A DIVIDA DA BANCA AO ESTADO - VERDADEIRO BURACO NEGRO
Quinze
anos depois da crise, Portugal ainda carrega das maiores dívidas da UE
por causa da banca. Portugueses ainda têm por pagar quase 30 mil milhões
de euros em dívida por causa da banca. Rácio podia já estar nos 100% ou
menos não fosse este encargo gigantesco.
Christine Lagarde, presdiente do BCE, e Fernando Medina, ministro das Finanças, em Santiago de Compostela
Christine
Lagarde, presdiente do BCE, e Fernando Medina, ministro das Finanças,
em Santiago de Compostela, Espanha© EPA/LAVANDEIRA JR
Luís Reis Ribeiro
01 Outubro 2023 — DN
Quinze
anos depois da grande crise financeira (que começou em 2007/2008) e
mais de dez anos após Portugal ter entrado em bancarrota e sido
submetido a um programa de ajustamento e resgate (2011), o País ainda
não se livrou do fardo das ajudas aos bancos (os casos mais salientes
são BES e BPN, como se sabe).
Portugal
continua a carregar uma das maiores faturas da Europa (UE - União
Europeia) por conta dos chamados apoios ao setor financeiro concedidos
por vários governos do PS e do PSD durante estes anos, aponta o Banco
Central Europeu (BCE), num estudo divulgado no mais recente boletim
económico.
De acordo com a
autoridade presidida por Christine Lagarde e um levantamento de dados
do Eurostat feito pelo Dinheiro Vivo, Portugal e os contribuintes
residentes (a maioria) ainda têm para pagar a quarta herança mais pesada
da Europa em termos de dívida pública (passivos financeiros).
Segundo
os números oficiais vertidos no último reporte dos défices e da dívida
enviados à Comissão Europeia, há uma semana, estamos a falar em 29,7 mil
milhões de euros que continuam em dívida face aos credores (fundos
oficiais europeus, bancos e fundos privados), o equivalente a mais de
12% do Produto Interno Bruto (PIB) no final de 2022.
Pior estão três países apenas: Chipre, Grécia e Irlanda. Por esta ordem.
Quinze anos depois da crise, Portugal ainda carrega das maiores dívidas da UE por causa da banca
Pressão para mais consolidação orçamental
Dito
de outra forma, sem estes passivos públicos - que serviram, em grande
parte, para salvar bancos privados (o caso mais avultado é o do BES, o
banco que foi liderado por Ricardo Salgado até ao seu colapso) - o rácio
da dívida pública portuguesa estaria hoje nos 100% do PIB ou até abaixo
disso.
Se Portugal
tivesse menos dívida, isso aliviaria a pressão para entregar excedentes
orçamentais sucessivos, a forma mais usada para tentar reduzir o
indicador (hoje a trave mestra do Pacto de Estabilidade) até à meta de
60% do PIB.
Este
desígnio, perfilhado pelo governo e pelo ministro das Finanças, implica
que não haja uma "disponibilidade ilimitada para reduções fiscais e dar
tudo a todos", como avisou recentemente Fernando Medina.
Mas
uma coisa é certa: sem os mais de 12% do PIB que os portugueses devem
só por causa dos bancos que foram salvos no passado recente (todos eles
casos de polícia e justiça), o ajustamento do rácio do peso da dívida
poderia estar quase três anos adiantado.
Assim
é porque as últimas projeções (as do Conselho das Finanças Públicas)
preveem que dívida caia abaixo dos 100% apenas em 2025. E isto num
contexto de excedentes orçamentais anuais consecutivos.
No
estudo "Impacto orçamental das medidas de apoio ao setor financeiro 15
anos após a grande crise financeira", o BCE afirma que o impacto
orçamental das medidas avançadas "difere consideravelmente entre os
países da zona euro".
"Alguns
países não tomaram qualquer medida, ou quase nenhuma, tendo o impacto
máximo no rácio da dívida face ao PIB sido próximo de 10% ou mais em dez
países da zona euro".
Estamos
a falar de "Alemanha, Países Baixos, Letónia, Áustria e Eslovénia", por
exemplo, destaca a autoridade monetária liderada por Lagarde.
Ruínas
Mas
depois há os outros que quase foram à ruína. "Os quatro países da área
do euro que necessitaram de um programa de ajustamento da UE/Fundo
Monetário Internacional (FMI), caso de Irlanda, Grécia, Chipre e
Portugal, mais Espanha, pediram assistência financeira ao Fundo Europeu
de Estabilidade Financeira/Mecanismo Europeu de Estabilidade".
Nestes, "o impacto da dívida era ainda superior a 10% do PIB no final de 2022 e nalguns casos muito superior".
O
BCE explica que o impacto das medidas de apoio "diminuiu
consideravelmente, mas estas ainda hoje deixam uma marca nas finanças
públicas".
As medidas de
apoio financeiro adotadas desde 2007 "aumentaram a dívida pública até
2012, ano em que o impacto atingiu um pico de mais de 6 pontos
percentuais do PIB".
"Desde
então, o impacto da dívida diminuiu, uma vez que os governos puderam
vender as participações de capital que adquiriram nos bancos durante a
crise e alienar ativos (principalmente créditos não produtivos, como
malparado) detidos pelos bancos em dificuldades", explicam os peritos do
BCE.
"No entanto, a
dívida pública da área do euro ainda era mais de 3% do PIB mais elevada
em 2022, em consequência do apoio ao setor financeiro".
"O
financiamento dos apoios veio de emissões de títulos de dívida (pouco
mais de metade), empréstimos (17,7%) e outros passivos de entidades das
administrações públicas (28,8%).
Esta
última categoria consiste principalmente na dívida dos bancos que foram
nacionalizados e reclassificados nas administrações públicas e dos
bancos de má qualidade (bad banks)". É o caso do BES, desde o início do
resgate classificado como banco mau.
"Destruição de riqueza e mais desemprego"
Mas
não é só o esforço orçamental pedido aos contribuintes. Salvar e apoiar
bancos tem um "impacto direto e duradouro nas finanças públicas", mas
isso "é apenas uma parte do custo económico global de uma crise
financeira".
Além deste, o custo "também se materializou em perdas de riqueza produzida e num aumento do desemprego", observa o BCE.
Em
cima disto, "em alguns países, a evolução adversa do setor financeiro e
das finanças públicas reforçou-se mutuamente, aumentando os custos de
financiamento soberano e exacerbando a crise financeira e económica".
Segundo
o BCE, esta última situação "provocou um aumento do rácio da dívida
face ao PIB que não está incluído nas estimativas deste estudo".
Luís Reis Ribeiro é jornalista do Dinheiro Vivo
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