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9 de dezembro de 2022

Uma guerra que mudará o mundo

 Quem pensa que os objetivos da Rússia na guerra na Ucrânia são conquistar território está totalmente equivocado. Para a Rússia trata-se de mudar o mundo como já estava a ficar claro na intervenção na Síria. O discurso de Putin em 27 de outubro em Valdai – neste espaço referido em 28 e 30/11- definiu os contornos do mundo multipolar em que o Ocidente, que se considera a “comunidade internacional”, representa apenas 15% da população mundial.

A Rússia não aceita qualquer espécie de privilégio nas relações internacionais de uma nação ou grupo de nações, exigindo ser tratada em pé de igualdade tendo em conta os seus interesses e opções políticas e sociais, que têm que ser respeitados, sem tentativas de ingerência.

Enquanto o Ocidente se concentra na guerra na Ucrânia, vai se esgotando económica, socialmente e mesmo nos seus estoques de material militar, a Rússia constrói o mundo multipolar, no qual o Ocidente está a isolar-se, não conseguindo que a grande maioria dos países siga as sanções decretadas pelos EUA e UE.

Um novo centro geopolítico, económico e militar organiza-se: a Rússia, a China e o Irão tornam-se um novo triângulo na diplomacia internacional. A cooperação entre a Rússia e a China é completa. O Irão e a Rússia preparam a assinatura de um acordo de cooperação abrangente. Tudo isto, bem como organizações económicas como a Organização de Cooperação de Xangai, a União Económica Euroasiática ou os BRICS, tornam inúteis sanções ocidentais que com toda a evidência prejudicam cada vez mais os países europeus que as aplicam.

A Rússia, como Putin confirmou recentemente, não parece interessada em terminar a guerra. Ao contrário do que os estrategas neocons tinham visionado – visões sem visão – esgotar a Rússia no atoleiro da Ucrânia, mas é precisamente o contrário que está a acontecer.

A Rússia praticamente ignora os países europeus da UE/NATO, trata-os como meros súbditos dos EUA. Segundo a Lusa (LUSA, Ana Paula Pires em 7/12) A Rússia move funcionários diplomáticos do ocidente para oriente, para a linha asiática", disse Lavrov durante um fórum internacional na capital russa. Antes do final do ano, adiantou, será realizada uma reunião dos ministérios dos Negócios Estrangeiros e do Desenvolvimento Económico para abordar em pormenor esta questão. O chefe da diplomacia explicou que se trata de coordenar o trabalho das embaixadas, câmaras de comércio e representações das principais corporações estatais russas para redirecionar as suas atividades para o continente asiático. Lavrov, fez várias viagens nos últimos meses a países asiáticos, árabes e africanos que se tornam uma prioridade para Moscovo.

Os EUA com o RU podem ter inutilizado os gasoduto Nord Stream prejudicando a Alemanha, a sua competitividade e indústrias como as petroquímicas designadamente a gingante BASF lider mundial na área química, em risco de fechar várias unidades.

Em contrapartida, em tempo recorde entrou em funcionamento o gasoduto da Sibéria para a China tendo chegado ao seu destino final em Xangai e já em operação numa parte.

Os media e os políticos NATO são incapazes de explicar como pretendem vencer a Rússia militarmente. Mas ainda menos como podem destruir a economia de um país determinado e rico em matérias-primas e tecnologia como a Rússia. Já lá vai o tempo em que a arrogância imperialista dizia que a Rússia era um posto de abastecimento de combustível com armas nucleares.

O êxito na substituição de importações designadamente nas indústrias automóvel e aeronáutica, tendo deixado de respeitar patentes de países ditos hostis, mostra a sua capacidade produtiva.

A Rússia é um país com um grau de autosufuciência não igualado por qualquer outro. Segundo Eurásia e Multipolaridade, a guerra na Ucrânia, tornou claro que o globalismo está acabado. O papel da Rússia vai se tornar cada vez mais importante exatamente porque a Rússia tem soberania (muito poucos países podem tomar decisões baseadas inteiramente em seus interesses nacionais, não respeitando os ditames dos EUA e das instituições supranacionais) e, o mais importante, tem recursos para ser quase autossuficiente:

-Tem petróleo e gás para centenas de anos

- Tem os maiores reservatórios de água doce do mundo (Lago Baikal, por exemplo)
- Tem urânio e plutónio suficientes para abastecer suas usinas nucleares por séculos
- Tem um suprimento ilimitado de ferro, alumínio e titânio necessários para armas, munições e equipamentos.

- Tem ouro e prata para suas indústrias, mas também como dinheiro real, num mundo onde as moedas fiduciárias estão destinadas a entrar em colapso em valor devido a enormes dívidas que não podem ser pagas.

-Tem milho, trigo e soja para alimentar a sua população sem problemas.

- Tem cientistas de alta qualidade.

A Rússia precisará de alguma ajuda do exterior no setor da eletrónica, mas tem 90% dos componentes necessários para produzir um chip, embora precise de know-how e da criação de empresas dedicadas.

Pelo contrário, a propaganda por mais intensa e distorcida não pode resolver os problemas de escassez de recursos dos países europeus da UE/NATO.

Gerir é sobretudo prever e a falta de qualidade dos líderes ocidentais evidenciou-se pela incapacidade de prever as consequências das suas trapalhadas na Ucrânia desde 2014. Nem o “fuck UE”, dos EUA os chamou à realidade.

Bem, como nos ensinaram em pequenos, quem não se sente é que não é filho de boa gente. E são estes que nos (des)governam...

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