Linha de separação


20 de dezembro de 2024

As mulheres nos ministérios da defesa/guerra tem água no bico



Apontamentos sobre o militarismo e algumas das suas máscaras na actualidade

Fernando Sequeira

A actualidade do livro da historiadora belga Anne Morelli sobre o importante

tema «Princípios Elementares de Propaganda de Guerra», editado em 2001 e

publicado na versão portuguesa em 2008 pela Editorial Avante!, é

absolutamente inquestionável.

E tal actualidade é tanto mais forte e perene quanto a base, chamemos-lhe

teórica, que suporta o livro, é uma obra do inglês Arthur Ponsonby publicada

em Londres em 1928, e tendo como base a experiência que este adquiriu no

contexto da Primeira Guerra Mundial, no domínio da análise sistemática da

propaganda de guerra utilizada pelas partes então em confronto e das muito

interessantes e sistematizadas conclusões que dessa experiência retirou.

Esta interessante obra de Anne Morelli, assim como o acervo base de Arthur

Ponsonby, tem a ver, no fundamental, com aspectos de luta ideológica,

sobretudo na sua vertente de diversão, quando não mesmo de absoluta

mentira, associadas à guerra, ou melhor, às guerras, e como que obedecendo

a leis, pois que são sistemáticos os focos ao longo das épocas em torno dos

quais se desenvolve a propaganda de guerra, que, regra geral, obedece, quase

na perfeição, à bem conhecida e certeira síntese, fruto da sabedoria popular

portuguesa, que é a expressão: «agarra que é ladrão».

A muito pequena nota que ora se apresenta, também aborda e reflecte,

questões ideológicas associadas, quais biombos, à mistificação do carácter

militarista agressivo do imperialismo nas condições da actualidade, mas em

torno de alguns aspectos da realidade portuguesa, e não só, inserindo-se, no

quadro de uma completa subversão semântica, técnico-científica e mesmo do

domínio sociológico, em áreas com pouca relevância no passado, mas com

grande importância na actualidade, tais como o peso das questões ecológico-

ambientais, o papel da mulher na sociedade ou das sondagens temáticas de

opinião.




Semântica, luta ideológica e militarismo

É regularmente apresentado desde há vários anos, na RDP2, um muito

interessante programa, designado Palavras Cruzadas, e que tem como

subtítulo, a questão: Quase tudo é uma questão de semântica. Sábias

palavras.

Como é bem sabido, a semântica é a parte da linguística que estuda o

significado das palavras, ou seja, o valor semântico das palavras de uma língua

natural, ou, ainda, de outra forma, a semântica estuda o significado das

palavras considerado em si mesmo.

Este muito breve enquadramento teórico em torno da semântica, área de

enormíssima importância, face à sua completa centralidade no quadro da luta

ideológica e dos processos associados de diversão ideológica, e, portanto, da

manipulação, tem como intenção recordar a sua importância e papel central

nos processos de subversão e martelamento ideológico do léxico, e, portanto,




2

daí decorrente, dos conceitos associados à semântica enquanto poderosa

arma, sistematicamente usada pela direita, mas não só, no quadro da luta

ideológica.

Nalguns períodos e domínios trata-se, claramente, de uma arma com efeitos

manipulatórios muito superiores ao do próprio armamento de base material-

físico-química.

Trata-se, pois, obviamente, de uma questão muito bem conhecida, mas que

aqui entendemos trazer face à sua sistemática utilização enquanto importante

ferramenta de camuflagem de alguns aspectos da essência do militarismo.




Militarismo e ecossistemas

O Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia começou, de

algum tempo a esta parte, ao titular alguns dos diversos estudos sectoriais e

temáticos que elabora e divulga com alguma regularidade, a incluir, cada vez

com maior frequência, no respectivo título, o léxico «ecossistema»,

independentemente do conteúdo do tema tratado em cada estudo.

Desde já uma nota prévia: nenhum dos estudos publicados até agora trata,

sequer ao de leve, em questões de carácter ambiental.

Estamos, pois, no caso vertente, perante, no mínimo tonta, aplicação de uma

moda, que pretende, qualquer que seja o assunto tratado, inseri-lo na

problemática das questões ambientais, tenham estes ou não a ver com o tema

em apreço.

Isto é, estamos obviamente perante um completo martelamento semântico,

pois que, ecossistema, é um conceito que, embora não muito antigo – tem

cerca de 90 anos – respeita exclusivamente aos sistemas naturais, isto é, à

Natureza.

