A austeridade já chegou?
Enquanto esperamos pelas decisões do Conselho Europeu de amanhã, quero partilhar convosco a minha inquietação depois de ouvir uma conversa entre jornalistas do Público (18 de Abril ,Helena Pereira , Leone Botelho ,Luciano Alvarez e S.José Almeida
1) É consensual entre estes jornalistas que esta crise irá exigir, mais adiante, uma política orçamental de redução da enorme dívida a contrair. Teremos novamente importantes cortes na despesa e/ou aumento dos impostos. Este ridículo aumento dos funcionários públicos (os da Saúde ainda vão ter de esperar um mês), devia ter sido suspenso, dizem eles. Não lhes ocorre que isto é rendimento que acabará por ser gasto e, mesmo sendo pouco, também amortece a crise e gera receita fiscal. Ou seja, para estes jornalistas - a "nata" do jornalismo português, segundo dizem - a austeridade selvagem é inevitável. Não aprenderam nada com a crise anterior.
Mesmo depois de a anterior crise ter tornado evidente, até para o mais iletrado cidadão, que a austeridade não melhora o défice e a dívida, antes agrava as contas públicas e destrói a vida das pessoas, voltamos a ouvir o mesmo discurso da austeridade pela boca de São José Almeida, Leonete Botelho e Luciano Alvarez. Parece mesmo que estão a convidar os economistas da ortodoxia, a teoria da "austeridade expansionista" desmascarada na anterior crise, a regressarem ao palco dos media para voltarem a desempenhar o seu papel de anestesistas da população. Para que ela aceite, resignada, a pouca sorte que teve. Mais, deturpando o conceito de austeridade (política orçamental recessiva) para a tornar mais aceitável, até já designam as perdas de rendimento produzidas pela paralisação da economia como sendo a "austeridade". Ela até já está aí!
2) Estes jornalistas nem sequer se dão conta de que alguns economistas portugueses da direita já defendem o financiamento directo dos Estados-membros pelo BCE, porque entendem, e bem, que a escala desta crise está a exigir uma intervenção pública de tal magnitude que levará a dívida para níveis que nenhum país poderá gerir politicamente. É isso que começaram a fazer a Reserva Federal dos EUA e o Banco de Inglaterra; aliás, algo que já faziam, discretamente e em pequena escala.
Evidentemente, eu não acredito que a UE vá por esse caminho, tendo em conta a ideologia do ordoliberalismo que domina a mente de políticos, elites e cidadãos da Alemanha, Áustria e mais alguns países do centro. Mas o ponto aqui não é esse.
O que é extraordinário é esta escandalosa falta de trabalho jornalístico, já que nem sequer falam destas alternativas envolvendo o BCE, ou de outras que Ricardo Paes Mamede também apresenta e que, sendo menos controversas, também encontrariam resistência no ordoliberalismo. Informar e debater alternativas é coisa que não interessa a esta gente que se diz jornalista.
3) Vejam também o programa 'O Outro Lado', na RTP3, onde Ana Drago teve de aguentar com enorme paciência o "vamos ter de pagar toda esta dívida", a inevitabilidade da austeridade defendida pelos seus interlocutores. Neste programa foram exibidos comentários dos telespectadores que invariavelmente assumiam a austeridade como o caminho para pagar a dívida. Mais uma vez, o senso comum a funcionar sem contraditório. Aquilo que é um assunto eminentemente político - matéria de debate racional e escolha quanto à sociedade que queremos - está a ser transformado, diante dos nossos olhos, num dado da natureza, num 'vírus da austeridade' a que teremos de nos entregar, aceitando o seu custo em vidas humanas, deslaçamento social e, é preciso dizê-lo, criação da base social do descontentamento que fará crescer o neo-fascista Chega.
Se a esquerda do meu país não for capaz de enfrentar e vencer esta anestesia da opinião pública que os media começam a injectar, então estaremos muito mal. E precisaremos de criar uma alternativa.Retirado ,com a devida vénia , fo facebook de Jorge Bateira
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