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29 de agosto de 2023

Fundamentalismo do mercado: fome, pobreza e crises

Enquanto a UE se afunda, os fundamentalistas do mercado (mascarados com a “democracia liberal”) continuam a fazer-nos acreditar que a “economia de mercado” (mercados desregulados) garantem a satisfação das necessidades humanas, bem estar e riqueza chegaria a todos. A propaganda não sai disto, financiada por aqueles cujo interesse reside em acumular riqueza ilimitada sem levar em conta os danos sociais ou ambientais. É isto que um texto nos lembra: O sistema alimentar mundial nos traz inflação, fome e desperdício (wordpress.com) by Systemic Disorder

Friedrich Hayek, da Escola Austríaca de Economia, precursora da Escola de Chicago de Milton Friedman, chegou a afirmar que a solidariedade, e o desejo de trabalhar para a melhoria coletiva são "instintos primitivos" e que a civilização humana consiste numa longa luta contra esses ideais, sendo "a disciplina do mercado " que permite o progresso. Friedman, venerado pelos que se tornaram cada vez mais ricos e poderosos aprofundando o controlo oligárquico da sociedade, promoveu a ideia de que a única consideração para qualquer empresa é maximizar os lucros para os acionistas ; fazer qualquer outra coisa seria "imoral".

As terríveis desigualdades, as guerras, o imperialismo, os milhares de milhões sem trabalho regular, as favelas e uma série de outros males, são o resultado de se permitir que os "mercados" façam das necessidades humanas mercadorias, mesmo básicas como água, a habitação ou a alimentação.

No entanto, numa economia capitalista a alimentação é uma mercadoria. A inflação não isentou os alimentos, ficando muito mais caros nos últimos dois anos. Em geral, a ideologia de direita que domina completamente os media raramente perde a oportunidade atribuir aos salários o aumento da inflação – cujo remédio em última análise é sempre mais austeridade, visto que a culpa seria (pelo menos, também) dos trabalhadores gananciosos que acreditam dever receber um salário suficiente para viver decentemente em troca do seu trabalho. Nunca, são apresentadas evidências para apoiar estas alegações, consideradas um facto incontestável da vida. A ganância dos financeiros e dos executivos é ignorada como fator de inflação.

O relatório da FAO estima que cerca de 10% da população mundial "enfrenta fome cronica", mais 122 milhões de pessoas em 2022 do que em 2019. Mais de um quarto da população mundial está em "insegurança alimentar": Em 2022, 27,8% das mulheres adultas estavam em insegurança alimentar moderada ou grave, 25,4% dos homens; 22,3% das crianças menores de cinco anos.

Um sistema que leva a resultados tão desumanos e indesculpáveis não pode ser considerado eficiente. Seria correto dizer que tal sistema é um fracasso abismal.

Um outro relatório da FAO, The State of Food Security and Nutrition in the World 2021 observa que entre 720 milhões e 811 milhões de pessoas enfrentaram a fome, mas "Quase uma em cada três pessoas no mundo (2 370 milhões) não teve acesso a alimentos adequados em 2020 - um aumento de quase 320 milhões de pessoas em apenas um ano". Um terço das pessoas do mundo! Além disso, um número ainda maior de pessoas não tem condições de pagar por uma alimentação saudável.

Eric Holt-Giménez, num artigo, "Capitalism, Food, and Social Movements: The Political Economy of Food System Transformation ", disse que “um sétimo da população mundial passa fome quando é produzida mais 50% da alimentação suficiente para todos. O número total de pessoas famintas é subestimado. As pessoas só são consideradas se passarem fome 12 meses por ano. Se passarem fome 11 meses do ano, eles não são contados “enfrentando fome”. Em segundo lugar, essa medida é baseada na ingestão calórica, o limiar de ingestão calórica para determinar a fome (cerca de 2000 quilocalorias) é bom se você se sentar tranquilamente atrás de um computador 8 horas por dia. Mas a maioria das pessoas famintas no mundo são agricultores no mundo em desenvolvimento, nomeadamente mulheres que trabalham durante todo o dia e estão amamentando uma ou mais crianças. Elas precisam de até 5 000 quilocalorias por dia. As estimativas oficiais perdem tudo isso."

A "eficiência do mercado" rende desperdício, não abundância. É indiscutível que a agricultura capitalista é um fracasso. E isso leva-nos ao desperdício de alimentos. O Relatório do Índice de Desperdício de Alimentos 2021 do Programa das ONU para o Meio Ambiente estima que "o desperdício de alimentos totaliza 931 milhões de toneladas a cada ano", ou 17% da produção global total de alimentos. Um relatório da FAO de 2011, no entanto, estimou que cerca de 30% dos alimentos produzidos globalmente foram perdidos ou desperdiçados.

O Dr. Holt-Giménez, afirma que o desperdício de alimentos faz parte do capitalismo, resultante da concorrência implacável: "Costuma-se dizer que reduzir o desperdício de alimentos pode eliminar a fome. Embora isso seja concetualmente verdadeiro, ignora a influência do capitalismo no sistema alimentar. O desperdício de alimentos faz parte desse sistema. A agricultura capitalista, tem que produzir demais para se manter no mercado, e o desperdício de alimentos é uma consequência."


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