O episódio Sírio mostra as limitações da Rússia, mas não constitui uma derrota como a dos EUA no Afeganistão, que contudo não diminuiu, pelo contrário, a sua agressividade. Só será uma derrota para a Rússia se forem expulsos das bases militares que têm atualmente na Síria.
A Rússia não caiu na armadilha de apoiar Assad até ao fim. A situação económica da Síria estava muito degradada devido às sanções que bloquearam importações de bens essenciais como alimentos, energia e medicamentos básicos além dos EUA ocuparem os campos de petróleo e contrabandearam cereais de regiões sírias ocupadas. O recuo russo evitou que caísse na situação de crise económica do bloco dos EUA tendo de sustentar militar e economicamente o regime de Kiev, falido e derrotado. O governo sírio não tinha dinheiro para manter as forças armadas, o que pode explicar a ausência de resistência e entendimentos prévios com os grupos islâmicos.
Isto também explica que a embaixada russa em Damasco tenha sido respeitada e a embaixada síria na Rússia tenha hasteado a bandeira da revolta. O chefe da delegação da oposição armada síria disse procurar relações normais com a Rússia e a comunidade internacional. As bases militares russas na Síria estão em alerta máximo, mas não houve ameaças à sua segurança.
Israel e Turquia são para já os vencedores, pois estabeleceram vínculos com os grupos da ex al-Qaeda, preparando-se para criar suas esferas de influência no território sírio. Grupos apoiados pela Turquia assumiram o controle de Aleppo e Idlib, porém subsiste o problema curdo, que Israel e os EUA apoiam, situação inaceitável para a Turquia no sentido em que aproveitando as divisões na Síria e com esses apoios tentarão estabelecer um Estado.
Quanto a Israel há muito que tem contatos diretos com os grupos islâmicos que operam no sul da Síria. Não é segredo que esses grupos foram orientados pelo exército israelita durante mais de uma década. Entretanto Israel avançou nos Montes Golã e cruzou a fronteira sul. A situação atual, permite a Israel anexar Gaza e a Cisjordânia e fragmentar o Líbano enfraquecendo o Hezbollah. Netanyahu exulta com a queda do "regime de Assad, um elo central no eixo do mal do Irão", isto enquanto a sua guerra brutal contra os habitantes de Gaza prossegue.
Quem definitivamente parece perder são os palestinos, ignorados neste vespeiro em que o Irão sofre um sério revés e por consequência os grupos de resistência pró palestina, em grande parte xiitas. É vantajoso para Israel, mas provoca uma mudança no equilíbrio de forças na região.
Os países árabes estão preocupadas com o êxito dos grupos islamistas que pode representar um desafio para os seus sistemas. Não é de surpreender que se aproximem do Irão, que veem como um fator de estabilidade regional, unindo-se para evitar o desafio desses grupos. É claro, os EUA combaterão essa tendência regional que levantaria problemas a Israel.
Saliente-se que a Arábia Saudita reiterou o apoio ao povo sírio e à sua soberania, instando a comunidade internacional a evitar interferir nos assuntos internos da Síria, defende a cooperação para ajudar a resolver a crise e preservar a integridade territorial da Síria. Também o Catar diz ser necessário preservar as instituições nacionais e a unidade do Estado para evitar cair no caos.
O que está agora em causa é a soberania e a integridade territorial do país ou a desintegração da Síria. Conquistado Damasco, as contradições vão acentuar-se. Nenhum dos protagonistas vai recuar ou sair do país. O que resta para Damasco governar? Quais os recursos? Que conciliação vai existir entre os diversos grupos e seus diferentes apoios?
Os idiotas do costume, aplaudem o reino do caos, ignorando o destino dos palestinos. Scholz diz que o fim do governo de Assad é uma boa notícia", António Costa diz que é uma oportunidade para a democracia. Isto quando Damasco foi ocupada por grupos considerados pela ONU e mesmo os EUA "terroristas"! Claro que repetem Biden: "A situação na Síria é incerta, mas pode ser usada para construir um futuro melhor.". É caso para perguntar que futuro melhor construíram na Líbia, no Iraque, no Afeganistão em que as pessoas acabaram por preferir os talibãs!
Fontes - Vencedores e perdedores na Síria - M. K. Bhadrakumar;
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