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11 de abril de 2019

O Publico mais uma vez ao serviço dos grandes senhores do dinheiro e da Terra


ACUDAM, ELES QUEREM VOLTAR AOS GRÉMIOS DA LAVOURA! Agostinho Lopes
O Editorial de Manuel Carvalho (MC) no Público (06ABR19) é uma violenta diatribe contra a decisão da Assembleia da República recuperar para a Casa do Douro, o seu anterior estatuto de associação pública de inscrição obrigatória. Vamos ao essencial dos argumentos de MC.  
O «regresso da Casa do Douro ao seu funesto passado salazarista»! «(…) um modelo inspirado no corporativismo de Salazar»! Extraordinário. MC não deu por ela, mas a Revolução de Abril, que faz agora 45 anos, liquidou a organização corporativa! Ter uma estrutura com uma direcção eleita pelos seus associados, todos os vitivinicultores da Região Demarcada, ou uma entidade comandada pelos Procuradores Natos, os grandes proprietários de cada concelho, vale o mesmo? Não se percebe a diferença da democracia? Não se percebe a manutenção de um mesmo conjunto de atribuições e competências de uma função regulatória da mais complexa região vitivinícola do país (talvez do mundo)? Mas a situação a que a Casa do Douro, financeira inclusive, não resultou da retirada dessas competências em nome de um putativo modelo comunitário que não existe? Que sempre foi a falsa e fraca justificação para lhas retirarem. Por exemplo, a retirada do monopólio da aguardente vínica, que se traduziu na transferência anual uns milhares de euros de mais valias da lavoura duriense para os bolsos do «oligopólio» (MC dixit) das Casas Exportadoras.
«A Casa do Douro manteve os seus privilégios corporativos até muito depois do 25 de Abril. Foi sob a égide desses privilégios que se arruinou em negócios insensatos que abriram portas a gestores arrivistas e irresponsáveis». Seria bom que MC esclarecesse o que quer dizer com este arrazoado. O que MC quer dizer, é que directores (não gestores) da Casa do Douro, eleitos pelos viticultores durienses, muitas vezes apoiados pelos amigos de MC e o tal «oligopólio», cometeram erros de gestão, fizeram «negócios insensatos»? Sim, talvez. Mas o seu maior erro, o indesculpável, foi não terem mobilizado o povo do Douro contra o “assassinato a sangue frio”, de forma programada, persecutória e obstinadamente, da Casa do Douro, pela política de direita de sucessivos governos do PS, PSD e CDS! A Casa do Douro foi sangrada em vida com a retirada de receitas, transferidas para exportadores (aguardente vínica), IVDP (cadastro), e por via do IVDP dinheiro do Douro é transferido para as Finanças Públicas/OE! Até das suas cotizações foi roubada! A Casa do Douro foi espoliada de receitas prometidas e garantidas por inúmeros protocolos assinados por ministros e secretários de Estado e nunca cumpridos. Mesmo o tal negócio «insensato» a que MC se refere, transformou-se num buraco financeiro graças a um Ministro da Agricultura. O actual.     

«Mudar este estado de coisas que tinham deixado ao Estado uma dívida de 160 milhões de euros exigiu uma solução que, face à gravidade dos problemas, jamais poderia ser perfeita». “Água benta, cada qual gasta a que quer”, mas absolver «a solução» do Governo PSD/CDS P Coelho/P Portas/Assunção Cristas, em nome de males maiores, de que era a única, não lembra ao diabo! Esta foi «a solução» para entregar à CAP um património de todos os viticultores durienses, através de uma tal Federação Renovação do Douro - sem qualquer representatividade ou história na Região Demarcada! Perante a invocação por MC da «dívida de 160 milhões» dever-se-ia contrapor os milhares de milhões gastos pelo erário público com os «negócios insensatos» de banqueiros e bancos sem «privilégios corporativos», mas os muitos privilégios do grande capital. Com uma diferença: os 160 milhões da Casa do Douro tinham e têm uma contrapartida conhecida e segura, os seus stokes de vinho do Porto.
«Que o Bloco e o PCP desde sempre defensores da mão de ferro do Estado nos assuntos durienses advoguem o regresso da Casa do Douro salazarenta ainda se percebe. Mas o que quer o PS, ao questionar o principio da liberdade de associação?» Já se sabia, o MC não quer a «mão de ferro do Estado», a não ser quando essa mão se chama Instituto dos Vinhos do Porto e Douro, IVDP, um instituto público. O MC não quer a vontade democrática dos viticultores durienses, mas a mão exploradora do «oligopólio dos exportadores» a comandar os assuntos durienses. MC conhece a especificidade única da Região vínica Douro. Sabe que há uma coisa chamada benefício. O MC sabe que os vitivinicultores para produzir DOC ou DO, fabricarem Vinho do Porto, têm que estar inscritos hoje - inscrição obrigatória - num instituto público, o IVDP! O MC vê-se que conhece mal outras regiões demarcadas da Europa: Mas o que obrigava a que o Douro tivesse as mesmas regras? A União Europeia? Não há outras associações profissionais de inscrição obrigatória no ordenamento jurídico português? Calcule-se, que para exercer advocacia (ou medicina, ou…) os advogados têm que estar inscritos numa dita Ordem e pagar quotas!  
«No Douro submetido a regras de gestão que resistem há 70 anos era preciso fazer mudanças e acompanhar o sinal dos tempos – até para reequilibrar a lamentável distribuição da riqueza gerada no Douro» «(…) na mais rica região agrária do país (…)»! Sinal dos tempos? Qual é o sinal MC? O velho liberalismo? O que havia antes daqueles 70 anos? O novo liberalismo, o dito neoliberalismo, presente nas políticas que destruíram a Casa do Douro? Nós sabemos qual é o sinal, a solução pretendida: a expulsão da produção de vinho dos milhares de pequenos viticultores da região, através de um resgate da sua produção e direitos, transferindo-a e concentrando-a nos maiores produtores, com a ajuda de uma possível indeminização suportada por dinheiros públicos. E até o fim do Benefício. É o que advogam alguns exportadores e um Estudo coordenado pela UTAD. Assim se quer acelerar o processo de expulsão dos pequenos viticultores e concentração da área das explorações realizada pelo mercado.
Nada de novo no país. É o que há 30 anos acontece como resultado da PAC e da política agrícola nacional. Aconteceu com as quotas leiteiras. Mas tal não produziu qualquer reequilíbrio na «distribuição da riqueza» dessas regiões. Agravou-a! Para lá de muitos outros e dramáticos problemas como a desertificação humana e os incêndios florestais. Mas são as «mudanças» que MC pretende, mesmo que desta vez, estranhamente, não as tenha enunciado!    
Nota: todas as citações em itálico são do referido Editorial de Manuel Carvalho.

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