A Organização dos Estados Americanos (OEA), que Fidel Castro considerava o “Ministério das Colónias dos Estados Unidos” votou uma resolução sobre as eleições presidenciais na Venezuela para o CNE rapidamente publicar todos os detalhes eleitorais. Bolívia, Honduras, México e São Vicente e Granadinas não compareceram à votação (nem Cuba, expulsa em 1962, nem a Nicarágua que deixou a OEA em 2023). O presidente do México, López Obrador disse que o México aguardará que a “autoridade competente do país”' resolva qualquer desacordo.
A resolução vai contra a Lei Orgânica dos Processos Eleitorais da Venezuela, que não exige a publicação destes materiais, fazê-lo seria uma violação do direito público. O que a lei indica é que o CNE deve anunciar os resultados no prazo de 48 horas (artigo 146.º) e publicá-los no prazo de 30 dias (artigo 155.º) e que os dados e atas dos locais de votação devem ser publicados em forma tabular. (artigo 150). O Supremo Tribunal de Justiça é a autoridade constitucionalmente competente, para resolver qualquer desacordo.
A oposição rejeita a sua legitimidade porque é presidido por um "chavista", o que mostra bem a democracia da oposição: derrotada, pretende um golpe contra a Constituição e um processo de intenções pelas convicções de cada cidadão, querendo sobrepor-se ao mais elevado poder judicial. Entretanto vão apelando ao que em qualquer país do ocidente seria qualificado como vandalismo ou terrorismo. Enfim, os desejos de Washington estão acima da Constituição e dos processos democráticos.
Em 1829, Bolívar escreveu, “Os Estados Unidos parecem estar destinados pela providência a atormentar a América [Latina] com miséria em nome da liberdade.” Esta miséria, traduz-se na tentativa de sufocar os países latino-americanos através de golpes militares ou sanções como contra a Bolívia, Cuba, Nicarágua e Venezuela . A resolução da OEA faz parte desta asfixia.
Uma extrema direita, está empenhada em utilizar qualquer recurso – incluindo a intervenção militar dos EUA – para derrubar o processo bolivariano. Muitos países com governos aparentemente de centro-esquerda ou de esquerda juntaram-se aos EUA na votação na OEA. Entre eles estão Brasil, Chile e Colômbia.
Para enfrentar o crescente neofascismo, a esquerda latino-americana deve redescobrir-se e analisar o atual cenário político no continente, começando por questionar que houve um segundo ciclo de governos progressistas na América Latina.
O primeiro ciclo, que foi inaugurado com a eleição de Hugo Chávez 1998 e terminou após a crise de 2008 e a contraofensiva dos EUA. Chávez desafiou o imperialismo dos EUA ao promover a integração latino-americana e a soberania geopolítica, no entanto o segundo ciclo apresenta orientação centro-esquerda muito frágil. Esta fragilidade é exemplificada no Brasil e na Colômbia, onde os governos não conseguem exercer controlo total sobre as burocracias nos Ministérios dos Negócios Estrangeiros, com laços estreitos com os EUA.
A
Tricontinental oferece sete explicações para esta fragilidade:
1
- as crises financeiras e ambientais mundiais, criaram divisões
entre os países da região sobre o caminho a seguir;
2
- a reafirmação do controlo dos EUA sobre a região contrariando a
entrada da China nos mercados latino-americanos, que os EUA veem como uma ameaça;
3
- a crescente uberização dos mercados de trabalho, criando
ainda mais precariedade e impactando negativamente a sua capacidade
de organização. Isto resultou num retrocesso significativo dos
direitos dos trabalhadores e no enfraquecimento do poder da classe
trabalhadora;
4
- a reconfiguração da reprodução social, que passou a centrar-se
no desinvestimento público e das políticas de bem-estar social,
colocando a responsabilidade dos cuidados na esfera privada;
5
- o aumento do poder militar dos EUA na região como o principal
instrumento de dominação em resposta ao declínio do seu poder
económico;
6
- o facto dos governos da região terem sido incapazes de tirar
partido da influência económica da China, o principal parceiro
comercial da América Latina para impulsionar uma agenda soberana
desafiando a agenda dos EUA.
7
- divisões entre governos progressistas, que, juntamente com a
ascensão do neofascismo nas Américas, impedem o crescimento de
políticas regionais progressistas, incluindo políticas de
integração.
O equilíbrio das forças de classe em sociedades como o Brasil e a Colômbia não é a favor de políticas anti-imperialistas. As vitórias eleitorais não foram construídas sobre uma ampla base de apoio organizado da classe trabalhadora forçando o avanço de uma agenda genuinamente transformadora para o povo. As coligações que triunfaram incluíram forças de centro-direita que continuam a exercer o poder social e impedem liberdade na governação.
A fragilidade destes governos é um dos elementos que permite o crescimento da extrema direita.
As classes trabalhadoras, presas em ocupações precárias, necessitariam de investimentos produtivos impulsionados pelo Estado, com base no exercício da soberania. O facto de vários países da região terem alinhado com os EUA para diminuir a soberania da Venezuela mostra que estes frágeis projetos eleitorais não dispõem de capacidade para defender a sua soberania. Estes governos “progressistas” não têm suficiente convicção para se oporem às operações de mudança de regime ou aos esforços de desestabilização noutros países da região.
Fonte: Vijay Prashad: Venda 'progressiva' da Venezuela (consortiumnews.com)
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