Agostinho Lopes
Um dia destes alguém se referiu aos «surtos de ridículo» dos novos nomes dos ministérios (e também dos novos sinais de trânsito) do Governo PS (1). O que se subscreve. Mas mais grave são as alterações do seu conteúdo orgânico, nomeadamente do Ministério da Agricultura e da tutela do território (2). Dizem que o desmantelamento do Ministério da Agricultura foi a forma encontrada para “despachar” o antigo titular. Grossa asneira para fazer o que devia ser feito por assumida e justificada decisão.
A “expulsão” da “floresta” para o Ministério do Ambiente e do “desenvolvimento rural” para o novo Ministério da Coesão Territorial são a assumpção oficial do que já se sabia: António Costa e o PS, de florestas em Portugal, percebem zero! O que ficou patente particularmente após os incêndios florestais de 2017. Nunca perceberam, ou talvez melhor, nunca quiseram perceber. Não houve, não há nem haverá, grupos de especialistas ou comissão de sábios que lhes possam explicar o que se recusam a ver, porque outros interesses e orientações os guiam. O que acaba de acontecer com a orgânica do Governo é apenas o culminar de uma política florestal desastrosa.
Não se percebeu nem se quer perceber a realidade agroflorestal do Norte e Centro do país, nem as causas profundas da desertificação económica e humana de vastas áreas do território. Não se quer assumir os resultados de políticas que esvaziaram o mundo rural e o interior de gentes e agricultura e que são responsáveis pelo lavrar regular de grandes incêndios florestais nas últimas décadas, que outros lavrares foram extintos. Não perceberam ainda que os mosaicos nos espaços rurais, intercalando espaços agricultados com espaços florestais, foram e são uma das formas mais eficazes de travar a progressão dos fogos. Não querem assumir que em 2017, nos incêndios de Pedrogão e de 15 de Outubro, está presente, entre outros abandonos culturais, o abandono da área de vinha. Uma redução (1983/2023) de 2/3 na Beira Litoral e 50% na Beira Interior. Onde passaram a medrar, no melhor dos casos, eucaliptos, em geral cobriram-se de silvas e matos!
Como é possível que um Governo tente desligar, desarticular, separar a intervenção pública na floresta do minifúndio das políticas para a agropecuária e o mundo rural? As áreas baldias, 10% da floresta portuguesa, vão ter a sua floresta sob a tutela do ambiente, mas as vacas e os rebanhos que lá pastam são comandadas por ministério vazio? Como é possível que se escreva no Programa do Governo «O consenso técnico aponta para a necessidade de criar uma floresta ordenada, biodiversa e resiliente, conjugada com um mosaico agrícola, agro-florestal e silvopastoril (…)» e depois se rebente com a integração “natural” dessa realidade?
Há os que avançam com a desculpa de mau pagador da impossibilidade da tutela bicéfala de um ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e da Floresta. Os mesmos que apadrinharam, com os governos do PS/Sócrates, a destruição, esvaziamento funcional e orgânico e envelhecimento da Direcção Geral das Florestas, e depois a inacreditável fusão da estrutura para as florestas com o Instituto da Conservação do Ambiente, por ordem da Ministra Cristas, para “poupar” no pessoal.
Não deixa de ser irónico que seja o Ministério que nunca foi capaz de assumir a sério, de forma eficaz e preventiva, a protecção da floresta das Áreas Protegidas, há muito sob a sua exclusiva tutela – que o digam os devastadores incêndios, que muito mais que uma vez lavraram no Parque Nacional da Peneda Gerês, nos Parques Naturais da Estrela, de Montesinho, Douro Internacional, S. Mamede e outros – passar a tomar conta de toda a floresta portuguesa! Valha-nos a Santa, advogada das coisas impossíveis! Mas como é também esse ministério dito da Transição Energética, deve ser para facilitar o derrube de áreas florestais destinadas à implantação de parques fotovoltaicos, em nome da descarbonização! E há quem pense que as árvores somem carbono…
(1) Pacheco Pereira, Público de 26OUT19.
(2) Henrique Pereira do Santo, Público de 24OUT19.
1 comentário:
Não é ignorância é não prioritário e é de propósito para dar cabo do que falta e para recuperar os solos depois só com espécies rústicas e pioneiras como o pinheiro bravo e eucalipto. Nessa altura já têm justificação para a arborização unicamente com estas duas espécies.
A partir do momento em que se deu o inicio ao desmantelamento da Direção Geral das Florestas integrando nas Direções Regionais de Agricultura, nunca mais parou a destruição dos serviços públicos que poderiam ter algum papel para ajudar. Agora estamos muito pior em termos de organização e de atividade interna que está praticamente parada, não existe estratégia nem organização e o dia a dia é empurrado com a barriga por quem deveria ter um papel importante na organização e definir funcionamentos.
Enfim, o despovoamento do interior continua e portanto não irá acontecer nada com esta nova orgânica, aliás irá piorar.
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