O poder da propaganda tem sido evidente na mobilização de "revoluções coloridas" e por conseguir pôr pessoas inteligentes a dizer coisas estúpidas. Os crentes do "atlantismo" sentem-se desorientados, não concebem que não compete aos EUA dirigirem o mundo, que haja quem conteste a "ordem internacional baseada em regras" ditadas de Washington.
A sua lógica baseia-se em axiomas como: a Rússia invadiu sem qualquer razão um país; Putin é o único responsável por esta guerra; Putin é um criminoso. A partir daqui é construída uma lógica, à margem do simples bom senso e coerência, por autênticos propagandistas de uma crença, repudiando a realidade quando esta a nega. Neste contexto, uma dita esquerda desistiu de o parecer, alinha no neoliberalismo, "atlantismo", centralismo burocrático da UE/NATO. Foi o que um devoto daqueles dogmas, o sr. Augusto Santos Silva, comprovou numa entrevista na RTP-2 (em 20/11).
Disse que algumas questões deviam ser consideradas com a Rússia em relação à Ucrânia: proteção da minoria russófona, situação da Crimeia e neutralidade. De seguida, diz que estas questões deviam ser tratadas em negociações entre as partes e não na posição de um agressor. Mas afinal o que andou a Rússia a fazer durante oito anos, desde 2014? Nada aconteceu então na Ucrânia? Nem os acordos de Minsk, nem as propostas de paz da Rússia em 2021, nem as negociações de 2022? Outro elemento do PS, Sérgio Sousa Pinto, apresentou-se muito perturbado, dizendo: quem nos garante que Putin um dia acorda e decide invadir a Polónia ou os Bálticos?
Então é assim que a geopolítica funciona? Nos EUA o presidente acordou e decidiu que os EUA eram o único poder global. Um outro na Casa Branca acordou e decidiu expandir a Nato para Leste (contrariamente ao compromisso anterior) ou na Rand o chefe acordou e mandou elaborar uma estratégia para submeter a Rússia. Ou Angela Merkel acordou e decidiu que os acordos de Minsk não eram para cumprir. Ou Boris Johnson acordou e decidiu que as negociações de paz em abril de 2022 tinham de cessar, etc. Na visão destas pessoas interesses dos Estados, garantias de segurança, soberanias não são de considerar desde que perturbem o sono em Washington.
O sr. Santos Silva, superiormente convicto diz que 1000 dias depois a Rússia não conseguiu nenhum dos objetivos, nem a NATO cessou o seu alargamento nem o governo ucraniano foi deposto. Mas que objetivos os EUA/NATO conseguiram? O historial dos planos dos EUA só apresenta fracassos em série onde tenham intervindo. Relativamente à Rússia planearam o caos económico, a revolta contra Putin, o seu isolamento internacional. Porém, a guerra que desencadearam na Ucrânia, preparada desde 2014, representou o fim do mundo unipolar. A cimeira dos BRICS e parceiros em Kazan, foi a evidência do falhanço do ocidente contra a Rússia. Atá o liberal Michael Todd o reconhece em “La défaite de l'occident”.
O Ocidente perdeu a Rússia e está a perder a África e a Eurásia. As reuniões internacionais promovidas pela Rússia têm tido ampla participação, como as do Clube Internacional de Valdai; o Festival Mundial da Juventude, com mais de 20 000 participantes de 188 países; o Fórum Económico Internacional de São Petersburgo 2024, a Reunião Internacional de Representantes para questões de segurança; o Fórum Económico Internacional “Rússia – Mundo Islâmico 2024”, etc. Em África, uma onda de sentimento anti-imperialista difunde-se, aproximando-se da Rússia.
O sr. Santos Silva tem uma delirante afirmação considerando a desnazificação pretendida pela Rússia na Ucrânia como “delirante”. Então os EUA/NATO nazificaram a Ucrânia e Putin quer o contrário?! Escândalo. O sr. Santos Silva nuca ouviu falar dos neonazis Azov, que aterrorizaram a população do Donbass? Nunca ouviu falar de Kiev ter promulgado leis que criminalizam a dissidência, que Zelensky proibiu 11 partidos da oposição, que grupos neonazis como o Setor Direita e os Azov são ativos agentes da repressão. Nem ouviu falar no assassinato de Gonzalo Lira, jornalista americano que denunciou o imperialismo e a extrema-direita na Ucrânia. Nem que monumentos à vitória sobre o nazismo são derrubados e substituídos por estátuas de colaboradores nazis. Nem da "Álea dos Anjos”, um memorial dedicado às crianças de Donetsk mortas pelos ataques de Kiev depois de 2014.
Dizer que as pessoas dos "territórios ocupados" vão revoltar-se é de mau gosto. Durante oito anos lutaram pela sua liberdade e direitos de cidadania contra os golpistas de Kiev e o seu regime opressor que combatia tudo o que era progressista ou meramente democrata. Primeiro quiseram autonomia, depois, ao serem brutalmente atacadas, constituíram-se como Repúblicas Populares e mais tarde em referendo aderiram à Rússia.
É neste quadro que os “amigos” da Ucrânia, recebem Zelensky aos abraços, embora de acordo com a Constituição esteja ilegalmente no cargo, e dizem estar “inequivocamente ao lado da Ucrânia” para vencer a guerra.
A UE, mergulhada na mentira e em políticas cada vez mais à direita, caminha senão para a desintegração, para a completa irrelevância. Perdeu o contacto com a realidade. A UE não tem nem o poder nem a influência para impor nenhum dos objetivos de guerra que se propõe. Isto quando o BCE alerta para o risco de crise de dívida pública, fraco crescimento económico, elevados défices e incerteza geopolítica. A recomendação é: rigor na concessão de crédito, ou seja, austeridade…
Dizem-se de esquerda, mas para eles a verdade é por definição a estabelecida em Washington. Não importam os factos.
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