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27 de setembro de 2023

Ucrânia de joelhos e Europa confrontada com preços do gás

O general italiano Fábio Mini, aposentado, deu uma entrevista a propósito do seu novo livro L’Europa in Guerra, da qual salientamos:

- A NATO falhou desde 1994, quando começou a reformular o quadro de segurança na Europa e fora dela. Dos Balcãs ao Iraque e ao Afeganistão, prosseguiu uma política contrária à segurança dos Estados-Membros e ao direito internacional.

- Falhou também porque demonstrou não respeitar o princípio da igual dignidade dos Estados-Membros. Um deles - os Estados Unidos - é mais "digno" do que todos os outros juntos. O que permanece é uma organização militar que sobreviveu a fracassos políticos.

- A Rússia tentou evitar o conflito, o que foi confirmado pelo próprio Stoltenberg. Putin poderia ter evitado a invasão. Seu erro foi não insistir o suficiente em requisitos de segurança com o Ocidente. Provavelmente cedeu à pressão de seus próprios nacionalistas e militares, mas também à dos EUA, que davam a entrada da Ucrânia (e da Geórgia) na NATO como certa desde 2008 e planeavam apoiar o ataque da Ucrânia à Crimeia com um exército reconstruído pela NATO após o desastre de 2015. [derrotado no Donbass]

- A extensão do conflito pela NATO, impulsionado pelo Reino Unido e a Polónia, foi a prova da ameaça real, deixando claro para a Rússia que, mesmo sem a invasão, a NATO iria expandir-se, as sanções seriam reforçadas, o Donbass perdido, com o risco de perder também a Crimeia.

- As evidências são claras: as sanções não visam defender a Ucrânia, mas enfraquecer a Rússia, arruinar a Europa e favorecer a economia dos EUA. As medidas de política colateral dirigidas contra a China prenunciam um conflito no Indo-Pacífico em preparação. Nos EUA, mesmo os que criticam o envolvimento na Ucrânia denunciam a perda de recursos cruciais para o conflito com a China. O conflito ucraniano deveria conter a Rússia enquanto fortalecia a manobra dos EUA no Oriente. Assistimos agora a um efeito imprevisto ou subestimado na capacidade dos EUA: a Ucrânia tornou-se um poço sem fundo de armas e dinheiro, desviados da preparação para o conflito com a China.

- De todos os lados há acusações de erros catastróficos, massacres desnecessários, desperdício de recursos e dificuldades de entendimento entre os próprios aliados. Deixo para aqueles que querem que a guerra continue a dizer se tudo isso ainda é gerível.

Nos EUA muitos estão considerando um compromisso com a Rússia na Europa em troca da sua não intervenção na Ásia. Mas isto é um erro de cálculo: o chamado ocidente é apenas um terço do mundo; os restantes três quartos estão fartos do monopólio dos Estados Unidos e do "ocidente", tanto economicamente como no uso da força.

- A NATO não tem voz própria, nem sequer o poder de aceitar ou rejeitar a derrota. Na verdade, ela própria está em crise. Uma mudança na política dos EUA poderia mesmo fazê-la desaparecer do cenário global ou regional.

- O general, aconselha o seu país, a Itália, a favorecer os que nos EUA querem a retirada do conflito ucraniano. Isso pode ser feito suspendendo os envios de armas e opondo-se à ratificação da admissão de novos membros na NATO, em resultado de uma decisão popular, clara e consciente, não simplesmente de um debate parlamentar.

- O pessimista ou é um otimista experiente ou alguém que já sabe como isso vai acabar. A realidade ultrapassou para pior a perspetiva mais sombria. Centenas de milhares de soldados ucranianos mortos [o general refere 500 mil], 14 milhões de expatriados, um país devorado pela corrupção, uma Europa sem fôlego, os Estados Unidos em retirada do resto do mundo, a perspetiva de um conflito mais amplo envolvendo a Europa e o mundo são coisas piores do que nossos belicistas previam. E estamos apenas no começo. Ainda não houve bombas atómicas, mas não é preciso tê-las sobre a cabeça para decidir procurar uma solução.

- O Sul Global evolui com e sem BRICS. Na África do Sul, ficou claramente estabelecido que é necessária uma maior cooperação sob a bandeira do respeito mútuo, da igual dignidade e do benefício mútuo. Os países do Sul opõem-se ao imperialismo de tipo colonial. Não culpam a Rússia e a China, que são impérios, mas cuja violência não conheceram. Ressentem-se da Europa porque é composta por todos os impérios coloniais do passado e pelos Estados Unidos, que se tornaram neocolonialistas e imperialistas.

- É verdade que a atenção à Ucrânia está a diminuir nos media, não porque as coisas estejam melhores, mas porque a propaganda toma nota da evolução militar e das posições políticas e não quere admiti-las. Prefere o silêncio a confissões constrangedoras. É assim que funciona a propaganda: quando exageros e mentiras se tornam implausíveis, é melhor ficar calado ou, depois dos discursos que não admitiam contestação, expressar timidamente algumas dúvidas sobre o que antes propalaram.

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