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21 de março de 2024



Agostinho Lopes.

«Deixem-se de politiquices. Entendam-se». «Bloco Central, evidentemente!» (1)

Nada de novo na frente ocidental... mesmo com o Chega! A «estabilidade» (e o que dizem

que ela arrasta, a «governabilidade») transformada em eixo central, chave das opções

políticas pós-eleitorais. (2) Nem uma pequena ilação se retira da recente e estável

estabilidade do Governo PS que foi pelo cano abaixo... Nada de admirar, foi em seu nome

que mais uma vez em toda a pré-campanha, e sobretudo na campanha, trabalharam com

afinco televisões, rádios, jornais e etc., com sondagens, debates, “candidatos a 1o

Ministro”, voto útil, laminação da esquerda, sobretudo da mais consequente como o PCP.

Nada de espantar é coisa que há muitos anos na democracia pós-25 de Abril serve para

consolidar maiorias parlamentares, absolutas ou não, e governos PSD com ou sem CDS, e

governos PS, num verdadeiro moinho de orações tibetano em prol da rotação de quem

governa, a dita alternância. Que de facto alterna a cara dos ministros para assegurar a

continuidade das políticas que desgraçam o país! (É evidente que há sempre quem ache

que nem tudo está mal, ou que tudo podia estar pior... de facto no tempo de D. Afonso

Henriques ou do Dr. Salazar o aperto era bastante maior!)... Nada de novo se continua a

haver gente de esquerda que continua a martelar esta tecla, mesmo que a música que se

segue desafine e vá suscitar as suas inevitáveis (e em geral justas) críticas. Gente que

podia pelo menos interrogar-se: estabilidade para quê? Para fazer que política?

Estabilidade para continuar a estrumar a terra que fez crescer e medrar o Chega?

No pós-Legislativas de 10MAR24 não podia ser diferente! Anda meio mundo, ou mais, a

pregar a «estabilidade». Ouvem-se gritos lancinantes. E as vozes amplificadas pelos media

obedientes repartem-se por três hipóteses, desde que o resultado seja a «estabilidade» e a

correspondente governabilidade em três hipóteses, qual delas a mais interessante.



Os adeptos do «tanto faz», desde que haja «estabilidade» para fazer a «mudança». De que

foi porta-voz Cláudia Azevedo, CEO da SONAE, enquanto apresentava as contas da

SONAE, que evidenciavam que na SONAE não há mudança: crescimento dos lucros

acima da taxa de inflação, pese o agravamento das condições de vida dos consumidores e

baixos salários (a subida da massa salarial pode resultar do aumento do n,o de

trabalhadores e do crescimento das remunerações dos administradores, CEO incluída!).

Diz a CEO: «As pessoas sentem que as políticas não tratam da sua vida. Disseram: Por

favor entendam-se para corrigir as coisas». «Acho que houve um grito de mudança grande,

e é importante, qualquer que seja a solução governativa. Deixem-se de politiquices.

Entendam-se». Ou seja, PSD com PS, ou PSD com Chega, para que haja estabilidade, para

«corrigir as coisas», para políticas que tratem da vida das pessoas. Também o CEO da

Jerónimo Martins se pronunciou por «mudar», mesmo se não é claro no que quer dizer

com isso: «neste momento, a fraca qualidade dos nossos políticos obriga-nos a pensar se

não devemos mudar enquanto sociedade» e que o problema do país não é a falta de

dinheiro mas antes «a falta de qualidade e a falta de gestão das pessoas». Há uma coisa que

se pode garantir a Soares dos Santos, é que a qualidade dos políticos portugueses não vai

mudar com a eleição de 10 de Março! Será que estava a sugerir para os importar da

Polónia ou da Colômbia?

Talvez fosse de propor aos dois grandes empresários da Grande Distribuição que, face à

sua vontade de «mudar», aceitassem uma mudança das suas políticas empresariais,




garantindo: uma política laboral que reduzisse a precariedade e colocasse os salários da

imensa maioria do seus trabalhadores (mesmo no topo da carreira) bem acima do Salário

Mínimo; pusessem fim ao abuso de posição dominante e abuso de dependência económica

na relação com a maioria dos seus fornecedores (em geral MPME) viabilizando os seus

negócios através de margens adequadas, e regularizassem a sua relação com a Autoridade

Tributária pagando primeiro os seus impostos, contestando-os depois, se for caso disso,

como acontece com a generalidade dos contribuintes. Mas não deve haver lugar a dúvidas:

estas serão preocupações a resolver por um futuro governo, PSD/CDS/IL/CH, ou

PSD/Bloco Central com PS, explícito ou implícito...

