Jornalista
O QUE ANDO A LER E A VER
Daqui a doze dias comemoram-se os 44 anos da Revolução de 25 de abril de 1974.
Passado quase meio século, faz ainda sentido insistir nas diversas facetas da resistência à ditadura de Oliveira Salazar e Marcelo Caetano?
Como é que se explica, hoje, a um jovem de 18 ou 20 anos que, se tivesse nascido umas décadas antes, nesta altura estaria a lidar com os medos, as revoltas ou as indignações suscitadas pela necessidade de ter de abandonar a família, o trabalho, os estudos, para pegar em armas e ir combater numa guerra colonialista em África?
Nunca foi pacífico, entre a esquerda portuguesa, o modo como lidar com aquele dilema.
Os movimentos de extrema-esquerda defendiam abertamente a deserção, com consequente exílio.
Na área do PCP era incentivada a incorporação nas Forças Armadas, desde logo para que os militantes aprendessem a manejar armas e fizessem propaganda contra a guerra junto dos soldados.
As deserções eram aplaudidas e incentivadas, se efetuadas num contexto de movimento coletivo de abandono dos quartéis.
Foram milhares os que se viram forçados a abandonar o país e construir uma nova vida no exílio.
Por estarem contra a guerra.
Por terem uma atividade oposicionista.
Por defenderem o derrube do regime fascista.
Por terem uma atividade que os deixava rotulados como traidores à pátria.
As suas fotografias eram colocadas nos postos fronteiriços, como se de vulgares criminosos se tratasse.
Partiram para países de acolhimento tão diversificados como o Brasil, Bélgica, França, Suécia, URSS, Roménia, Marrocos, Argélia e outros.
Uns passaram a fronteira a salto, outros partiram em comboios vigiados ou em barcos improvisados, nos quais deixavam a vida em suspenso e dependente da linha ténue que separa a sorte do azar.
Viveram vidas duras, marcadas por enormes sacrifícios pessoais e familiares.
O exílio é uma marca, uma dor que fica para a vida, como se percebe em ?Memórias do Exílio?, o comovente livro de Ana Aranha, jornalista da Antena 1, e Carlos Ademar, mestre em História Contemporânea e professor na Escola da Polícia Judiciária.
Recolhem, no que foi primeiro um programa da Antena 1 aqui disponível, doze depoimentos de homens e mulheres um dia confrontados com a urgência e a necessidade absoluta de abandonarem o seu país.
São relatos atravessados por uma emoção na qual se roça a eminência da tragédia, o humor, o quase inverosímil, a coragem, a dor, o sofrimento, o questionamento pessoal, a divergência, o reposicionamento político e ideológico.
Ninguém sai incólume de um exílio forçado, como se percebe das palavras de, entre outros, Hélder Costa, Luísa Tito de Morais, Cláudio Torres, Manuel Pedroso Marques, Margarida Tengarrinha, Helena Cabeçadas, uma das mulheres mais jovens (aos 17 anos) a exilar-se por motivos políticos, ou Teresa Rita Lopes, que diz: ?o exílio é sempre dolorosíssimo.
Basta não poder vir ao seu país.
A privação dessa possibilidade já é terrível e sobretudo não saber quando é que isso viria a ser possível.
Até podia não ter sido possível na minha vida?.
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