O QUE PODEM OS EUROPEUS
ESPERAR DA NOVA ADMINISTRAÇÃO TRUMP?
por Carlos Matos Gomes
Analisar
uma situação tem algumas regras, a primeira é conhecer as intenções dos
chefes, os seus interesses e o seu modo de conduzir as suas forças na
ação. A política é a guerra por outros meios e a guerra é a política por
outros meios.
O que
sabemos de Trump: ele representa a oligarquia cujos interesses se situam
no mercado interno. Essa oligarquia defende a reindustrialização da
América, a produção de riqueza no CONUS (Continent US) — os produtos a
serem produzidos nos EU estão em competição com os da China, e não com a
Rússia. Logo, o competidor-inimigo é a China que produz a baixo custo
os produtos que a América produz mais caro com a mesma ou menor
qualidade, caso de automóveis, eletrónica de consumo, têxteis,
metalurgia, entre outros.
Trump
vai atrair — já está a fazê-lo — as mais rentáveis industrias europeias
para os Estados Unidos, o que será feito à custa da Alemanha (o motor
industrial da Europa) e exportá-los para a Europa: vamos ter Mercedes e
VW americanos na Europa. Os associados europeus destas e de outras
marcas — Portugal, Espanha, Polónia — vão entrar em crise. Que acabará
por atingir os operários alemães. A Alemanha é o principal financiador
da Política Agrícola Comum, de que a França é o principal beneficiário,
vai sofrer um corte a sério. Com os efeitos sociais e políticos
imagináveis.
A Ucrânia,
feitos que estão os grandes negócios das empresas do complexo militar
industrial, com a transferência dos colossais pacotes de “ajuda”
fornecida pela Europa para os Estados Unidos, via compras de material
americano, de que o programa de troca de F16 obsoletos a serem enviados
para a Ucrânia e a compra dos caríssimos F35 é um exemplo, será um
problema europeu. Como o maior fornecedor de bens essenciais para a
guerra na Ucrânia é o americano Elon Musk que através da sua empresa
Starlink fornece o serviço vital de comunicações, de espionagem, de
geolocalização e guiamento de misseis, a Europa vai ter de o pagar, dado
não dispor de uma rede de satélites. Por outro lado, Elon Musk é o dono
da Tesla que produz os Tesla na China e os vende na Europa, pelo que
vai querer ser ressarcido dos prejuízos da guerra económica que Trump
vai desencadear contra a China — a Europa vai pagar a preço de mercado
os satélites de Musk e os Teslas que ele não vender na China. Trump está
de fora destas despesas. A Ucrânia é um desastre cujas consequências
serão pagas pelos Europeus, que pagarão também os custos dos migrantes
que vão continuar a chegar do Médio Oriente e de África.
Para
Trump a Europa e a NATO são pedras que ele vai tirar do caminho. Ele
terá sobre a União Europeia a mesma frase de Vitoria Nuland, a antiga
dirigente da CIA e estratega da crise ucraniana para provocar a Rússia:
Fuck the EU.
Perante este
cenário que podem os europeus esperar da nova tripulação da União
Europeia, as warmonger Von der Leyen e Kallas? Como vão elas sacar
dinheiro da política agrícola comum europeia, dos programas de coesão,
que implicam conflitos com a França e com os países mais pobres da
União? Como vai a U E e Kallas pagar as colossais exigências da Polónia
pelo facto de estar na primeira linha do conflito, de fornecer as bases
operacionais e logísticas da Ucrânia e de receber as retaliações da
Rússia? E como vai o novo cabo da guarda holandês escalado para o posto
de secretário geral da NATO sacar fundos aos europeus para pagar as
forças armadas da Ucrânia? E com quem vai esta nova equipa técnica da
União Europeia negociar na França e na Alemanha após as derrotas já
confirmadas de Macron e prevista de Sholz? E, no caso de manutenção da
politica de alinhamento da União pela política americana, como se
desenrolarão as relações com a China, que destino terá o porto de
Roterdão, a maior porta de entrada de produtos chineses na Europa? E,
por arrastamento, o porto de Sines? E para que servirá um mega aeroporto
em Alcochete, a menos de mil quilómetros (uma hora de voo) do mega
aeroporto de Barajas, num ambiente de recessão e decadência da Europa?
Um
exemplo nacional: o negócio da substituição dos F16 por F35 imposto
pelos Estados Unidos. Em declarações de 24 de Maio de 2024, o chefe de
estado maior da Força Aérea apresentou os seguintes número para o
“programa português de soberania do espaço aérea”, a necessidade de 27
aviões F35, com um custo estimado de 50 mil milhões de Euros a
distribuir por 20 anos. O que perfaz um custo anual de 2,5 mil milhões
de Euros apenas para este programa. O orçamento anual da Força Aérea
para 2023 foi de 397 milhões de euros com um reforço de 103 milhões de
euros o que perfaz 500 milhões. Isto é, um décimo do que apenas a frota
de F35 gastará num ano! O orçamento total do ministério da Defesa para
2023 foi de 2.585 euros, isto é cerca de metade do que será necessário
apenas para a nova esquadra de F35!
É
esta embrulhada que nós, portugueses estamos envolvidos, e conosco
muitos outros estados da União Europeia. Era indispensável que os
ministros da Defesa e dos Negócios Estrangeiros, o das Finanças e o
Primeiro-ministro explicassem o que pensam do assunto. E era
imprescindível que as senhoras da guerra da União, e mais o secretário
da NATO e o chefe do Eurogrupo explicassem como é que isto se resolve, é
que os americanos imprimem moeda emitem moeda sem valor de referência,
mas não aceitam as notas falsas dos outros. É para manter o dólar como a
única moeda falsa de aceitação obrigatória e universal que desencadeiam
guerras.
Uma última
questão que a eleição de Trump levanta é a resposta da Europa ao
eventual lançamento de uma arma nuclear tática na Ucrânia. É evidente
que existem planos da NATO. Mas convém que os europeus saibam que a
União Europeia não tem capacidade de resposta: não dispõe de redes
autónomas de satélites de alerta e guiamento nem de armas de resposta — a
force de frappe francesa é uma fantasia que satisfaz, iludindo, o ego
dos franceses, nada mais. As armas nucleares dos ingleses estão sob as
ordens de Washington, como todas as suas forças armadas desde a Segunda
Guerra. Há notícias de que os mais ricos dos ricos alemães confiam tanto
na capacidade de resposta da Europa que estão a construir bunkers, em
vez de fábricas.
Entretanto, por cá, os e as missionárias da guerra apresentam aos seus crentes videojogos de guerra.
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