1720 – ANO DA PRIMEIRA BOLHA FINANCEIRA

A frase é conhecida: os que não aprendem as lições da História estão condenados a repeti-la. Assim, repetem-se no século XXI as escroquerias do século XVIII...

Ora, nem tudo é exatamente igual e também sem vantagem para os atuais “economistas vulgares” (na terminologia de Marx). Resta saber quem são os “condenados”. Vejamos então o que se passou.

Em 1715, morre Luís XIV, um criminoso a quem os “historiadores vulgares” concederam o título de rei-sol, deixando por detrás das fachadas de Versalhes um país no descalabro social e financeiro. Guerras desastrosas, perseguições maciças no interior, luxo descontrolado e ridículo de uma corte parasitária. Nada que, com as devidas diferenças, o atual imperialismo não esteja a fazer…

O seu sobrinho, Filipe de Orleães torna-se então regente (o futuro Luís XV tinha 5 anos). Filipe não era má pessoa, porém a sua vida pessoal pode resumir-se ao epitáfio que uns pândegos colocaram no túmulo da princesa sua mãe: “aqui jaz a ociosidade, mãe de todos os vícios”. Podemos acrescentar: “privados”.

Politicamente, foi um homem tanto quanto possível honesto, face às circunstâncias. Procurou entregar ao jovem herdeiro da coroa uma França pacificada e com as finanças saneadas.

Com este último objetivo aparece em cena um economista escocês John Law, fugido de Inglaterra onde estava condenado à forca por ter morto em duelo um seu amigo. Filipe concede a Law autorização em 1716 para fundar um banco que se torna em 1717 no Banco Real do Estado que agrupa a Companhia das Índias Ocidentais e Orientais, recebe os rendimentos do tabaco e dos impostos, emite ações.

Rapidamente se inicia a sedução do público com publicidade enganosa e a promessa de elevados dividendos. Gera-se então uma onda especulativa: as ações são transacionadas por valores muito superiores ao custo atingindo 36 vezes o valor nominal.

O que se passa é que à semelhança de situações mais e menos recentes a famosa lei da oferta e procura funciona ao contrário do que é ensinado e divulgado: aumentando a procura aumenta de facto o preço da oferta, porém a procura não desce continuando a aumentar, subindo mais uma vez o preço da oferta e assim sucessivamente.

Filipe cioso de dinheiro para o tesouro nacional não limita a emissão de títulos. Quando se verifica que não havia disponibilidade para resgates e que os dividendos eram insignificantes (menos de 1% do valor nominal) deu-se o colapso. O preço da oferta reduz-se e a procura também, o valor dos títulos aproxima-se do zero!

Até aqui as semelhanças são evidentes com as atuais bolhas financeiras. Tornam-se depois muito diferentes e sem honra para este século XXI…

Law foge para não ser linchado pela gente em fúria; morre em Veneza ostracizado. Hoje a justiça protege os causadores da especulação fraudulenta; a polícia espanca e prende os que se manifestam contra as suas ações (caso por exemplo dos “Ocupy Wall Street); atuam camuflados nos “mercados”, agindo com a férula das suas agências de “rating”, põem governos e instituições internacionais ao seu serviço, tal como universidades e comunicação social controlada.

As manipulações de Law conseguiram que o Estado francês praticamente saneasse as suas finanças à custa dos mais ricos. Hoje os artifícios de Law são adulados como espírito de iniciativa e gestão hábil. Os impostos e austeridades recaem sobre os mais pobres e classes médias empobrecidas. Os Estados têm de pagar as fraudes e a jogatana da finança especuladora.

Trichet, o mais paradigmático exemplo do grau zero do pensamento em termos de economia real dizia que “seria um grave erro tributar o capital”. Erro? De que ponto de vista? Do ponto de vista dos "direitos humanos" do capital se sobreporem aos das pessoas?

Historiadores houve que o classificaram John Law de “aventureiro”; outros como o “pioneiro do sistema bancário atual”. Temos de dar razão a ambos!