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4 de maio de 2011

A arte da dissimulação

Dizia Bismarck que nunca se mente tanto como em vésperas de eleições, durante a guerra e depois da caça. Certamente este político e diplomata prussiano sabia do que falava. Não havia ainda no seu tempo Banco Mundial, senão teria acrescentado e se finge tanto como quando temos o FMI dentro de portas.

De facto, aqueles que deram o seu acordo à intervenção externa no país da troika EU/BCE/FMI, não só confirmam as premissas de tão célebre registo, como passaram a recorrer às mais rebuscadas artes do disfarce para iludir as suas responsabilidades e passar, neste tempo de eleições, incólumes em relação às consequências dessa intervenção nas condições de vida das pessoas.

Todos fingem que não há outra alternativa e que os programas de austeridade são inevitáveis. Dizem-no como se a reestruturação da divida não fosse uma real possibilidade e até apenas o anúncio dessa intenção não fosse um efectivo trunfo para forçar a outras soluções políticas na União Europeia e aliviar os contribuintes das consequências das medidas que agora se anunciam. Optou-se pela solução do costume, a penalização dos contribuintes.

E não se venha com a desculpa que tal solução fecharia o país no acesso ao mercado. Reestruturar não é recusar pagar. Por outro lado, todos fingem que andaram a negociar com a dita troika e que a sua principal preocupação foi minimizar as consequências das suas medidas brutais, mas já todos perceberam que a negociação é uma farsa, quem manda é a troika, porque aqueles que conduziram o país ao cadafalso, há muito ajoelharam perante os interesses do capital financeiro e o directório das grandes potências europeias.

Todos estão a apresentar os seus programas, mas todos sabem que só há um programa – o programa comum imposto pela intervenção externa. O programa que todos eles se vão disponibilizar para executar.

José Sócrates depois de ter dito que os portugueses ainda vão ter saudades do seu PEC IV, acaba de anunciar ao país que afinal será, no essencial, o seu doloroso pacote de austeridade que será o núcleo duro do programa da troika, transformado agora na melhor coisa do mundo, numa operação de escandalosa propaganda e mistificação.

O truque é muito velho. Primeiro constrói-se um cenário negro de medidas, muito acima das que se querem aplicar, a seguir baixa-se a exigência para criar um sentimento de alívio.

Não sabemos neste momento até aonde vão as medidas da troika em toda a sua dimensão, mas há coisa que sabemos que o PEC IV era mau e que continua a ser e que com toda esta encenação e muita mentira à mistura o que o governo estava a aplicar nos seus PEC I, II, III e IV, eram as medidas do FMI em pacotes trimestrais, numa operação de dissimulação sem precedentes que o povo e o país pagarão com língua de palmo.

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