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7 de fevereiro de 2022

O caso Rússia-Ucrânia: os três cenários

 Ivan Timofeev (do clube Valdai) apresenta três cenários possíveis para o confronto EUA/NATO – Rússia: Cenário 1 – Guerra; Cenário 2 - Tensão permanente; Cenário 3 - Sorria e acene. Trata-se de uma avaliação correta do possível desenvolvimento, embora se limite a avaliar de forma isolada um confronto EUA/Rússia e mesmo no cenário 3 a Rússia desligar-se de um eventual confronto entre os EUA e a China. Algo que está em contradição com compromissos assumidos pelos presidentes dos dois países e manobras militares conjuntas.

O cenário 1 parece improvável, embora não possa ser posto de parte devido à insanidade que o imperialismo dá provas. A sua abordagem deve ter em conta o atual mundo multipolar: a agressividade imperialista, ganância e crise permanente cavaram drásticas divisões no mundo.

O cenário 2 não muda radicalmente a situação. As relações entre a Rússia e o Ocidente permanecem dominadas pela rivalidade, mas não cruzam linhas vermelhas. Pode ser apenas uma fase transitória para qualquer das outros cenários.

O cenário 3 corresponde a um progressivo desinteresse dos EUA pela Ucrânia e voltarem-se para o confronto com a China. Diz Ivan Timofeev: “a Ucrânia é um ativo tóxico para o Ocidente. A ajuda em grande escala é roubada e as instituições são corruptas. O país não é fornecedor, mas consumidor de segurança. Sua adesão à NATO é contraproducente: a Ucrânia é uma fonte de inúmeros problemas, fazendo da NATO uma estrutura ainda mais desequilibrada. Enquanto permanecer na esfera ocidental, a Ucrânia está condenada a uma maior degradação. Haverá uma uma saída de cidadãos para o Ocidente e uma economia em estado primário. (...) O regime político ucraniano é instável. Um trabalho competente e de longo prazo permitirá a Moscovo influenciar a sociedade ucraniana, oferecendo oportunidades humanitárias como mercado de trabalho e sistema educacional. A rivalidade entre os EUA e a China provavelmente definirá o ritmo da política global nas próximas décadas.”

Os países da NATO procedem como se estivessem no século XIX a tomar decisões na Conferência de Berlim, auto proclamando-se a “comunidade internacional” e considerando adversários, mesmo inimigos, países que não sigam as regras que definem segundo os seus interesses. Reconstituir a miragem do poder global choca-se com a férrea determinação de países como a Rússia, China, Irão, RPDC, Síria, entre outros na América Latina, Médio Oriente, Ásia Central. Em qualquer dos cenários esta componente tem de ser considerada, já que se estabeleceu o sentimento que a queda de um representa um perigo ou mesmo a queda dos restantes.

Os objetivos de expansão do imperialismo através das “revoluções coloridas” – meros esquemas de conspiração e golpes de Estado apoiados com dólares - têm falhado sucessivamente na Venezuela, Bielorrússia, Cazaquistão. Já lá vai o tempo em que na NATO se garantia que o presidente sírio seria derrubado dentro de seis meses. Passaram seis anos e derrotados estão os terroristas que financiavam. Esta série de impasses encontra pela frente dois inimigos a Rússia e a China, o que um realiza na componente militar o outro efetua na componente económica. Os EUA praticamente limitam-se a construir bases militares e financiar os seus agentes, a China estabelece relações comerciais e vai desligando-se do dólar.

Os objetivos de expansão dos mercados que a própria dinâmica do capitalismo necessita têm, pois, sucessivamente falhado, agravando a situação de crise e a queda da taxa de lucro. Nestes casos extremos o capital imperialista recorre à guerra.

Como escreveu o grão-mestre da mentira compulsiva, Goebbels, em 24/5/1941: “A R... (Rússia) deve ser dividida nos seus componentes. Não se pode tolerar a existência a Oriente de um Estado tão vasto.”  Era este o roteiro previsto para a Rússia assegurando o domínio neoliberal das transnacionais. Mas a Rússia não seguiu o roteiro da desintegração e ressurgiu como potência militar e mesmo económica, das cinzas da “democracia liberal” – miséria, corrupção, degradação económica, crime organizado. Todas as tentativas de estabelecer um diálogo paritário e construtivo como os “parceiros” ocidentais, EUA/NATO, foram frustrados. (ver Dimitri Rogozin aqui e aqui)

O golpe de Estado da Ucrânia (classificado pelos media ocidentais como pró-democracia e anti-corrupção) foi o passo seguinte usando o elo mais fraco e servindo-se da escumalha neonazi (recordem-se os crimes cometidos na zona oriental do país).

Face a isto as zonas de maioria russa desligaram-se de Kiev e a Crimeia num referendo com cerca de 90% de “sim”, aderiu à Rússia. O referendo no Kosovo, que a retirou da Sévia, entregando-a bandos ligados ao crime organizado, permitindo aos EUA instalar a sua maior base no Mediterrâneo, foi considerado válido. Quanto à Crimeia os media nem falam no referendo, o assunto é tratado como agressão à Ucrânia. De facto, para o “ocidente” o verdadeiro crime foi terem impedido os EUA/NATO de se instalarem em Sebastopol dominando o Mar Negro. Eis portanto o pano de fundo onde decorre o enredo atual com os seus três cenários.

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