A razão desta subversão semântica, tem a ver, como é fácil de concluir, e como

muito bem sabemos, com a poderosa e persistente campanha de formatação

ideológica em torno do Ambiente e do Verde, não para abordar com seriedade

as questões ambientais e atenuá-las fortemente, cada vez apresentando maior

importância nos dias que correm face ao desenvolvimento económico, mas, em

sentido inverso, para a utilizar enquanto arma de diversão ideológica, enfim,

para esconder, por detrás delas, muitas das questões essenciais das

sociedades actuais.

Em termos científicos um ecossistema é definido como um conjunto funcional

de elementos formado por componentes bióticos e abióticos. Porém, no quadro

de uma linguagem mais comum, por exemplo, o Dicionário da Língua

Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa (edição de

2001) define ecossistema como um «conjunto formado por um meio natural e

pela comunidade de organismos animais e vegetais que o habitam, interagindo

uns com os outros e com o próprio meio ambiente, do que resulta um sistema

relativamente estável».

Contudo, a deriva ideológica atinge actualmente tal nível que um estudo muito

recente, inserido na série «Estratégia Industrial Europeia e os Ecossistemas

Industriais Estratégicos», e subordinado ao tema da chamada defesa, foi

designado como «Caracterização do Ecossistema Industrial Aeroespacial e de

Defesa» (sublinhado nosso).




3

Isto é, a área ou áreas económicas fornecedoras de bens e serviços para a

chamada defesa, agora crismada de ecossistema de defesa (sublinhado

nosso), exactamente aquela área da actividade económica em que se

produzem os bens e serviços que fornecem outra área da actividade humana,

as Forças Armadas, estas responsáveis pelo honroso 4.º lugar na hierarquia de

toda a poluição a nível mundial.

É, de facto, demais apelidar de ecossistema exactamente aquele conjunto de

actividades que, seja na sua fase económica, seja no quadro de preparação,

seja já na fase plena da guerra, destrói, de múltiplas formas, os autênticos e

preciosos ecossistemas, portanto a própria Natureza, para já não falar do

Património, muito dele histórico, construído pela Humanidade ao longo de

milénios. Recordem-se, a propósito, os recentes casos da Síria e do Iraque.

Por outro lado, por exemplo, a produção de gases com efeitos de estufa (GEE)

associados à actividade militar propriamente dita é, no mínimo, superior à soma

dos GEE produzidos pelo conjunto de toda a aviação civil e de toda a marinha

de comércio a nível mundial.

Por exemplo, um militar dos EUA produz emissões de GEE sete vezes

superiores à de um qualquer cidadão português.

Em conclusão, como também observaremos noutra parte desta breve nota,

para designar as actividades económicas associadas à produção de bens e

serviços destinados às diversas componentes e sistemas de suporte das

actividades militares, chegou-se ao descaramento de utilizar uma designação

duplamente enganosa, a saber, primeiro, e completamente a despropósito, o

conceito de ecossistema, e, segundo, o termo defesa em vez dos termos militar

ou guerra. De facto, estão a abusar das máscaras.

A questão das nomenclaturas: a evolução histórica da utilização do termo

guerra para o termo defesa

Pelo menos desde 1820 e até 1950 que, em Portugal, o órgão governamental

responsável pelas questões militares tinha como foco semântico a guerra e a

organização e os instrumentos necessários para a poder realizar e conduzir.

Isto é, tal designação era clara, inequívoca e transparente e não pretendia

então enganar ninguém.

Tudo isto com a máxima clareza, sem rodeios nem biombos e, pelo menos

aparentemente, com poucos ou mesmo nenhuns choques com o quadro

nacional de crenças e valores então existente à época, e, naturalmente,

também no plano internacional, chamando, portanto, os bois pelos seus

próprios nomes.

Relativamente à comunicacionalmente estratégica defesa é de referir, pela sua

enorme actualidade, quando nos dias de hoje assistimos diariamente à

carnificina levada a cabo na Faixa de Gaza, mas não só, pelas Forças

Armadas do Estado sionista, o facto destas serem candidamente designadas

por Forças de Defesa de Israel (FDI), que nos dá bem a ideia da importância

política, social e comportamental da completamente abusiva, enganosa e

sistemática utilização do termo defesa, em vez de qualquer outro termo que

mais se aproximasse do contexto de guerra, ainda por cima na sua

configuração de terrorismo de Estado, de um Estado que ocupa ilegalmente,

face ao direito internacional (ONU), territórios de dois países (um há mais de 70




4

anos e outro há 57 anos), e que vem eliminando, dia após dia, a população da

Palestina.

