a adopção de medidas contra-cíclicas de relance. Um caminho
estreito e rastreado, feito da continuação das reformas do Estado e
de negociações entre sindicatos e líderes empresariais a favor de
um crescimento moderado financiados pelo Banco Europeu de
Investimento para apoiar o mercado interno. Mas é preciso dois para
dançar o tango, como diz a velha expressão, e convencer o parceiro
alemão …
Continua
a recomposição da paisagem política italiana, mas ela não oferece
uma solução para os problemas do país. O advento de um governo de
centro-esquerda, que poderia assinar de uma forma ou de outra, um
pacto com Mario Monti é esperado pelos meios dos negócios italianos
e autoridades europeias. Mas ele não cria grande margem de manobra
porque vai enfrentar a necessidade de uma desvalorização
interna, á qual em breve terá de se resignar. Deste ponto de
vista, o governo saído das eleições terá de enfrentar uma
situação semelhante à do governo francês que foi levado a tomar
medidas contrárias às inclinações do seu eleitorado.
O
tempo que vai levar o desendividamento é uma questão que ultrapassa
o destino da Itália e da Europa. A sua progressão está sujeita a
percalços de percurso inevitáveis e depende de conseguir um
superávit orçamental primário, a menos que aceite que os balanços
dos bancos centrais continuem a inchar demais, ou se envolva numa
política de reestruturação da dívida. Este superávit fiscal está
em vias de se tornar o índice para acompanhar melhor a crise, de que
a frágil existência está sujeita aos efeitos negativos da recessão
causada pelas medidas de austeridade. Em dez anos, a dívida global
privada e pública aumentou de 80 para 200 mil milhões de dólares,
o que representa um crescimento de 11% ao ano, muito maior do que o
PIB mundial, que é actualmente de 70.000 biliões de dólares. Os
balanços dos bancos centrais por sua vez aumentaram 16% no mesmo
período, de acordo com Hayman Capital, um fundo de hedge dos EUA que
se tornou famoso por apostar com sucesso no colapso do mercado
subprime (*). Não é preciso procurar muito para compreender que o
sistema se tornou numa máquina para produzir dívida e já foi longe
demais. É que pegar na questão somente sob o ângulo da dívida
pública é uma piada de mau gosto. A Itália não é excepção e
continua ainda a representar a mais perigosa espada de Dâmocles
sobre a zona euro.
Trad:
Margarida S.
Margarida S.
(*)
Com a ajuda de CDS (Credit-Default Swaps) "nus" (sem
exposição real ao risco) em títulos lastreados em empréstimos
subprime da pior qualidade.
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