Thierry Messey R . Voltaire
Desde 1954, una centena de eminentes personalidades da Europa Ocidental e da América do Norte reúnem-se anualmente – à porta fechada e sob condições de rigorosa segurança – no seio do Grupo de Bilderberg. A reunião dura 3 dias e nada se publica sobre os temas tratados.
Depois do desaparecimento da União Soviética, alguns periodistas começaram a interessar-se pelo Grupo de Bilderberg. Vários autores viram nele o embrião de um governo mundial e das principais decisões políticas, culturais, económicas e militares da segunda metade do século XX, uma interpretação que Fidel Castro retomou. Nada permite, no entanto, confirmá-la ou desmenti-la (ver artigo a respeito sobre a Nova Ordem Mundial para ter uma ideia do que isto implica).
Com desejo de perceber o que realmente é, e o que não é o Grupo de Bilderberg, dei-me ao trabalho de buscar documentos e testemunhos. Tive acesso a todos os seus arquivos correspondentes ao período que vai desde 1954 até 1966 e a muitos documentos posteriores e pude conversar com um dos seus antigos convidados, que conheço de há muito tempo. Nenhum jornalista, nem mesmo os bem-sucedidos autores que popularizaram os actuais clichés, tiveram acesso a tantos documentos internos do Grupo de Bilberberg.
Eis aqui o que consegui descobrir e compreender.
A primeira reunião
Setenta personalidades provenientes de 12 países participam em 1954 na primeira reunião do Grupo, um seminário de 3 dias, de 29 a 31 de maio, que se desenrola perto de Arnhem, nos Países Baixos. Os convidados repartem-se entre dois hotéis vizinhos mas os debates desenvolvem-se no estabelecimento principal por cujo nome se conhecerá o Grupo.
Os convites, feitos em papel timbrado do Palácio de Soestdijk [Uma das quatro residências oficiais da família real dos Países Baixos. Nota do Tradutor.], apresentam termos bastante vagos: «Prezaria muitíssimo a sua presença no congresso internacional, sem carácter oficial, que terá lugar nos Países Baixos em fins do mês de maio. Este congresso visa apreciar um certo número de questões de grande importância para a civilização ocidental e tem como objetivo estimular a goodwill [em português, “boa vontade”] e o entendimento recíprocos graças ao livre intercâmbio de puntos de vista». Os convites têm a assinatura do príncipe consorte dos Países Baixos, Bernhard zur Lippe-Biesterfeld, e vêm junto com várias páginas informativas de índole administrativa sobre o transporte e o alojamento. O máximo que permitem perceber é que haverá delegados dos Estados Unidos e de 11 Estados de Europa Ocidental e que se realizarão 6 sessões de trabalho de 3 horas cada.
Dado o passado nazi do príncipe Bernhard, que foi membro da cavalaria SS até ao seu matrimónio, em 1937, com a princesa Juliana, e o contexto do mccarthysmo daquela época, resulta evidente que as «questões de grande importância para a civilização ocidental» têm que ver com a luta contra el comunismo.
No próprio lugar do encontro, os dois presidentes da reunião – o empresário norte-americano John S. Coleman e o ministro cessante de Relações Exteriores, (Negócios Estrangeiros), da Bélgica Paul van Zeeland – atenuam a dúvida dos convidados. Coleman é um militante do livre mercado enquanto que o ministro Van Zeeland é um partidário da Comunidade Europeia de Defesa (CED) [1]. Finalmente, os participantes verão, num extremo da tribuna, Joseph Retinger, a eminência parda dos britânicos. Tudo parece, pois, indicar que as monarquias holandesa e britânica apadrinharam a realização da reunião em apoio à Comunidade Europeia de Defesa e ao modelo económico de capitalismo de mercado livre por oposição ao antiamericanismo que promovem comunistas e gaulistas.
As aparências, no entanto, são enganadoras. Não se trata de fazer campanha a favor da CED, mas sim de mobilizar as elites a favor da guerra fria.
A personalidade escolhida para convocar os convidados foi Sua Alteza Real o príncipe Bernhard , porque a sua condição de príncipe consorte lhe outorga um carácter de estado, sem ser no entanto oficial. Por detrás dele esconde-se o verdadeiro promotor do encontro: uma organização intergovernamental interessada em manipular os governos de alguns dos Estados que a compõem.