E para concretizar isto tudo, só necessita de umas pacíficas Forças de Defesa.

Por outro lado, nem sequer o termo Forças Armadas aparece neste quadro

absolutamente manipulatório das consciências e dos valores.

Mas ainda muito mais grave do que a utilização do conceito de FDI por Israel é

a sua utilização, ad nauseum, pela generalidade dos meios de comunicação

ocidentais. Trata-se, de facto, de inocentar logo à partida o criminoso.

Retomando a questão dos organismos associados à guerra em Portugal,

anteriormente a 1820, já existia, contudo, uma Secretaria de Estado dos

Negócios Estrangeiros e da Guerra, cuja missão foi separada em duas, ficando

autónoma uma designada Secretaria de Estado dos Negócios da Guerra, cuja,

a partir de finais do século XIX, passou a ser designada por Ministério da

Guerra, portanto, uma designação sem quaisquer eufemismos, designação que

durou mais de meio século, atravessando duas guerras mundiais, a I e a II, a

criação da NATO e a adesão do Portugal fascista, enquanto membro fundador,

a esta organização.

Naturalmente que estas nomenclaturas ou outras idênticas eram utilizadas à

época em pelo menos todos ou quase todos os países ditos Ocidentais,

migrando, tal como agora, dos países mais desenvolvidos e poderosos para os

países mais pequenos e menos desenvolvidos, no quadro de um completo

mimetismo semântico-ideológico.

Sobre tais processos de migração, e somente enquanto breve nota, julgamos

útil recordar um facto, uma quase curiosidade, que bem traduz o assustador

grau de dependência ideológica, também no domínio militar, e no caso

vertente, da chamada economia de defesa face aos centros imperialistas.

Não contentes com o facto de designarem a firma das empresas, algumas

mesmo de carácter público, desde o seu registo legal, totalmente em inglês, e

com a absolutamente inaceitável e anti-nacional conivência dos Registos

Comerciais, os decisores nacionais, ainda não completamente satisfeitos com

este crime contra a língua portuguesa, nalgumas situações chegaram mesmo

ao ponto de utilizarem o termo defesa em inglês, não na sua forma mais

generalizada e comum, ou seja, defence, mas usando a forma exclusivamente

americana defense. É um exemplo acabado da total dependência semântico-

ideológica do quadro de valores do imperialismo norte-americano.

De facto, já não chega escrever defesa em vez de militar ou guerra, e não

basta escrever em inglês, e como se estivéssemos num festival de música é

preciso ir mais longe, substituindo defence por defense.

Pouco antes do início da II Guerra Mundial foi proposta a fusão do Ministério da

Guerra e do Ministério da Marinha num Ministério da Defesa unificado, que

também integraria a componente aeronáutica, mas tal projecto teve à época a

oposição do Exército e da Marinha, pelo que esta reorganização acabou por

não se concretizar.

Ainda com nomenclaturas que evidenciavam a natureza indiscutivelmente

militar destes organismos públicos, em 1950 o Ministério da Guerra alterou a

sua denominação para Ministério do Exército, ao mesmo tempo que era criado

um designado Departamento de Defesa Nacional.

Finalmente, de referir que o actual Ministério da Defesa Nacional resultou da

fusão dos Ministérios da Marinha e do Exército, e da Secretaria de Estado da

Aeronáutica, no quadro da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas.




5

A questão das mulheres enquanto Ministros/Ministras da Defesa Nacional

De há quase três décadas a esta parte, primeiro com muito reduzida

expressão, e depois, a pouco e pouco, já com significado em vários países da

União Europeia, mas não só, começaram a ser escolhidas e designadas pelo

poder político mulheres para ocupar o cargo ministerial da defesa, sem que tal

estivesse em consonância, particularmente com a estrutura, em termos de

género, da alta hierarquia militar.

Recordemos que a actual Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der

Leyen, foi durante seis anos Ministra da Defesa da Alemanha, num dos

governos de Ângela Merkel.

Mais de 40 países da Europa têm tido, embora em períodos diferentes,

mulheres à frente da chamada Defesa, das quais cerca de 30 após o ano 2000.

Países tão importantes e poderosos como a Alemanha, a França, a Itália, a

Espanha, ou ainda a Holanda e a Noruega, ou a Estónia, a Bósnia-

Herzegovina, a Albânia, ou mesmo Portugal, tiveram nos últimos anos

ministras da defesa.

