Os limites impostos pela UE às dívidas são uma perversa armadilha reforçada pelo euro, pelo qual que os “europeístas” garantiam que o país não iria ter problemas de liquidez e financiamento. Resultado, limites absurdos, imposições arbitrárias para serem cumpridos, sanções. A solidariedade na UE é para com os bancos, para com a finança, aos quais os interesses mais legítimos dos povos devem ser condicionados.
A UE vai, sem dúvida por “bom caminho” para o desastre social, económico, geopolítico que as atuais crises e ausência de medidas e debate sobre as questões de fundo. Como o Estado pode obter as verbas necessárias para desempenhar as suas funções em particular as económicas e sociais dentro das "regras" da UE/zona euro
A burocracia europeia reveste de tecnocracia a sua agenda política a favor do grande capital económico e financeiro. Todas as “regras” definidas pela burocracia ao serviço daqueles lóbis, são depois aprovadas, quando muito com alguma cosmética para disfarçar o antissocial nelas contido, pelos governantes do Estados membros que alinham servilmente com o sistema. Pouco ou nada disto aparece no debate político, até porque os apresentadores têm o cuidado das perguntas orientarem as respostas. “Quando perguntas é que mentes” – escreveu Saramago num poema.
O que é ainda mais espantoso, é na UE (que segue servilmente as políticas dos EUA) serem impostos limites de endividamento público de 60% do PIB, e nos EUA a dívida pública (federal, mais Estados, mais entidades locais) é de 135,8% do PIB. Como é que esta discrepância não está prioritariamente nos media e a ser discutida pelo poder político? Ora, gato escondido com rabo de fora, isto só prova que o terror dívida, ao qual tudo se submete, é simplesmente um problema político – de políticas económicas e financeiras.
A prof. Orsola Costantini, refere-se a vários estudos que concluíram que "os critérios de convergência fiscal destinados a eliminar ou prevenir 'déficits excessivos' são mal motivados, mal projetados e suscetíveis de levar a dificuldades desnecessárias se aplicados mecanicamente. Não há razão para limitar a relação dívida/PIB a um valor numérico específico, muito menos para estabelecer o mesmo limite para [muitos] países heterogéneos". O preço econômico da deflação fiscal e da redução permanente da flexibilidade fiscal, que são parte integrante do PEC e são pagos pelos Estados-membros da UE, podem muito bem ser insuportáveis – Joseph Stiglitz (2016).
A austeridade e as regras fiscais rígidas restringem desnecessariamente o espaço fiscal, que o Estado poderia usar para ajudar a economia. A austeridade (injustificada) paralisou a economia da zona euro – especialmente os países do sul da Europa. A expansão fiscal, focada no investimento público, inclusive em setores relacionados à saúde e educação, é necessária para superar a estagnação da economia europeia Neste contexto, deve notar-se que a política macroeconómica deflacionária da UE também permitiu um aumento histórico das taxas de lucro. Embora várias fontes institucionais da UE tenham lamentado uma crise de competitividade, nenhuma apontou provas de que uma distribuição mais justa do rendimento, conseguida através da criação de emprego e da prestação de serviços públicos baratos, é uma componente essencial de uma trajetória de crescimento estável com aumento da produtividade.
As regras fiscais não se baseiam numa justificação económica convincente, mas desempenham um papel essencialmente político, o verdadeiro problema da política fiscal é político. O verdadeiro problema é o da legitimidade democrática e da representação política na UE, cuja ausência impede uma discussão sobre os objetivos económicos e sociais a atingir coletivamente. O défice democrático leva governos e eleitores a adotarem posições economicamente ineficientes e politicamente insustentáveis que, desde o Tratado de Maastricht, produziram sistematicamente um crescimento lento, exceto breves expansões, o aumento da desigualdade e a deterioração da saúde das pessoas e do ambiente.
A política europeia foi reduzida a negociações mesquinhas e recriminações, sem implicações políticas diretas, para além de dar poder a uma burocracia complacente e incompetente em Bruxelas. A situação é desastrosa, não seria surpreendente se o ciclo de austeridade totalmente desnecessário numa economia reforçasse um "ciclo catastrófico" de estagnação e o aumento da desconfiança no sistema político.
O travão da dívida e as regras orçamentais tornarão virtualmente impossível os países da UE financiar os investimentos necessários às suas economias. Pior ainda, será impossível fazê-lo de uma forma socialmente aceitável. É tempo de abandonar o travão constitucional da dívida e abandonar as regras orçamentais da UE, a fim de abrir um espaço para uma deliberação política significativa e um debate sobre os desafios de curto e longo prazo que se colocam a todos os cidadãos da UE. Qualquer coisa que não atenda a esses critérios deve ser considerada um fracasso.
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