Janeiro
2012
«Será
exagerado avançar a hipótese que a crise da zona euro não é mais
que o sintoma de uma crise mais geral do capitalismo avançado? »
interroga-se o economista C.J. Polychroniou, que lembra que «o
sistema económico foi confrontado a fortes tensões e
constrangimentos estruturais desde há muitos anos antes do
desencadeamento da crise financeira em 2007 : nomeadamente a
sobre-produção, o aumento dos défices comerciais, a falta de
crescimento, de emprego e dos níveis de endividamento muito
elevados. »
por
C. J. Polychroniou, Economics Institute, 6 Dezembro 2011
Será
exagerado avançar a hipótese de que a crise da zona euro não é
mais que o sintoma de uma crise mais geral do capitalismo avançado ?
O
mercado de obrigações italiano está a ser vítima de ataques
frontais dos justiceiros da dívida pública, e o incêndio
propaga-se ao coração da Europa. Entretanto, Angela Merkel, a dama
de ferro, resta inflexível na sua oposição a que a Banca Central
Europeia (BCE) aja como emprestadora de último recurso – posição
que, tendo em conta a gravidade do momento, deveria certamente fazer
franzir as sobrancelhas de um Friedrich Hayek, face à ortodoxia da
política monetária alemã. Perante esta situação, a Reserva
Federal Americana associou-se à operação coordenada com cinco
outros bancos centrais (incluído o BCE), vindo em socorro do sistema
bancário europeu e, por extensão, da própria zona euro, e
finalmente talvez também do capitalismo avançado.
Dois
anos depois de ter ocorrido o desastre grego (que entretanto se
transformou numa verdadeira crise orçamental), seguida naturalmente
por graves problemas noutras partes da zona euro (mal descritos como
uma crise da dívida soberana), a crise da zona euro toma doravante a
aparência de uma profunda crise bancária europeia.
A
iniciativa da Fed, que um certo número de economistas tinha
recomendado desde há algum tempo, foi motivada pela constatação
que os bancos europeus tinham dificuldades de refinanciar o
equivalente de perto de 1500 biliões de euros de dívida titulada em
dólares americanos. A situação desesperada na qual se encontraram
os bancos europeus tornara-se bastante evidente desde há algumas
semanas: eles na prática já não tinham acesso ao mercado do dólar.
A
acção conjunta da Fed e dos outros grandes bancos centrais segue um
guião que vem directamente do Tratado sobre a Moeda de John Maynard
Keynes. De facto, é fortemente possível que os capitalistas de hoje
bem como os das gerações futuras tenham que agradecer ao Sr. Keynes
por ter salvo o capitalismo mundial em duas ocasiões: durante o
krach de 1929, e depois no de 2008.
Naturalmente,
os bancos europeus não são os únicos a atravessar um muito mau
período. É pouco provável que os bancos americanos estejam em
melhor situação, e as perspectivas para o sector bancário
americano vão escurecer grandemente se a situação actual na zona
euro se prolongar. De facto, los bancos americanos serão
confrontados num futuro muito próximo com enormes volumes de dívida
chegada à maturidade. Para começar, com mais de 50 biliões de
dólares de dívidas que chegam ao prazo este mês. Pode-se pois
esperar que a Fed esteja nuito ocupada nos próximos meses.
Mas
deve-se compreender o problema da Eurolândia, os que existem deste
lado do Atlântico, ou ainda a estagnação da economia japonesa,
como unicamente devido às recaídas da crise financeira?
Deve-se
atribuir-lhe todas as dificuldades sociais e económicas às quais
estão confrontadas quer o Antigo quer o Novo Mundo – estagnação
do crescimento, subida em flecha do desemprego, abaixamento das
perspectives de criação de novos empregos, fraqueza da procura,
fosso crescente entre os mais ricos e os mais pobres, mal-estar
social ?
Pode-se
defender, com argumentos sólidos a tese segundo a qual aquilo a que
assistimos, não é simplesmente uma grave crise financeira cujo
centro de gravidade se encontra no mundo desenvolvido, mas uma crise
mais geral do capitalismo avançado.
O
sistema económico está confrontado a fortes tensões e
constrangimentos estruturais desde há muitos anos antes do
desencadeamento da crise financeira em 2007 : nomeadamente a
sobre-produção, o aumento dos défices comerciais, a falta de
crescimento, de emprego, e níveis de endividamento muito elevados.
A
acumulação da dívida do sector privado das economias ocidentais,
que escaparam a todo o controlo, é largamente o resultado da
estagnação dos salários. Nos Estados Unidos estes estagnaram desde
meados dos anos 1970, dando nascimento a uma nova «Idade Dourada»,
e a uma renovação das teses proclamando a superioridade de um
capitalismo darwinista.
Por
outro lado, os défices orçamentais e a acumulação da dívida
pública, se bem que largamente ampliadas pela crise financeira de
2007-08, foram em grande parte o resultado de políticas insidiosas
que beneficiaram os mais ricos e os rendimentos do capital. A ideia
de uma « sociedade boa e justa » transformou-se num sonho
longínquo na maior parte das sociedades capitalistas avançadas.
Ao
mesmo tempo que se que continua a crise da zona euro e que a
economia americana pena para se salvar, devemos reexaminar os factos,
e afinar os nossos instrumentos de economia política, considerando
que o que se desenrola na hora actual nas economias avançadas não é
somente uma crise bancária ou financeira, mas uma crise mais
profunda do capitalismo.
CJ
Polychroniou é
membro associado do Levy Economics Institute.
Sem comentários:
Enviar um comentário