E desde já, é de interrogar qual o exacto significado deste processo, que já

está a ser mais do que um epifenómeno, numa área historicamente sempre

reservada aos homens?

Será porventura o de replicar na área militar, o actualmente, claramente

maioritário e indiscutível, e, portanto, tido como correcto e adequado em termos

da consciência social, porque inserido no actual quadro de valores no mundo

dito ocidental, da cada vez mais significativa presença de mulheres em áreas

antes exclusiva ou dominantemente ocupadas por homens, como no ensino,

destacando aqui o de nível superior, na saúde, nos altos cargos da

magistratura, e isto com quotas cada vez mais elevadas e em muitas das vezes

crescentemente maioritárias, e mesmo nas Forças Armadas e nas Forças de

Segurança?

E, é política e ideologicamente muito importante cotejar este espectacular

progresso com o facto, agora de há muito de carácter histórico, da inexistência

de qualquer capacidade eleitoral para as mulheres já o século XX ia bem

entrado?

A grande excepção a esta forte tendência do último meio século é a reduzida

presença de mulheres em altos cargos de gestão, sobretudo de organizações

privadas, mas, de alguma maneira, também públicas.

Esta presença de mulheres no cargo político que superintende ao topo das

Forças Armadas será assim também uma consequência, embora velada, das

políticas de paridade entre sexos e da emancipação da Mulher?

Salvo mais fundamentada opinião pensamos que esta tendência, embora ainda

não dominante, mas, porém, política e sociologicamente já muito significativa,

embora possa ter como enquadramento geral, nomeadamente em termos de

aceitação social, deste processo de emancipação e acesso das mulheres a

cargos cada vez mais elevados, não têm, todavia, uma lógica dominante em

tais processos, mas sim são a marca claramente ideológica relativamente aos

processos de formatação e condicionamento da opinião pública face ao que

significam as Forças Armadas nas condições políticas da actualidade.




6

De facto, em qualquer dos países que têm ou já tiveram mulheres a ocupar a

pasta da Defesa não há, como já antes observámos de raspão, nas respectivas

Forças Armadas, qualquer concentração de mulheres de alta patente na

hierarquia militar – oficiais generais – e, quando lá chegam, são claramente

uma excepção.

De facto, no nosso entendimento, a escolha e nomeação de mulheres para o

cargo de Ministra da Defesa não é acidental nem inocente. Objectiva e

subjectivamente trata-se de adocicar o cargo, mas sobretudo o que está por

detrás dele, pois que no quadro de valores das actuais sociedades,

particularmente nas sociedades de matriz capitalista mais desenvolvidas, a

mulher ainda continua a ter uma imagem, nomeadamente, de calma, de

bondade, de sabedoria e de prudência, que os homens porventura não terão.

Mas, no caso vertente, isto é, o da nomeação política de mulheres enquanto

ministras da defesa, estamos somente perante uma aparência.

De facto, como bem sabemos, o que determina, em última instância, o carácter

do exercício de funções deste tipo, não é, de modo algum, o sexo do titular ou

a cor da sua pela, mas o seu posicionamento de classe, seja a sua classe de

origem, seja a da classe para quem presta serviços.

A este propósito convirá recordar factos bem recentes envolvendo mulheres

em altos cargos políticos, designadamente aquelas que estiveram associadas

no quadro de um protagonismo absolutamente central, como sejam os

processos de adesão da Suécia e da Finlândia à NATO, ou de semelhantes

intenções por parte da Moldava, ou ainda da postura profundamente agressiva

da Alemanha face à Rússia, em que, em todos estes casos, os principais

actores foram sempre e sempre mulheres. E seguramente, para venderem

melhor a pílula.

E assim, estas nomeações aparecem de facto como que uma manobra de

diversão, uma espécie de enfeite, um biombo, para dar um ar menos negativo

às organizações e aos instrumentos que são a base objectiva da vertente

militarista, designadamente, da União Europeia, nos dias de hoje. Isto é, são

mais uma peça, e não secundária, do processo de diversão ideológica no

quadro da manipulação e instrumentalização sequente dos Povos.

Ainda relativamente às razões que subjazem ao facto de os ministérios da

Defesa estarem a ser ocupados por mulheres, não foi por acaso que a Revista

Exame afirmava em 2017 (16/06/2017), que as mulheres são Ministras da Paz

e não Ministras da Guerra, pelo que então era mais que correcto que fossem

elas a ocupar tal lugar.

Finalmente, é também de recordar que a NATO já teve uma Secretária-Geral-

adjunta.




