Das redes sociais
João Melo
Opinião/ DN
Não
me apercebi (falha minha?) de tê-lo lido na imprensa mainstream local,
mas, segundo os serviços de informação da ONU, Roger Waters, músico do
icónico grupo inglês Pink Floyd, fez uma intervenção no último dia 8,
durante uma sessão especial do Conselho de Segurança sobre as ameaças à
paz e à segurança internacionais, em que, corajosamente, defendeu
posições contrárias às propaladas pela propaganda, tanto ocidental como
russa, acerca do conflito na Ucrânia.
Resumidamente,
disse ele: a guerra desencadeada em fevereiro de 2022 pela Rússia é
ilegal, mas foi longamente provocada pelo Ocidente. Por isso,
acrescentou, ele condena tanto os que começaram a guerra, como os seus
provocadores. Waters, que disse falar em nome da maioria dos sem voz
neste conflito e de todos aqueles que não ganham nada com a indústria
bélica, fez um apelo vibrante a um cessar fogo imediato, sem ifs (ses)
nem buts (mas).
Apenas
dois dias depois, o Papa Francisco, em entrevista a um canal de
televisão suíço, considerou a guerra na Ucrânia um conflito entre
interesses imperialistas (sem aspas, aproveito eu para dizer). "Há [na
guerra ucraniana] interesses imperialistas, não apenas do império russo,
mas dos impérios dos outros lados. As grandes potências estão todas
envolvidas. É típico dos impérios colocar as nações em segundo lugar",
disse.
Por enquanto, e
embora estejam a aumentar, vozes como essas ainda parecem em minoria não
apenas no discurso público do Ocidente, incluindo jornalistas (?) e
intelectuais, mas na atuação dos seus políticos. Parafraseando Viriato
Soromenho-Marques neste jornal, no passado dia 25 de fevereiro, vive-se
um momento em que "a pulsão da morte se liberta com particular
exuberância".
O autor
lembrou algo em que é imperioso insistir sempre, contra os arautos da
guerra pela guerra: o eventual sucesso da Ucrânia, ou seja, a sua
vitória militar, a acontecer, não deve ser "uma vitória de soma zero,
pois haveria interesses fundamentais da Rússia a ter, desejavelmente, em
conta". E acrescentou: -- "Levada ao limite, a Rússia, ao contrário da
União Soviética, não parece inclinada a perecer sozinha".
É
bom lembrar quais são alguns dos interesses russos que é avisado levar
em conta: a expansão da OTAN até às suas fronteiras e, principalmente, o
estatuto das regiões russófonas da Ucrânia. Recorde-se igualmente que
isso não seria problema nenhum, caso os acordos de Minsk, assinados em
2015, tivessem sido cumpridos. Mas sabemos agora, pelas revelações de
Ângela Merkel e François Hollande, que nem as autoridades ucranianas nem
a OTAN pretendiam respeitar tais acordos. Omitir esse facto na
identificação de responsabilidades para a guerra iniciada pela Rússia em
2022 tem nome: desonestidade.
A
necessidade de atender aos interesses russos em certas regiões da
Ucrânia, em nome da paz, não significa -- esclareça-se -- negar aos
ucranianos o direito de possuírem um país independente e soberano.
Como
sublinhou o analista angolano Jonuel Gonçalves, em artigo recente na
revista Athena (3 de março de 2023), a Ucrânia, embora seja um estado
recente (está independente desde 1991), "é uma comunidade e um
território muito antigos, igual a alguns estados leste-europeus, à quase
totalidade do continente africano ou a países da Ásia-Pacífico".
Entretanto, acordos de natureza variada entre países que partilham
certas comunidades são comuns na história da humanidade.
A
pretensão de influentes círculos ucranianos no sentido de edificarem
uma nação "pura" e "nórdica", classificando de "sub-humanas" as
populações de origem russa, além de não ter nada a ver com a pretensa
"batalha pela democracia" em curso na região, não é, evidentemente, boa
conselheira. Muito menos o é a estratégia do complexo EUA/OTAN no
sentido de enfraquecer a Rússia, visando o seu verdadeiro alvo: a China.
É preciso parar com toda esta loucura imediatamente, antes que seja tarde demais para toda a humanidade.
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