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27 de agosto de 2018

Fim da Tragédia Grega ?



Paule de Grauwe
A Europa não tem razões para se orgulhar O programa resultou no colapso da economia grega e serviu para os bancos europeus escaparemT
Na ultima segunda feira a Crécia foi desligada da máquina que os seus credores 
lhe deram em 2010, quando a crise grega rebentou. O programa financeiro que foi posto em execução em 2010 e que deu apoio financeiro à Grécia chegou ao fim. A partir de agora o Governo grego tem de voltar aos mercados se precisar de fundos para a despesa pública. Os líderes europeus congratularam-se uns aos outros por esta vitória gloriosa. Donald Tusk, o presidente do Conselho Europeu, até invocou a “solidariedade europeia”, que tornou este grande êxito possível.
Mas terá a Europa razão para se orgulhar do programa financeiro que impôs à Grécia quando o país enfrentou a bancarrota em 2010? A resposta é, definitivamente, não.
Primeiro, é um erro chamar a este programa de “apoio financeiro à Grécia”. Por detrás destas palavras há uma narrativa confortável para o resto da Europa de que a Grécia estava à beira do colapso e que os países credores salvaram os gregos do desastre. Nada poderia estar mais longe da verdade. O objetivo do programa de assistência imposto à Grécia foi garantir que as exigências dos países credores seriam satisfeitas. Políticos dos países credores, como a Alemanha, a Bélgica, a Holanda e a Finlândia, temiam ter de reconhecer perdas nos empréstimos que tinham feito à Grécia. Tinham prometido aos seus contribuintes que a Grécia havia de pagar as suas dívidas. Qualquer perda nestes empréstimos significaria que os contribuintes alemães, franceses, belgas, etc., tinham sido enganados.
Assim, para garantir que a Grécia pagava estes empréstimos, estes países emprestaram mais dinheiro à Grécia. E, surpresa, surpresa, a Grécia pagou os empréstimos antigos com o dinheiro fresco emprestado pelos mesmos países. Nenhum destes empréstimos foi usado para apoiar a economia
grega. Foram dados para manter a exigência de os contribuintes nos países credores verem devolvido o seu dinheiro.
Para manter este princípio, a Grécia foi sujeita a condições que poucas nações soberanas na História tiveram de aceitar. Uma troika estrangeira pegou no leme da economia grega e sujeitou o país a medidas de austeridade que pela sua gravidade raramente foram aplica- das. O resultado foi o colapso da economia grega e a miséria para milhões de gregos.
Muitos defenderam que os gregos eram culpados da sua desgraça. Andaram numa espiral gastadora nos anos bons que antecederam a crise financeira e acumularam um nível de dívida insustentável. Não havia alternativa à redução da despesa e ao início de um pro- grama que reduzisse a dívida.
Devemos sublinhar aqui dois pontos. Primeiro, são precisos dois para dançar o tango. A dívida em que incorreram os gregos foi tornada possível pelos empréstimos concedi- dos pelos bancos do norte da zona euro. Se os gregos não viram que a sua dívida face aos banqueiros do norte era insustentável, também estes banqueiros não viram. Assim, a responsabilidade por este desastre foi partilhada. Os banqueiros emprestaram dinheiro a mais e os gregos pediram emprestado demais.
A diferença entre os banqueiros do norte e os gregos tem a ver em última instância com o poder. Os banqueiros sabiam que em último caso os seus governos sangrariam a Grécia até ela pagar a dívida para que os seus bancos pudessem sair da crise sem grandes danos.
Segundo, havia com certeza outras maneiras de lidar com a dívida grega do que a que foi feita nos sucessivos programas. Os programas de austeridade foram contraproducentes. Levaram a um declínio massivo do PIB de mais de 30% e reduziram a capacidade da Grécia de pagar a sua dívida. Em 2010, a dívida grega era de 150% do PIB; depois de oito anos de austeridade esta proporção aumentou para 180%. Um programa mais inteigente não teria imposto esta austeridade massiva. Além disso, a solidariedade europeia teria significado que os países credores aceitassem cancelar parte da dívida. Isto também teria feito refletir o facto de haver uma responsabilidade partilhada entre credores e devedores.
Ao contrário do que o presidente do Conselho Europeu proclamou, não houve solidariedade europeia. Houve apenas o desejo das nações credoras de proteger as suas exigências financeiras, em- bora fossem igualmente responsáveis pelo desastre, em conjunto com a Grécia. Além disso, verificou-se um desejo visceral dos governos dos países credores de castigar um país que se tinha portado mal.
É evidente que teremos novas crises financeiras no futuro, envolvendo credores que emprestam demais e devedores que pedem emprestado demais. Só podemos esperar que quando isso acontecer a Europa seja capaz de mostrar um bocadinho mais de solidariedade do que mostrou na tragédia grega.
Professor da Universidade Católica de Lovain

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