As sondagens de opinião enquanto ferramentas da instrumentalização

A manipulação dos cidadãos pelo poder das classes dominantes através de um

conjunto muito diversificado de canais – designadamente, o conteúdo de parte

das disciplinas não técnicas de todos os graus de ensino, o discurso político,

quase toda a publicidade, o conteúdo dos noticiários, particularmente os

televisivos, o comentário político, o entretenimento de massas, as sondagens

suportadas em questionários abertos, etc., etc. – que estas controlam de forma

quase absoluta não constitui um fim em si mesmo.




7

De facto, os processos manipulatórios são um meio, usando os diversos

instrumentos que atrás elencámos e outros, para alcançar um fim, uma espécie

de objectivo estratégico que é a instrumentalização de parte importante dos

cidadãos, previamente manipulados, no quadro de objectivos bem definidos do

grande capital, para responderem em termos de decisões, e sempre que

necessário, em consonância com tais objectivos.

O exemplo da manipulação em torno do anti-comunismo é, infelizmente, um

bom exemplo de um objectivo estratégico.

Em determinadas circunstâncias as sondagens de opinião temáticas, e

sobretudo os inquéritos que as suportam, permitem operacionalizar e orientar,

em determinada direcção e sentido as consciências pessoais previamente

manipuladas por horas, dias, semanas, meses e anos de diversificada

informação, total ou parcialmente falsa, a designada manipulação estratégica.

Vem esta pequena introdução a propósito do conteúdo de respostas a

inquéritos recentes, inseridos em sondagens sobre a União Europeia durante o

período eleitoral para as eleições para o Parlamento Europeu.

Perante perguntas abertas constantes do questionário que suporta o inquérito,

quase sempre nada inocentes, bem ao contrário, porque constituem

exactamente objectivos estratégicos dos atrás referidos, orientadas para

potenciar em determinada direcção, o lastro manipulatório preexistente em

cada manipulado, no caso concreto em apreço, de uma sondagem cujos

resultados foram publicados no Diário de Notícias de 3/6/2024, completamente

adequadas e inseridas na deriva militarista da União Europeia.

Perante as perguntas, as respostas dão-nos conta, com muita clareza, do nível

de manipulação prévia dos inquiridos, que, agora instrumentalizados pela

sondagem, respondem maioritariamente como o poder desejava e deseja que

eles respondessem.

Assim, relativamente à primeira pergunta, a saber, sobre o interesse de

constituir um fundo de investimento europeu para a indústria de «defesa», 80%

dos portugueses inquiridos concordaram com a proposta (29%, concordando

totalmente e 51%, concordando), e quanto à segunda pergunta, ou seja, sobre

a necessidade de constituir uma força militar de reacção rápida da União

Europeia, 77% dos portugueses inquiridos também concordaram com a

proposta (30 % concordando totalmente e 47 % concordando).

Mas ainda pior do que estas anteriores respostas, num quadro da mais

completa alienação sobre o entendimento do que é a soberania nacional de um

Estado com 900 anos, quadro que, de facto, como que risca a existência de

Forças Armadas nacionais e para servir os interesses nacionais, perante a

pergunta sobre a transferência ou alargamento de competências de Portugal

para a União Europeia, 79% dos portugueses inquiridos na sondagem aceita

esta transferência de competências no domínio da segurança externa (31%

concordando totalmente e 48% concordando).

Este exemplo, naturalmente não excepcional, antes confirmado por resultados

de outras sondagens anteriores sobre estes e outros temas, demonstra-nos os

resultados e a eficácia da manipulação estratégica face ao objectivo político

final, que é o da instrumentalização dos cidadãos.

Amanhã qualquer notícia de telejornal pode dizer, sem contraditório, que 79%

dos portugueses concordam com a transferência de competências militares das

Forças Armadas portuguesas para umas, por ora ainda putativas, Forças




8

Armadas da União Europeia, ferindo de morte uma importante componente do

exercício da soberania nacional.

E pior que tudo isto, se perguntarem a cada um dos respondentes que

consolidaram os 79%, se a resposta que deu é exclusivamente do seu livre

arbítrio, uma resposta inequivocamente consciente, portanto sem qualquer

influência de terceiros, dirá, sem qualquer dúvida, que sim, que é a sua opinião,

sem interferência de ninguém.

Estamos, pois, perante a quase total vitória da primeira regra de ouro dos

processos manipulatórios: o manipulado não pode minimamente suspeitar que

está a ser manipulado.

Sem comentários: