Intervenção no Congresso de
Agostinho Lopes, do Comité Central do PCP
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1. A política de direita dos governos PS, PSD e CDS conduziu o País a um desastre. O Covid só o agigantou. E tornou-se um revelador eficaz das suas causas. Permitiu imprimir fotografias de grande nitidez das múltiplas dimensões do desastre. E uma identificação perfeita dos seus obreiros: PS, PSD e CDS. Mas que teve o apoio dos que hoje navegam outras águas na direita, o que é da natureza dos ratos quando o naufrágio é eminente... Que teve o apoio dos que ontem eram esquerdistas, radicais pequenos burgueses de fachada socialista de muitas estirpes, e depois transitaram para a direita, onde hoje mergulham, sempre, sempre, anticomunistas.
No desastre do País medra a angústia, o desespero, a fadiga, a raiva, os becos sem saída. A emigração como solução. Medra o oportunismo de um capitalismo periférico, consolidado pela política de direita, subsidiodependente e dependente do Estado, avesso ao risco, fugindo ao fisco – ver operação Furacão e sedes fiscais na Holanda – amigo da precariedade e dos baixos salários, salários sempre responsabilizados pelas baixas produtividades.
E temos défices, dívidas e dependências estruturais, e parece que quanto mais juros pagamos, quanto mais cortamos ao défice, quanto mais poupamos no investimento público, mais os buracos se afundam, mais o rendimento nacional se esvai em dividendos que emigram, em capitais que se evadem para paraísos fiscais, em corrupções sem fim. Temos autoestradas (uma das melhores coberturas da Europa), não temos transportes. Temos ciclovias e ecopistas a cavalo da destruição de centenas de quilómetros de via férrea. Temos muito capital estrangeiro para comprar empresas e sectores estratégicos, não para investir em novos activos. Temos muitos bancos de nome português, mas que são espanhóis. Temos grandes grupos económicos que se endividam para pagar dividendos acima dos lucros, compensando accionistas acima das suas possibilidades. Temos um SNS ratado pelo negócio da saúde. Temos universidades e escolas que formam profissionais de excelência, para os exportarmos para os países ricos da UE. Temos altas produtividades nas multinacionais mas somos campeões dos baixos salários. E sempre que se fala em subir o SMN há alguém que puxa da pistola... Temos muita electricidade de origem renovável, da água dos rios, do vento e do sol ao preço da chuva, e pagamos das mais elevadas facturas energéticas. Temos muitos órgãos de informação, não sei quantos canais televisivos, mas não temos informação. Temos desinformação, manipulação e notícias falsas. E quando se trata do PCP temos de juntar a ocultação (por exemplo, a RTP 1 no Telejornal de 24NOV20/OE 2021 ocultou a aprovação nesse dia, da proposta do PCP de reforço do SNS, enquanto noticiava propostas de outros partidos). Temos terra agrícola e água mas o País registou em 2018/19 a mais baixa área de cereais semeada nos últimos cem anos! Temos floresta de eucaliptos, pinheiros e autóctones mas é para arder. E quando não arde é para arrasar para plantar eólicas e fotovoltaicas. Temos reguladores e até uma Autoridade da Concorrência e florescem os cartéis, as rendas e os abusos de posições dominantes e de dependência económica. Mesmo quando temos dinheiro na Tesouraria Pública, não é certo que o Estado pague a quem deve atempadamente, porque o défice orçamental é quem manda fechar ou abrir a caixa registadora. Temos, dizem, a solidariedade europeia, mas os seus órgãos atanazam os nossos orçamentos porque eles aprovam aumentos de 10 euros às pensões de trezentos euros!
Poderia, com Gedeão dizer: como Filipe II temos tudo, tudo, tudo, só ainda não temos o fecho-ecler para fechar o País às políticas de direita... Mas temos. Temos a intervenção do PCP e a luta do nosso povo.
2. Na resposta ao desastre, com variantes, uma solução é dominante nos media. O tiro ao alvo sobre o regime democrático de Abril, para não mexer na política de direita. A ruptura – com Abril,, não a ruptura com a política de direita. Em particular, alterações do sistema eleitoral e da estrutura e equilíbrio dos seus órgãos de soberania.
No pântano do desastre emergem – nunca morreram – as soluções políticas da extrema-direita, para agravar a exploração por um capitalismo dito liberal. A solução política para o desastre, segundo essa gente, é a demolição da Constituição, da liberdade e da democracia. Reduzir os deputados a deputados nenhuns. Substituir a República de Abril por uma II república corporativa.
O outro caminho político é assegurar a continuidade de uma política de direita reformada. Suportada por um recauchutado bloco central capaz de a «modernizar», através de umas ditas reformas estruturais, com algum serôdio liberalismo à mistura. Sem descurar reformas do sistema político, como a redução do n.º de deputados.
Uma política de direita, depois de uma lavagem adequada graças à economia digital e à transição energética como sabão e o chuveiro ideológico e de diversão das centrais de propaganda e pensamento estratégico do capital. De Davos com o capitalismo reformado dos stakeholders, de Bildeberg, por cá disfarçados de modestos pensadores dos Encontros de Cascais. Está tudo no Expresso.