Depois temos os entusiastas do Bloco Central puro e duro, como António Barreto (AB), ou

submerso como sugere Manuel Carvalho (MC).

AB não tem dúvidas. E é claríssimo: «Bloco Central, evidentemente». Pois «Só há duas

soluções possíveis, sem os arranjos habituais da classe política portuguesa (a solução de

AB que acontecer será de que classe política? extraterrestre?). Primeira: maioria directa

com coligação ou aliança entre a AD e o Chega. Segunda: um bloco central entre o PSD e

o PS. Todas as outras são receitas para o desastre». E justifica: «Mas como Portugal

precisa de soluções importantes e duráveis. Precisa de estabilidade e força parlamentar.

(...) Requer uma excepcional capacidade de junção de esforços e de convergência de

forças sociais». E como «A coligação entre a AD e o Chega é muito capaz de tudo

agravar», branco é, bloco central o põe! Dois registos ainda sobre esta brilhante declaração

de AB. Um é que não se lembrou de que a 1.a experiência de um governo de Bloco Central

de má memória só gerou miséria e acabou em águas de bacalhau antes do tempo – dois

anos, como a maioria absoluta do PS... Aliás, sucedendo também à 1.a experiência falhada

de uma AD, em que o próprio AB participou através de um dito Movimento dos

Reformadores. E depois comover-nos com as lágrimas de AB, crocodilo satisfeito

pensando ser peixe-palhaço: «Em Beja (em Beja meu Deus) o PCP não conseguiu eleger

um deputado!»

Para Manuel Carvalho tudo deverá ser feito para evitar o «abraço do Chega», e isso

significa, porque a «democracia é a arte do possível e o espírito de compromisso é o

cimento que lhe dá eficácia e consistência», que se espera que o PS, «líder da oposição»,

viabilize o Governo PSD, nomeadamente, «diplomas em sede parlamentar. Incluindo um

OE». «Basta-lhe a abstenção para manter o frágil equilíbrio do Governo e o Chega

afastado do centro de decisão». E claro, para que tal cenário seja possível, «terá de ser a

AD a criar um clima de compromisso no qual se reflictam também as propostas e os

limites do adversário». «A AD tem, por isso, de se abster de provocações ao PS, desistindo

de por exemplo de apresentar um orçamento rectificativo. Depois, terá de redigir um

orçamento despido de dogmas, como o que sustenta a fé na baixa dos impostos, no qual

Deus aparece como bom mas onde o diabo também não é mau. Um orçamento defensivo,

sem ousadias, insosso e palatável para que o PS e os partidos mais ao centro o possam

negociar». Ai que mudança, ai que estabilidade tudo isto promete! E sobretudo a viragem

nas políticas que ponham fim ao crescimento do Chega! Sobretudo as políticas, que

segundo MC «Nas periferias das grandes cidades ou nas vilas agonizantes do interior

criou(-se) em silêncio uma multidão de deserdados que no dia 10 de Março decidiu lutar

por um lugar na representação política». Que para o concretizar votaram no Chega. Para

MC «a maioria dos portugueses quer estabilidade, quer que o Governo

governe em respeito pela democracia e, como a experiência demonstra, tratará de castigar




o “bota-abaixismo”; depois, todos sabem, ou pelo menos suspeitam, que este caldo de

instabilidade é um poderoso nutriente da extrema-direita. E assim deve-se evitar a crise

política através do Governo PSD viabilizado pelo PS, caso contrário oferecemos «a melhor

prenda ao Chega». Não se percebe é como uma maioria absoluta do PS gerou

instabilidade, e pior, como o “bota-abaixismo” do PSD, Chega e toda a direita durante

estes anos, nomeadamente os dois de maioria absoluta, fizeram o Chega crescer e a direita

ganhar as eleições! Há aqui qualquer coisa que não bate certo...