Naquela altura, John S. Coleman ainda não se tinha convertido em presidente da Câmara de Comércio dos Estados Unidos, mas acaba de criar o Comité de Cidadãos por uma Política Nacional de Comércio (Citizen’s Committee for a National Trade Policy, CCNTP). Afirma que a liberdade de comércio absoluta, ou seja a renúncia a todos os direitos de aduana, permitirá aos aliados dos Estados Unidos aumentar a sua própria riqueza e financiar a Comunidade Europeia de Defesa, leia-se empreender o rearmamento da Alemanha e integrar o seu potencial militar na OTAN.
Os documentos significativos em nosso poder demonstram, sem embargo, que o CCNTP a única coisa que tem de “cidadão” é o nome. Trata-se na realidade de uma iniciativa de Charles D. Jackson, conselheiro da Casa Branca encarregado da guerra psicológica. À cabeça da operação encontra-se William J.Donovan, o ex-chefe da OSS (o serviço de inteligência norte-americano criado durante a Segunda Guerra Mundial), agora encarregue de criar a divisão norte-americana do novo serviço secreto da OTAN, o Gládio [2].
Paul van Zeeland não era só o promotor da Comunidade Europeia de Defensa. É também um político com muita experiência. No fim da ocupação nazi presidiu à Liga Independente da Cooperação Europeia (LICE) que tinha como objetivo a criação de uma união aduaneira e monetária, organização que foi instaurada pelo já mencionado Joseph Retinger.
O próprio Retinger, que funciona como secretário no encontro de Bilderberg, serviu durante a guerra nos serviços secretos ingleses (SOE) do general Colin Gubbins. No Reino Unido, Retinger, um aventureiro polaco, foi conselheiro do governo de Sikorski no exílio. Em Londres, protagonizou o microcosmo dos governos criados no exílio, o qual lhe proporcionou múltiplos contactos na Europa libertada do fascismo.
O seu amigo Sir Gubbins abandonou oficialmente os serviços secretos britânicos e o SOE foi dissolvido. Dirige então uma pequena empresa de tapeçarias e produtos texteis que lhe serve de «cortina». Na realidade, Gubbins está encarregue da criação da divisão inglesa da Gládio. Depois de ter participado em todas as reuniões preparatórias do congresso de Bilderberg, está entre os convidados, sentado ao lado de Charles D. Jackson. Os participantes ignoram que são de facto os serviços secretos da OTAN que realmente dão origem ao encontro de Bilderberg. O príncipe Bernhard, Coleman e Van Zeeland servem de fachada.
Ainda que jornalistas imaginativos tenham acreditado achar no grupo de Bilderberg a vontade de criar um governo mundial oculto, este clube de personalidades influentes não é senão uma ferramenta de lobbing que a OTAN utiliza para promover os seus próprios interesses. Isto é muito mais sério e muito mais perigoso, já que é a OTAN a que ambiciona converter-se num governo mundial oculto capaz de perpetuar o status quo internacional e a influência dos Estados Unidos.
Além disso, nas reuniões seguintes a segurança do Grupo de Bilderberg não estará a cargo da polícia do país onde se organiza o encontro mas sim de soldados da OTAN.
Entre os 10 oradores inscritos destacam-se dois ex-primeiros-ministros – o francês Guy Mollet e o italiano Alcide de Gasperi –, três responsáveis do Plano Marshall, o falcão da guerra fria Paul H. Nitze e, sobretudo, um poderosíssimo financeiro, David Rockefeller.
Segundo os documentos preparatórios, uma vintena de participantes estão ao corrente do segredo. Conhecem mais ou menos em detalhe quem são os que realmente manejam o show e escreveram de antemão as suas intervenções. Até os menores detalhes estão previstos e não é deixado lugar à mínima improvisação. Por outro lado, os demais participantes, uns cinquenta, ignoram por completo o que se está tramando. Foram escolhidos para que exerçam a sua influência sobre os seus respectivos governos e sobre a opinião pública dos seus países respectivos. Assim, o seminário foi organizado para convencê-los e para levá-los a implicarem-se na propagação das mensagens que se querem divulgar.
Em vez de abordar os grandes problemas internacionais, as intervenções analisam a suposta estratégia ideológica dos soviéticos e explicam o método a seguir para contrariá-la no «mundo livre».
