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17 de janeiro de 2024

CONTRA A RÚSSIA, MARCHAR, MARCHAR!

 À medida que nos aproximamos do segundo aniversário da guerra entre a Rússia e a Ucrânia, multiplicam-se os artigos de opinião e análise tentando fazer o ponto da situação. 


Isto é perfeitamente compreensível. O que espanta, entretanto, é que, pelo menos até agora, as opiniões expressas entre nós nos media convirjam num só sentido: a necessidade de continuar a sancionar a Rússia e armar a Ucrânia com armas sempre mais potentes e de maior alcance.

O DN, este fim de semana, é paradigmático - publica, logo no mesmo dia (!), duas colunas assim intituladas:

"A guerra da Ucrânia em 2024 - resistir e (re)construir (rapidamente) as condições para a derrota da Rússia", da autoria do tenente-general Marco Serronha, do Europe’s War Institute;

e

"Ano Novo: Fazer sair a Rússia da Ucrânia sem mais demoras" (sic)
da autoria de Victor Ângelo, um conselheiro em segurança internacional, que sempre evoca a sua condição de ex-secretário-geral-adjunto da ONU.

Que os generais instalados nos institutos e órgãos oficiais continuem a alimentar a esperança numa derrota da Rússia e a instigar a opinião pública a embarcar num novo ciclo do confronto, com mais financiamento e envio de mais e mais poderosas armas a Kíev, ainda se compreende - essa é, afinal, a sua função e para isso são pagos;

Já de um homem que foi vice-secretário/geral das Nações Unidas seria de esperar maior contenção e uma retórica menos inflamada. Afinal de contas, a ONU tem por missão tentar sempre conciliar e nunca apelar à guerra ou à sua continuação. 

Em qualquer caso, nestes artigos o que sempre falta é uma consideração ponderada dos antecedentes históricos, das circunstâncias concretas que levaram à guerra, das realidades sociais e políticas muito diferenciadas no terreno, consoante se trate do ocidente ou do leste da Ucrânia e por aí fora. 

Tudo neste textos se limita à repetição do mantra da invasão russa e do direito dos Estados a fazerem soberanamente as suas escolhas - um enquadramento que logo à partida nos encaminha para a condenação sem apelo nem agravo de Moscovo, que exclui ab initio a possibilidade de que a Rússia possa ter interesses legítimos a ter em conta.

Apesar do manifesto falhanço das sanções - a Rússia virou-se a tempo para a China e deu a volta ao boicote, esperando-se um crescimento do PIB da ordem dos 4% em 2023, o que, a confirmar-se, deverá colocar o país em quinto lugar no ranking mundial em termos de Paridades do Poder de Compra (ultrapassando a própria Alemanha, hoje em crise) ; apesar do falhanço trágico da contra-ofensiva ucraniana e até de alguns avanços russos no terreno, ainda que à custa de elevadas perdas, apesar de tudo isso, os nossos analistas continuam, uma e outra vez, a propor-nos a mesma receita: mais sanções, mais financiamento para sustentar o Estado ucraniano em perda, mais armas, mais guerra. 

Agora que os americanos começaram a virar-se para outros cenários - Médio Oriente e China -  pressionando os europeus para cobrirem as despesas da guerra na Ucrânia - tarefa já assumida pelo chanceler alemão Scholtz (que hoje vale apenas 19% do eleitorado), logo os nossos analistas correm atrás, assinando por baixo. Como se esse financiamento  não fosse para comprar mais armas ao complexo militar americano, não tornasse a Europa mais dependente e não tivesse dramáticas consequências em termos sociais.

Mas isso nem sequer é ponderado nos artigos em questão, como se fosse uma obrigação europeia que não pode sequer ser questionada. 

De paz, nem se fala - virou praticamente tabu.

The last, but not the least, estes autores, mais propagandistas do que propriamente analistas, esquecem que - goste-se ou não - a Rússia continua a ser uma potência nuclear. E se for colocada em situação de perda grave, há o sério risco de chegarmos a um conflito nuclear de consequências catastróficas sem precedentes para a humanidade e para o planeta. Sobre isso , também nada dizem - zero! 

Não deixa, por outro lado, de ser curioso notar que na precisa semana em que media tão importantes como o norteamericano Wall Street Journal e o inglês Telegraph  admitiram a possibilidade de uma viragem - hipótese secundada pelo ministro da Defesa de Itália, que disse mesmo ser tempo de voltar ao diálogo para se reconstruírem as relações com a Rússia -  não deixa de ser curioso, que os comentaristas nacionais de serviço ignorem tudo isso e insistam em mais do mesmo. É uma velha tradição portuguesa - sempre mais papistas do que o Papa! Até quando? Faicebook de Carlos Fino

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