E, finalmente, temos os apóstolos da solução «estável» PSD/Chega (com ou sem IL), que

não são poucos, para lá de Ventura e correligionários... É fácil adivinhar o que pretendem

porque nunca esconderam ao que vinham: sufragar no programa eleitoral do PSD (AD),

insuflado e empolado, o programa do Chega e de outros chegas que por aí andam,

nomeadamente os que lhe alimentam a tesouraria e a propaganda! Poderíamos falar de




Passos Coelho/Portas/Relvas que nunca desistiu de concluir a 100% o programa contra-

revolucionário da troika..., interrompido em 2015 graças ao PCP. Mas não será preciso,




porque ninguém duvida que não há nenhum fosso ideológico e político (e muito menos

cordão sanitário, sem precisarmos de ir até aos Açores), entre o PSD/CDS (que alguns




baptizam de direita democrática, que outros ainda classificam ou imaginam social-

democrata!) e o Chega. A este afluíram votos (3), candidatos, ex-deputados, ex-dirigentes,




apoiantes financeiros, etc. do PSD e CDS. Personagens que acorreram ao Chega em busca

do «tacho» e outras sinecuras, a começar pelo líder Ventura, feito, formatado

«personalidade política» em candidatura do PSD! Onde aliás exibiu todos os truques e

tiques de desbragado «Chefe de Castelo» (no máximo «Chefe de Bandeira») dos seus

mestres de outros tempos... O «não é não» foi clara táctica eleitoral de Montenegro, que

resultou bem, mas de que agora tem alguma dificuldade em desenvencilhar-se... mas que

vai resolver com muitas e boas ajudas que estão em curso...

É o caso claríssimo das palavras de Bagão Félix: «O “não é não” de Montenegro fez

sentido na campanha; agora o contexto é outro.» Isto é, fora da campanha o não é sim. Já o

sabíamos dos Açores... O que o antigo ministro de governos PSD/CDS nos vem dizer com

toda a candura e brutalidade é que a mentira é um instrumento legítimo em campanha

eleitoral! É um isco em anzol eleitoral na pesca de votos! O Chega não inovou nada,

copiou tudo. Mas tudo bem, registamos, mesmo se já o sabíamos... como é possível não

recordar a enorme mentira/fraude monumental que foram os programas e campanhas

eleitorais de PSD e CDS na campanha das Eleições de 11 de Junho de 2011, a que se

seguiu o governo da troika PSD/CDS, Passos Coelho/Paulo Portas?

Não podemos deixar de reflectir sobre a inanidade dos que pensam que travam o Chega

com o «cordão sanitário» não falando com o Chega, e etc., enquanto o Bloco Central leva

a cabo as políticas que alimentam o Chega! Ou, aspas aspas, idem idem, abraçam o Chega

para que o Chega os devore enquanto fazem as malfeitorias do programa do PSD

«melhorado/benzido» com as «bondades» do programa do Chega...

Ou seja se há milagre que a «estabilidade« do governo, qualquer que seja a solução, não

fará é mudar as políticas, o conteúdo das políticas, que até hoje asseguraram a

prosperidade do Chega. Porque elas estão no cerne dos programas do PSD, IL, com ou sem




Chega! A junção do PS só reforçaria essas soluções, porque, infelizmente, o programa do

PS comporta núcleos centrais e opções estratégicas das propostas do PSD.

Se alguém quer mesmo correr com o Chega pare para pensar: se o Chega nasceu por obra e

graça da política de direita, o caminho possível para travar o Chega exige mudar de

política. Mudar de rumo, defender e realizar uma política de esquerda.

(1) As citações de AB são retiradas do art.o ,«Bloco central, evidentemente», Público,

11MAR24; as de MC do art.o «O compromisso em tempos de cólera», Público, 14MAR24

e as restantes de diversos órgãos de imprensa.

(2) A «estabilidade» é velha como a Sé. Um exemplo: a CIP, pela voz de António Saraiva

em Novembro de 2018: «O governo e o PS, pela perceção que, na minha opinião, os

portugueses têm da estabilidade política, da bondade de algumas das medidas que o

governo, gerindo perceções, lhes transmitiu, tem condições para melhorar. Não sei se

obtendo a maioria absoluta ou ficando perto dela. Se assim for, liberta-se ou de um ou de

dois pesos. Talvez o país ganhe com isso».

(3) É evidente que o Chega teve dezenas de milhares de votos que erradamente pensaram

que estava ali a representação da sua indignação e desespero causados  pelas malfeitorias
da política de direita do PS e PSD.

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