Agostinho Lopes
«A democracia ameaçada”, é o Editorial de Diogo Queiroz de Andrade (DQA) no Público de 31JUL18.
DQA agarra em recentes investigações do Parlamento Britânico sobre o papel (ao que parece decisivo) do Facebook, na «manipulação democrática» dos eleitores britânicos, com «milhares de acções» da Rússia, para «garantir que o Brexit se verificava». O que se soma a um anterior relatório da Universidade de Oxford que «confirmava que em 2017 se verificaram acções de manipulação política e desinformação através das redes sociais em 48 países». O que irá ser acrescentado pelas investigações de Robert Mueller nos EUA, que «devem (sublinhe-se este «devem») apontar para provas inequívocas da interferência russa nas eleições americanas.» Com o quadro «completo», DQA, conclui: «O Facebook é a máquina perfeita para a manipulação em larga escala». E é mais perigosa ainda, segundo DQA, porque é uma «dócil manipulação”.
Não se tratará agora, de questionar as certezas certas do editorialista – até já adivinha o que vai vir do trabalho de Robert Mueller - sobre a influência determinante do Facebook nos resultados de referendos e eleições, e o papel relevante nesta nova guerra fria, via redes sociais, da Rússia. Mas apenas pretexto para levantar interrogações.
DQA e outros jornalistas e comentadores e articulistas dos media portugueses (imprensa escrita, rádio, televisão) há décadas que determinam, conformam o pensamento dominante (e único), económico, político, ideológico e partidário (alguns diriam pensamento “mainstream”) tendo como referentes os quadros ideológicos neoliberais, a “ideologia comunitária”, isto é, a que tem suportado a integração capitalista europeia, ou a simples replicação de correntes mediáticas do imperialismo. O «Público» onde DQA escreve é um caso de estudo!
Quando será que DQA e os seus pares levantarão o problema da «manipulação democrática» dos eleitores portugueses pelos seus órgãos de comunicação social, no decurso da intensa vida democrática do país após o 25 de Abril, em sucessivas eleições e referendos? Quando baterão contritos no peito, face aos riscos que percepcionam no Facebook, da tentativa de configuração do poder político a um “arco de governação” PS, PSD, CDS, excluindo todos os outros partidos? Quando mostrarão verdadeiro e sentido arrependimento, pedindo desculpa aos portugueses, pela mentirola eleitoral, repetida vezes sem conta, da pretensa “eleição do 1º Ministro”? Quando farão alguma investigação, análise e reflexão, a que corresponderão editoriais, sobre o comportamento de uma comunicação social, que em geral, claramente marginaliza e descrimina pelo silêncio, ocultação e tantas vezes pela deturpação a intervenção e posicionamento de um partido como o PCP? Quando deixarão de achar estranho, que um partido, analisando os resultados eleitorais, se refira criticamente à influência negativa da comunicação social? Quando deixarão de cobrir com o manto diáfano da “independência” os agentes e actores mediáticos e políticos, de opções políticas, ideológicas e até partidárias bem assumidas (basta não estar no “activo”, isto é não desempenhar funções institucionais, para ganhar o adjectivo!), para falsificarem e manipularem o debate democrático, por ausência de efectivo contraditório, ou mesmo só, da possibilidade de contraposição e defesa de quem nunca está presente, por exclusão? Quando?
E esta não é a manipulação doce do Facebook, a que se refere DQA. É uma manipulação com artilharia pesada, por terra, ar e mar. E ao mesmo tempo, suprema contradição, não se vê nem se sente, e entra-nos todos os dias em casa, sem nos pedir licença. Com a agravante de que a pagamos.
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