A ladainha neoliberal reza assim: “O peso do Estado é em Portugal excessivo, a carga fiscal excessiva. O Estado asfixia a economia privada consumindo demasiados recursos. Por isso o país não pode crescer nem desenvolver-se”. O peso do Estado em percentagem do PIB seria, pois, demasiado elevado para o nosso país. Dado este mote, os comentadores do costume fazem na praça pública o “responsório”.
Por consequência, há que reduzir o “peso do Estado”. Verdadeiro? Falso? Nem uma coisa nem outra: é um primarismo. É como querer tratar de um membro ferido procedendo á sua amputação, como era comum ainda no século XIX. Vejamos porquê na tabela seguinte: (2)
Países | Despesa Publica % PIB | Crescimento entre 2001 e 2010 | Défice Público % PIB | Despesa pública por habitante (€) |
Dinamarca | 59,5 | 5,9 | 0 | 30.148,75 |
França | 56,0 | 9,9 | -5,1 | 15.788,60 |
Finlândia * | 56,0 | 17,6 | 0,2 | 17.962,73 |
Suécia | 54,9 | 21,0 | 1,4 | 20.713,42 |
Bélgica | 54,2 | 13,8 | -2,8 | 16.552,40 |
Grécia | 53,2 | 18,5 | -8,23 | 8.360,03 |
Áustria | 52,3 | 15,6 | -3,7 | 16.772,07 |
Itália | 51,9 | 2,1 | -3,8 | 12.160,13 |
Reino Unido * | 51,6 | 14,1 | -8,17 | 12.734,02 |
Holanda * | 51,4 | 12,4 | -2,9 | 17.213,76 |
Irlanda | 48,9 | 20,9 | 30,21 | 14.582,83 |
Portugal | 47,9 | 4,8 | -8,81 | 6.673,53 |
Alemanha * | 47,5 | 8,1 | -2,23 | 14.481,86 |
Espanha | 45,8 | 18,4 | -7 | 9.353,81 |
* - Países com a classificação AAA mantida recentemente pela S & P
Podemos verificar:
- Portugal é dos países cujo peso do Estado é dos mais baixos neste grupo da UE.
- A despesa pública por habitante em Portugal é de longe a mais baixa
- Portugal é o segundo país com menor crescimento ao longo da década
- Países com elevada despesa pública tiveram melhor ou muito melhor desempenho económico.
-Países como a Alemanha não têm uma despesa pública em termos de percentagem do PIB muito diferente da de Portugal.
- Não se verifica uma relação entre o volume de despesa pública e o respetivo défice e, como se vê, os “mercados” não se preocupam muito isso.
O que podemos concluir? Na realidade, apenas que as afirmações que suportam as políticas de direita não têm qualquer sentido. A questão pode resumir-se a isto: não é o volume da despesa pública que conta é a qualidade da mesma.
As alegações, contra o “peso do Estado” que comandam as políticas de direita caiem, pois, no domínio da superstição. Uma superstição consiste em atribuir a certas práticas uma espécie de poder mágico, uma eficácia sem razão. Superstição é uma crença sem fundamento em efeitos mágicos de determinadas ações ou rituais. Assim a crença no poder regulador do mercado livre ou a crença nos efeitos negativos do peso do Estado na economia, não passam de superstições. Porém, como diz quem sabe, a superstição tem a particularidade de não ser anulada pela experiência…
Note-se que o grande capital financeiro e monopolista, não tem como objectivo enfraquecer o Estado como instrumento de intervenção, mas sim de o colocar cada vez mais e por completo ao seu serviço, como, por exemplo, fazer uma distribuição fiscal activa retirando aos pobres e classes médias para financiar as prendas fiscais dadas à banca e aos grandes grupos económicos. (3)
A designação “peso do Estado” já de si é manipuladora e preconceituosa. Não se fala no peso da finança especuladora, nem no peso de monopólios e oligopólios na economia e das rendas que obtêm do Estado, nem no peso da saída de capitais e rendimentos do país. Nem a “insustentável leveza” com que os grandes grupos económicos, monopólios e oligopólios, deixam o país transferindo as suas sedes para o exterior pagando não aqui os impostos devidos embora a sua riqueza seja cá criada! Só o Estado é que é pesado! Temos de defender os interesses dos nossos acionistas – dizem – ou seja, deles próprios! Quanto aos interesses do país, que importa isso?
As criticas que os comentadores de serviço por vezes fazem ao governo ou à UE por não haver medidas que promovam o crescimento, vindas de quem sempre defendeu as políticas neoliberais que nos são impostas e passa o tempo atacar o “peso do Estado”, tornam-se no mínimo votos piedosos, para não dizer ridículos ou hipócritas.
(o texto completo pode ser visto em www.resistir.info)
1 – Fonte Ameco, para 2010. O crescimento indicado refere-se ao PIB a preços constantes entre 2001 e 2010.
Não incluímos os países do leste da Europa dado que a análise do seu desempenho económico e social necessitaria de uma abordagem específica, que porém não alteraria no essencial o que dizemos.
2 – São exemplos: as PPP, os fundos de pensões transferidos para o Estado, os 12 mil milhões de “ajuda”para entregar à banca a serem pagos com a “austeridade” e “rigor”, as isenções e benefícios fiscais, etc., etc.
1 comentário:
Falta o sinal de - no défice da Irlanda, certo?
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