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28 de abril de 2017

Passar pelos intervalos da Chuva


Notas sobre o Cenário Macroeconómico do Programa de Estabilidade 2017/2021
  1. Uma nota prévia para referir que qualquer cenário macroeconómico plurianual, dadas as enormes incertezas na evolução do enquadramento internacional e a sua repercussão na realidade nacional, tem a sua importância concentrada nas previsões para o corrente ano e para o ano seguinte, enquanto as previsões para os restantes anos são meramente indicativas.
  2. Neste seu cenário macroeconómico o Governo começa por rever a sua última previsão de crescimento do PIB em 2017, previsão esta apresentada com OE/2017, de 1,5% para 1,8%. Curiosamente esta era a previsão que há um ano atrás o Governo avançava para 2017.
  3. Para esta subida na evolução do PIB em 2017, o Governo estima uma melhoria na previsão do crescimento do consumo privado (de 1,5% no OE/2017 para 1,6%), uma menor queda no consumo público (de - 1,2% para -1,0%), uma considerável melhoria na evolução do investimento de 3,1% para 4,8%, uma melhoria na evolução das exportações (de 4,2% para 4,5%) e um pior comportamento das importações de 3,6% para 4,1%.
  4. Resulta do que atrás foi referido que o contributo da procura interna é bem mais positivo neste cenário macroeconómico do que com o OE/2017, passa de 1,2% para 1,7%. Dentro da procura interna os maiores contributos para a evolução favorável do PIB virão de acordo com o Governo, do investimento.
  5. Neste cenário macroeconómico agora apresentado pelo Governo, para os anos seguintes 2018 a 2021, continua a apostar-se num crescimento contínuo do PIB de mais 0,1 pontos percentuais por ano, continua a apostar-se num crescimento do investimento de 5,1% em 2018 e 2019, de 4,8% em 2020 e de 4,7% em 2021, num crescimento do consumo privado de 1,6% ao ano e por uma quase contínua melhoria do consumo público.
  6. Para a previsão de um crescimento sustentado das exportações o governo conta com um crescimento considerável da procura externa de bens dirigida à nossa economia. Em 2017 prevê-se um crescimento desta de 3,9%, enquanto para os anos seguintes se aposta num contínuo crescimento de 4,1%. O preço do barril de petróleo brent prevê-se que permaneça em torno dos 55 e 56 dólares (não será demasiado optimismo??).
  7. Quanto `a inflação se em 2016 ela se situou nos 0,6%, nos anos seguintes estima-se que ela suba para valores em torno dos 1,6% em 2017 e 1,8% em 2021. Já o deflator do PIB esse permanecerá entre os 1,4% em 2017 e os 1,6% em 2021.
  8. Quanto ao mercado de trabalho, o Governo estima para 2017, uma taxa de desemprego de 9,9%, enquanto no OE/2017 se ficava pelos 10,3% (bem mais optimista agora). Estima-se uma taxa de variação do emprego de 1,3% em 2017 (uma criação líquida de cerca de 60 mil postos de trabalho), para nos anos seguintes esse crescimento ser de cerca de 1% ao ano (uma criação líquida de cerca de 47 mil postos de trabalho ao ano). Na actual previsão do Governo de evolução da taxa de desemprego, esta continuará a cair ao longo dos próximos anos, para em 2021 se situar nos 7,4%. De acordo com estas previsões do Governo a criação líquida de emprego que se irá verificar nos próximos anos vira do sector privado, já que no sector público a criação líquida de emprego será nula, ou seja, o emprego criado não ultrapassará as saídas de funcionários públicos do mercado de trabalho. Já taxa de variação das remunerações nominais será no próximo de cerca de 3,4%, o que aliado a uma inflação em torno dos 1,6%, significará uma melhoria no salário real em torno dos 1,8%.
  9. Prevê-se que a Balança de Bens permaneça deficitária ao longo dos próximos anos, em torno dos -4,4% do PIB, enquanto a Balança Corrente permanecerá superavitária em torno dos 0,6% a 0,7% do PIB. Para que isto aconteça naturalmente a Balança de Serviços continuará a ser altamente superavitária em torno dos 6% ao ano, graças à Balança de Turismo.
  10. O saldo orçamental global (déficite orçamental) que em 2016 se situou em torno dos -3800 milhões de euros, -2,0% do PIB, prevê o governo que em 2021 seja de 0,3% do PIB (superavite orçamental).
  11. A dívida pública por sua vez que em 2016 se situou nos 130,4% do PIB segundo as previsões deste cenário macroeconómico será em 2021 de 111,0% do PIB. Ao mesmo tempo, enquanto em 2016 se pagaram cerca de 7836 milhões de euros com juros da dívida pública, em 2021 esse montante será de 7910 milhões de euros.
  12. Com este cenário macroeconómico em 2021 a nossa economia atingiria um nível bem superior ao actual, com um crescimento médio anual real nestes cinco anos de 2%. O investimento total cresceria a uma taxa média anual real de aproximadamente 5%, com o investimento público a crescer a um ritmo anual real de cerca de 8%.  
  13. Quanto ao investimento apesar do ritmo de crescimento previsto é importante referir que, dadas as fortes quebras registadas nos últimos anos, as quais fizeram com que desde 2012 o investimento total anual fosse insuficiente para compensar o consumo anual de investimento, a este ritmo de crescimento só em 2020 o investimento anual volta a superar o desgaste anual de investimento. Seria por isso importante conseguir-se um ainda maior ritmo de crescimento do investimento para que esta situação fosse superada mais cedo.    (ver gráfico em anexo).
  14. Numa síntese final diria que, se é verdade que é bem possível que no corrente ano a nossa economia possa até crescer a um ritmo superior a 1,8% (o núcleo de conjuntura da Universidade Católica avança hoje com a previsão de um crescimento do PIB em 2017 de 2,4%), o cenário macroeconómico apresentado com o PE 2017-2021, é um cenário muito optimista e até mesmo irrealista já que sem romper com os constrangimentos impostos pelo Pacto de Estabilidade e pela União Económica e Monetária, o país chegaria a 2021 e teria resolvido o problema do défice orçamental e teria começado a reduzir de forma consistente a sua dívida pública, coisa em que não acreditamos.
O irrealismo deste cenário do meu ponto de vista reside no facto de se considerar que será possível ao nosso país crescer desta forma, sem medidas de política económica que protejam a produção nacional, apostem no nosso aparelho produtivo e que incentivem a substituição de importações por produção nacional (a saída do euro será para isso uma decisão incontornável), sem que a nossa Balança Corrente volte a entrar em desequilíbrio com o crescimento das importações a superar fortemente o crescimento das exportações. Não por acaso as mais recentes projecções do Banco de Portugal para 2017, 2018 e 2019, (são de Março passado) ao contrário do Governo colocam as importações a crescer a um ritmo superior ao das exportações.
Com este cenário macroeconómico de médio prazo o Governo continua a apostar em conseguir passar pelos intervalos da chuva!

CAE, 13 de Abril de 2017

José Alberto Lourenço

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