As primeiras intervenções avaliam o perigo comunista. Os «comunistas conscientes» são indivíduos que pretendem pôr a sua pátria ao serviço da União Soviética para impor ao mundo um sistema colectivista. E há que combatê-los. Mas trata-se de uma luta difícil já que estes «comunistas conscientes» estão disseminados por toda a Europa dentro de una massa de eleitores comunistas que nada sabem dos seus sinistros propósitos e que os seguem com a esperança de obter melhores condições sociais. La retórica endurece pouco a pouco. O «mundo livre» deve enfrentar o «complô comunista mundial», não só de forma geral mas dando também resposta a problemas concretos vinculados aos investimentos norte-americanos na Europa e à descolonização.
Finalmente, os oradores abordam o problema principal que, segundo afirmam eles, os soviéticos estão explorando em seu próprio benefício: por razões culturais e históricas, os responsáveis políticos do «mundo livre» empregam argumentos diferentes nos Estados Unidos e na Europa, argumentos que por vezes se contradizem. O caso mais emblemático é o das purgas que organiza o senador McCarthy nos Estados Unidos. Estas são indispensáveis para salvar a democracia, mas o método utilizado é visto na Europa como uma forma de totalitarismo.
A mensagem final é que não há negociação diplomática nem compromisso possível com os «Vermelhos». Há que impedir, custe o que custar, que os comunistas logrem desempenhar um papel na Europa Ocidental. Mas será necessário actuar com astúcia. Como não se podem prender e fuzilar, haverá que neutralizá-los com discrição, sem que os eleitores se deem conta. Ou seja, a ideologia que se desenvolve no encontro é a da OTAN e da Gládio. Nunca se dirá ali que se recorreria a fraude eleitoral nem que os indecisos seriam assassinados, mas todos os participantes admitiram que, para salvar o «mundo libre», havia que por as liberdades entre parêntesis.
Ainda que o projecto da Comunidade Europeia de Defesa (CED) fracasse 3 meses más tarde devido aos golpes que lhe assestaram tanto deputados comunistas como «nacionalistas extremistas», ou seja os gaulistas, o seu objetivo não era na realidade apoiar a criação da CED nem nenhuma outra medida política em particular mas sim divulgar uma ideologia no seio da classe dirigente e transmiti-la depois, através da dita classe, ao resto da sociedade. Objetivamente, los cidadãos da Europa Ocidental dispunham de cada vez mais informação sobre as liberdades que não tinham os habitantes da Europa Oriental, mas tinham cada vez menos consciência das liberdades que eles mesmos iam perdendo na Europa Ocidental.
O Grupo de Bilderberg converte-se numa organização
Um segundo congresso é organizado então em França, de 18 a 20 de março de 1955, na localidade de Barbizon.
Pouco a pouco vai impondo-se a ideia de que estes congressos vão realizar-se anualmente e que é necessário organizar um secretariado permanente. O príncipe Bernhard afasta-se logo que se evidencia a sua participação num caso de tráfico de influência – o escândalo Lockheed-Martin). Cede então a presidência ao ex-primeiro ministro britânico Alec Douglas Home (de 1977 a 1980). A presidência do Grupo de Bilderberg será ocupada posteriormente pelo ex-chanceler e presidente da RFA Walter Scheel (de 1981 a 1985), o ex-governador do Banco de Inglaterra Eric Roll (de 1986 a 1989), o ex-secretário general da OTAN Peter Carrington (de 1990 a 1998) e finalmente pelo ex-vice presidente da Comissão Europeia Étienne Davignon (desde 1999).
O presidente do Grupo de Bilderberg contou durante muito tempo com a ajuda de dois secretários gerais, um para Europa e Canadá – os Estados vassalos – e outro para Estados Unidos – e o monarca. Mas actualmente existe apenas um secretário, desde 1999.
De ano a ano, os debates tornam-se muito repetitivos. Por isso mudam-se os convidados. Há sempre um núcleo central que se encarrega de preparar o seminário de antemão e outros personagens que vêm pela primeira vez, e aos que se inculca a retórica atlantista do momento.
Os encontros anuais reúnem actualmente mais de 120 participantes, um terço dos quais são membros do núcleo. A aliança atlântica seleciona-os segundo a importância dos seus contactos e a sua capacidade de influência, independentemente das funções que exerçam na sociedade, e continuam a ser membros do núcleo central quando mudam de ocupação.
Vejamos a lista exacta do dito núcleo, incluindo os membros do Conselho de administração, que servem de vitrina para os convidados, e alguns dos membros que se mantêm menos visíveis para não assustar os novos.
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