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12 de maio de 2025

A autodestruição da UE

 Os líderes europeus desafiam a lógica fundamental das relações internacionais, em que os Estados agem principalmente para promover seus próprios interesses estratégicos. Em vez de apoiar os esforços diplomáticos para acabar com a guerra, os líderes europeus inviabilizam as iniciativas de paz de Trump, minam as negociações e prolongam o conflito. Do ponto de vista dos interesses fundamentais da Europa, não só é confuso, é irracional.

A guerra na Ucrânia, um conflito por procuração entre a NATO e a Rússia, infligiu imensos danos económicos às indústrias e famílias europeias, aumentou os riscos de segurança em todo o continente. Pode-se argumentar, que o envolvimento da Europa na guerra foi errado desde o início; resultado da arrogância e de erros de cálculo, especialmente a crença equivocada de que a Rússia sofreria um rápido colapso económico e uma derrota militar.

Qualquer que fosse a justificação para a resposta inicial da Europa à guerra, podia esperar-se que, à luz das consequências, os líderes europeus aproveitassem qualquer caminho viável para a paz e a possibilidade de restabelecer relações de cooperação económica com a Rússia. Em vez disso, responderam com a "ameaça russa". Longe de aproveitar a oportunidade prometem apoio financeiro e militar indefinido à Ucrânia e anunciam um plano de rearmamento sem precedentes, preparando um impasse militarizado com a Rússia, mesmo com um acordo negociado. Como podemos entender esta postura autodestrutiva?

Quatro dimensões podem explica-la: psicológica, política, estratégica e transatlântica. Do ponto de vista psicológico, os líderes europeus tornaram-se cada vez mais distantes da realidade. O afastamento entre as suas expectativas iniciais e a trajetória real da guerra criou uma dissonância cognitiva, levando-os a adotar narrativas delirantes, incluindo apelos alarmistas para se prepararem para uma guerra total contra a Rússia. Revela um mal-estar profundo à medida que sua visão colide com factos desconfortáveis no terreno.

Washington sempre viu a NATO como um meio de garantir a subordinação estratégica da Europa, a ameaça do presidente de reduzir os compromissos dos EUA com a aliança poderia ser uma oportunidade para a Europa se redefinir autónomamente. O problema é que a Europa está numa relação subordinada com a América há tanto tempo que tenta replicar a política externa agressiva dos Estados Unidos.

Tendo sacrificado voluntariamente seus próprios interesses no altar da hegemonia americana, agora apresentam-se como os defensores das próprias políticas que os tornaram inúteis. É menos uma demonstração de convicção real do que um reflexo psicológico, uma tentativa de esconder a humilhação de serem expostos como simples vassalos transatlânticos.

Admitir o fracasso na Ucrânia equivaleria a estes líderes suicídio político; especialmente devido aos imensos custos económicos suportados pelas populações. A guerra tornou-se uma justificação para sua dominação, encobrindo seus fracassos. Acabar com a guerra também exigiria reconhecer que o desrespeito da NATO pelas preocupações de segurança da Rússia desempenhou um papel no desencadeamento do conflito, minando a narrativa dominante da agressão russa.

Os líderes europeus optaram por consolidar a sua posição continuando o conflito – e a manutenção de uma postura hostil em relação à Rússia como pretexto para consolidar o poder, suprimir a dissidência, uma tentativa desesperada de administrar a desintegração interna projetando força no exterior.

Aumentando as despesas militares esperam ajudar as economias anémicas da Europa. Aliás, o país que lidera a remilitarização é a Alemanha, cuja economia foi a mais atingida pela guerra na Ucrânia. O complexo militar-industrial europeu, sonha ganhos recordes, mas é improvável que cheguem aos europeus comuns: o aumento dos gastos com defesa inevitavelmente levará a cortes nas áreas sociais, como pensões, saúde e segurança social. O Financial Times, expressou a lógica subjacente: "A Europa deve reduzir seu estado de bem-estar social para construir um estado de guerra".

A UE tornou-se uma organização cada vez mais autoritária e antidemocrática. Sob von der Leyen, a CE tem usado as crises para aumentar sua influência sobre áreas antes reservadas aos governos nacionais – de orçamentos financeiros a políticas de saúde, relações externas e defesa, aproveitou a crise da Ucrânia para transformar a CE e a UE num braço da NATO. Sob o pretexto da "ameaça russa", pretende acelerar o processo de centralização propondo, por exemplo, a compra coletiva de armas em nome dos Estados-membros: modelo "eu compro, você paga", utilizado para as vacinas Covid-19. Isto daria à Comissão o controlo sobre o complexo militar-industrial dos países da UE; outro golpe institucional de Bruxelas.

Bruxelas está a impor uma política externa cada vez mais rigorosa, com ameaças e pressões para coagir líderes não alinhados, como Orbán na Hungria e Fico na Eslováquia, até à proibição total de candidatos que criticam a UE e a NATO, como na Romênia. A "ameaça russa" serve como um último esforço para salvar o projeto da UE.

Fonte: Europe’s self-destruction - Thomas Fazi



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