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17 de agosto de 2021

O Afeganistão a ferro e fogo

Manuel Augusto Araujo . Blog Praça do Bocage

 O que os múltiplos comentadores de todos os media mercenários que se desdobram em declarações sobre a chegada intempestiva e rápida dos talibãs a Cabul, tomando de facto o poder, nunca referem que os talibãs são uma criação dos EUA que investiu uma verba multibilionária para os treinar, armar, equipar e subsidiar, dirigida por Zbigniew Brzezinski, conselheiro de segurança nacional de Jimmy Carter, com um currículo invejável ao serviço do imperialismo norte-americano, por exemplo foi dinamizador da Comissão Trilateral, trabalhou de 1966 a 1970 na embaixada norte-americana em Praga, etc.

Os talibãs que agora derrotaram fragorosamente o exército e o poder do Afeganistão, ali colocados há vinte anos pelos EUA e seus aliados da NATO são os mesmos que, com o forte apoio dos Estados-Unidos combateram o governo secular e democrático e os seus aliados soviéticos que concederam os mesmos direitos às mulheres e aos homens, que iniciaram uma reforma agrária para erradicar as plantações de papoilas, agora o negócio mais florescente daquele território quando o seu controle era partilhado pelos novos e pelos velhos aliados dos EUA.

Nada disto é referido por essa gente que agora parece muito surpreendida com a bagunça instalada. Muito menos referem que quando os soviéticos se retiraram do Afeganistão o exército afegão resistiu durante quatro anos e só sucumbiu quando Boris Ielstin cortou todo o apoio ao governo afegão abrindo caminho aos talibãs amigos dos EUA. Um cenário completamente inverso do actual, o que diz tudo ou quase tudo sobre o resultado de vinte anos de ocupação dos Estados-Unidos e Nato dos sucessivos afegãos de Bush, Obama, Trump e Biden que o governaram.

No Ocidente as declarações são como normalmente cínicas. Enchem a boca com os direitos humanos, em particular das mulheres e raparigas. Como se isso alguma vez lhes tivesse interessado e não houvessem responsabilidades do império norte-americano com a sombria ironia de esta luta final ser entre duas forças por eles apoiadas conforme os seus interesses geopolíticos. Nada disto será lido, ouvido ou visto nos media estipendiados como se a intervenção dos EUA no Afeganistão se resumisse aos últimos vinte anos, depois do 11 de Setembro. A manipulação e a hipocrisia não tem limites nem fronteiras.

Poucos referem que, com os talibãs no poder, chegam ao poder os pashunts, a maior tribo do universo, que foi artificialmente dividida entre o Paquistão e o Afeganistão pelo império britânico, useiro e vezeiro nesse corte e costura de fronteiras procurando acautelar os seus interesses futuros depois de ser obrigado a se retirar. Pode ser uma situação altamente explosiva, um catalisador de instabilidade numa região que nunca foi muito estável, basta olhar para as fronteiras do Afeganistão e os potenciais conflitos directos e indirectos que podm eclodir.

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