"Temos de acabar com a ilusão do domínio militar dos EUA" - Kevin Martin e Brad Wolf

 Kevin Martin é presidente da Peace Action e Peace Action Education Fund, a maior organização de paz e desarmamento dos EUA, com cerca de 200 000 apoiantes. Brad Wolf, advogado, professor, reitor de universidade comunitária, é cofundador da Peace Action Network. Escutemos o que estes norte-americanos dizem procurando fazer-se entender pelos seus concidadãos. Também por cá, á semelhança do que dizem: "analistas militares são bem pagos", defendendo as guerras do "ocidente"...

"Os analistas militares dos Estados Unidos adoram estratégias e as teorias que as apoiam. As teorias fornecem o que parecem ser abordagens perfeitamente razoáveis e racionais para o combate, oferecendo até mesmo uma sensação de certeza sobre o resultado. Como todas as estratégias militares, soam suficientemente convincentes no papel, até mesmo atraentes. Que americano se afastaria desse domínio? Mas, no concreto, essas teorias falham e podemos muito provavelmente acabar num desastre.

A teoria do "Escalation Dominance" já falhou, dado que a Rússia invadiu a Ucrânia e deu um passo substancial na escalada, talvez com mais para vir. As teorias promovem a ideia de que a dissuasão efetiva vem da capacidade de derrotar o inimigo em cada etapa de um conflito potencial, em qualquer lugar e a qualquer momento, de escaramuças em pequena escala entre guerrilheiros por procuração até uma guerra nuclear, e possíveis escaladas dentro de um conflito específico. Essas estratégias, em teoria, impediriam qualquer adversário de iniciar qualquer passo na escalada militar.

Uma arrogância alimenta tais teorias, uma autoconfiança lamentavelmente equivocada e perigosa, para não mencionar um desprezo impressionante pelos milhões de vidas sacrificadas se tais teorias forem testadas e falharem. Jogar isso em computadores é uma coisa, coloca-las no mundo é outra. Ler a mente do inimigo uma vez que a escalada começou e mísseis estão no ar é fútil, mesmo suicida.

Alguns dizem que a Ucrânia não deveria ter abandonado o seu vasto arsenal nuclear quando a Guerra Fria terminou em troca de garantias de proteção do Ocidente. Aos olhos de alguns comentaristas, o presidente Zelensky assumiu que a Ucrânia poderia ter que desenvolver seu próprio programa de dissuasão nuclear. Putin respondeu rapidamente com ameaças de retaliação.

Enquanto isto, analistas militares mexem nas teorias e ajustam as mensagens à medida que os eventos mundiais continuam a perturbá-los. Esses analistas militares são bem pagos, muitas vezes pelo governo dos EUA, pelos fabricantes de armas e pelos grandes media, todos os que têm interesse em fazer guerra. Os think tanks militares são financiados com dólares dos contribuintes dos EUA, assim como os programas de pesquisa militar em universidades americanas por todo o país.

Gastamos dezenas de milhões de dólares em jogos de guerra de computador. Gastamos cerca de 1 milhão de milhões de dólares por ano financiando pessoal e equipamentos para uma guerra real. Onde estão os milhões pela paz?

É impossível pensar que o mesmo dinheiro, talento e recursos pudessem ser investidos na criação de uma estratégia para um novo arranjo de segurança na Europa que incluísse a Rússia? Após as atrocidades que Putin e seus militares infligiram à Ucrânia, é uma pílula amarga de engolir. Mas a alternativa é uma guerra por procuração prolongada com a Rússia, que sangra o povo ucraniano e russo (enquanto sangra as economias ocidentais), ou continuar a aumentar a escalada de guerra com armas mais mortais entregues e implantadas na Ucrânia.

Em ambos os casos, muitos mais morrem. E à medida que o nevoeiro da guerra se instala, a teoria da "Escalation Dominance" torna-se uma aposta na escalada. Em algum momento, os militares devem admitir que possuem apenas uma teoria. Dado o seu histórico, arriscar toda a humanidade nas suas teorias é um jogo para os que vivem no delírio.

Ao contrário das nossas promessas não cumpridas da década de 1990, realmente poderíamos integrar a economia russa nas economias ocidentais sem a perceção da ameaça da NATO. Seriam necessários compromissos, de ambos os lados, mas poderíamos lenta e gradualmente evoluir em direção à paz."